A masturbação nasceu há 40 milhões de anos para travar doenças e ajudar na reprodução

Um dos maiores estudos sobre as origens da masturbação mostra que este não é mais do que um comportamento natural e fruto da própria evolução. Há 40 milhões de anos os primatas já se masturbariam.

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Como outros primatas, também os bonobos, um dos parentes vivos mais próximos dos humanos, se masturbam Pierre Fidenci
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Não, a masturbação não é uma questão meramente sexual ou um caminho para a obtenção de prazer. É algo comum em todo o reino animal, sobretudo em primatas (como nós) e, mais do que sexual, é evolutivo. E os primatas têm uma longa história evolutiva que justifica a origem da masturbação: por um lado, ajudou a evitar doenças sexualmente transmissíveis e, por outro, aumentou as hipóteses de reprodução (pelo menos nos machos).

É uma novidade face àquilo que a masturbação tem sido considerada historicamente – desde ser um comportamento patológico a um produto da excitação sexual. Ambas as hipóteses estão distantes dos resultados obtidos por Matilda Brindle, investigadora da Universidade College de Londres (Reino Unido) que se tem dedicado ao estudo da evolução da masturbação. “O facto de o comportamento autossexual poder servir uma função adaptativa é omnipresente em todos os primatas e é praticado por membros em cativeiro e selvagens em ambos os sexos, o que demonstra que a masturbação é parte de um reportório de comportamentos sexuais saudáveis”, explica a bióloga britânica em resposta ao PÚBLICO.

Há dois grandes intuitos evolutivos na masturbação: reproduzir-se e não adoecer. Os resultados agora publicados na revista Proceedings of the Royal Society Biological Sciences, numa investigação liderada por Matilda Brindle, ajudam a esclarecer um comportamento sexual comum, mas pouco compreendido. O tabu também será um dos motivos para a ausência de estudos sobre o papel evolutivo da masturbação, mas não diminuem a importância das conclusões desvendadas.

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Aparelho do final do século XIX para impedir a masturbação masculina, que se pensava causar insanidade Colecção Wellcome

“Muitos outros animais para além dos primatas se masturbam”, acrescenta a bióloga britânica. Apesar de não conhecermos as origens ancestrais da masturbação, Matilda Brindle explica que os primatas, já desde os antepassados de todos os macacos e grandes símios (incluindo os humanos), teriam provavelmente este comportamento sexual há cerca de 40 milhões de anos. A equipa de investigação da bióloga britânica analisou aquela que acreditam ser a maior base de dados existente sobre masturbação, através de centenas de publicações anteriores e entrevistas a primatólogos e zoólogos.

E a masturbação nas fêmeas

Mas porquê estas duas grandes hipóteses para justificar a presença da masturbação? Na verdade, estas hipóteses tornam-se, uma vez mais, consequência da evolução.

No caso da reprodução, o objectivo é sempre aumentar as probabilidades de fecundação. Neste caso, os investigadores descobriram que isso pode acontecer devido à competição entre machos. Por exemplo, se um determinado macho não tiver um estatuto social muito elevado, pode usar a masturbação para ficar mais excitado antes do sexo e poder ser mais rápido a ejacular – antes que outro primata mais forte o interrompa e afaste. Pelo contrário, a masturbação também pode ajudar a eliminar o esperma velho, que terá melhores hipóteses de concorrência com outros machos. É importante realçar que estas hipóteses estão alicerçadas em sistemas sociais bem diferentes dos que os humanos têm. No entanto, a masturbação masculina parece desenvolver-se a par com sistemas de elevada competição entre machos, conforme indicam estas conclusões.

E quanto às doenças sexualmente transmissíveis? Esta hipótese avança que a probabilidade de contrair uma destas patologias diminui com a masturbação após o sexo, ao limpar a uretra.

Destes primatas ancestrais existe também a indicação de que as fêmeas se masturbariam – algo que o estudo agora publicado não conseguiu confirmar totalmente. “Infelizmente, não conseguimos recolher tantos dados para fêmeas como para machos. Isso pode dever-se ao facto de a masturbação e a excitação femininas serem mais difíceis de detectar, mas também reflecte que, historicamente, o comportamento e a morfologia sexual feminina têm sido menos estudados do que nos homens”, nota.

Matilda Brindle acrescenta que, devido a esta ausência de dados, não é possível descartar a hipótese de as fêmeas também se masturbarem para aumentar as hipóteses de reprodução, por exemplo. É uma das opções para futuros estudos, garante a bióloga, que tem “esperança” de que mais cientistas procurem estudar a masturbação nas espécies que acompanham e publiquem esses dados – para assim poder compor um melhor retrato da masturbação no reino animal e da sua evolução.

“Com mais dados, adorava explorar mais estas hipóteses [da reprodução e de evitar doenças, por exemplo] e começar a distinguir que hipóteses podem explicar a masturbação em diferentes espécies e em que circunstâncias ecológicas e sociais”, perspectiva Matilda Brindle.

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