Portugal: há boas e más notícias na radiografia do país no Dia do Ambiente

Como Portugal evoluiu no domínio da sustentabilidade? No Dia Mundial do Ambiente, apresentamos uma compilação de dados da Pordata que nos permite fazer um possível diagnóstico ambiental do país.

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No Dia Mundial do Ambiente, a Pordata juntou uma série de dados para analisar como Portugal evoluiu no domínio da sustentabilidade Gerd Altmann/DR

Se pudéssemos fazer uma “radiografia” ao desempenho ambiental português, que diagnóstico esta imagem nos apresentaria? Que virtudes desconhecidas ou problemas escondidos encontraríamos? Por ocasião do Dia Mundial do Ambiente, o banco de informação estatística da Fundação Francisco Manuel dos Santos – a Pordata – compilou uma série de dados que nos permite ver como Portugal evoluiu no domínio da sustentabilidade.

Reunido e interpretado, este conjunto de informação traça um retrato ambiental do país. Percebemos, por exemplo, que a economia nacional é a que mais recursos naturais consome na costa mediterrânica. Portugal está mais quente – quem escrutina as séries de dados climáticos não tem dúvida das consequências da crise climática. Os transportes e a energia continuam a ser os sectores mais poluidores. E os portugueses têm produzido cada vez mais lixo.

Há boas notícias também. Temos reduzido as emissões de gases com efeito de estufa. O carvão praticamente deixou de ser uma fonte energética relevante, ao passo que cresceu a fatia das energias com origem em fontes renováveis. Apesar da seca, a chuva está dentro da norma. Quase toda a água que sai das nossas torneiras é segura para o consumo; e 9 em cada 10 praias portuguesas têm água de qualidade excelente. E a área marinha protegida em Portugal mais do que quintuplicou numa só década.

Consumimos mais materiais do que a Espanha

Em 2021, calcula-se que o país terá consumido 174 milhões de toneladas de materiais. Isto representa um rácio de 16,9 toneladas per capita, um resultado bem acima da média europeia (14,1 toneladas) e 86% superior ao consumo espanhol (9,1 toneladas).

Porque importa olhar para o consumo interno de materiais? Este indicador revela “a quantidade total de materiais utilizados directamente numa economia”, tanto pelas empresas como pelas famílias, bem como a produtividade desses mesmos materiais considerando o produto interno bruto. O ar e a água não fazem parte desse cálculo. Com estes valores, podemos perceber se um país está a usar recursos naturais de forma eficiente.

Em Portugal, os minerais não metálicos – como os materiais usados na construção civil – são os mais consumidos. Em 2021, representaram 63% do consumo total. O consumo interno de materiais subiu 65% entre 1995 e 2008 – foi precisamente neste último ano em que, de resto, atingiu o pico máximo de 241 milhões de toneladas. Seguiu-se uma grande queda a partir de 2009, auge da crise financeira internacional, e uma posterior estabilização à volta dos 164 milhões de toneladas.

“No balanço entre crescimento económico e consumo de materiais, Portugal atingiu, em 2013, uma melhoria de 23% na produtividade dos recursos, face a 1995. Este foi o valor máximo da série e, de 2014 em diante, a produtividade, comparada com a de 1995, manteve-se sempre acima da de 1995 (14% em 2021)”, conclui o relatório da Pordata.

Produzimos mais lixo e reciclamos pouco

Em 2020, os portugueses produziram em média 1,4 quilos de resíduos por dia – basicamente o mesmo valor que os cidadãos da União Europeia. O descarte de objectos e detritos no país tem apresentado uma tendência de crescimento per capita desde 1995 (excepto entre 2010 e 2013, considerados anos de crise).

“Em 2021, metade dos resíduos urbanos foram depositados em aterros, o dobro da média europeia (23%), colocando Portugal entre os países com maior proporção de resíduos urbanos depositados em aterros. No entanto, os pontos de partida de Portugal e da União Europeia eram muito diferentes: em 1995, 90% dos resíduos urbanos em Portugal iam para aterro, ao passo que na União Europeia​ esse valor era de 65%. No global, as trajectórias de Portugal e da UE têm sido aproximadamente paralelas e não de convergência”, conclui o documento elaborado pela Pordata.

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Mais áreas marinhas protegidas

A área marinha protegida em Portugal mais do que quintuplicou entre 2012 e 2021, passando de 14.196 para 76.975 quilómetros quadrados. “Portugal tem, assim, a terceira maior área marinha protegida da União Europeia a seguir à França (23%) e Espanha (21%). Esta área corresponde, no entanto, a apenas 4,5% da Zona Económica Exclusiva de Portugal”, indica o documento da Fundação Francisco Manuel dos Santos.

Portugal apresentava em 2021 uma área terrestre protegida correspondente a 21 mil quilómetros quadrados. Este valor significa quase um quarto (22,4%) do território nacional e coloca o país na 16.ª posição em relação a outros países europeus (mas abaixo da média da União Europeia, que se situa nos 26%).

Água boa para beber e nadar

Seja em que parte estiver do território português, é quase certo que pode beber água da torneira sem antes perguntar se esta tem ou não boa qualidade. Calcula-se que 99% da água canalizada é segura. Isto representa uma enorme evolução em relação à década de 1990, quando apenas 50% da água da rede era apropriada ao consumo humano. De 2005 em diante, alcançou-se o patamar dos 90%.

A água em Portugal não é só boa para beber, mas também para nadar. Em 2021, 92% das praias costeiras tinham uma água excelente, quando uma década antes este valor estava em 88% (que é precisamente a média da União Europeia). Por outras palavras, 9 em cada 10 areais nacionais são seguríssimos para banhos.

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“Se compararmos o valor de Portugal com o de outros destinos europeus de praia, ficamos aquém da qualidade das águas balneares da Croácia (99%), Malta (97%), Grécia (96%) e Espanha (95%) e quase em linha com o Chipre (93%) e com a Bélgica (93%)”, refere o relatório da Pordata.

Já as zonas balneares interiores têm uma qualidade mais limitada: apenas 75% são consideradas excelentes, sendo que a média europeia se situa nos 78%. Este resultado explica-se, em parte, pela menor capacidade de diluição das massas de água fora da orla, assim como pela maior proximidade com fontes de descargas poluentes.

Termómetros a subir

Desde 1970, as estações meteorológicas dos principais pontos de Portugal têm registado uma subida progressiva da temperatura média do ar. Todos estes pontos de medição no país – a única excepção é Viana do Castelo – apresentam desvios entre 1 grau Celsius e 2,3 graus Celsius nos últimos cinco anos, relativamente ao valor de referência (parâmetro que é obtido a partir da média do período entre 1971 e 2000).

Recorde-se que, no domínio do clima, é necessário analisar séries de dados com três ou mais décadas para extrair conclusões robustas – e daí a importância de comparações no contexto de uma colecção grande de dados.

No ano passado, Bragança, Castelo Branco, Lisboa e Beja apresentaram as temperaturas médias mais elevadas do último meio século. “Comparando a temperatura média na década de 1970 com a da década 2010-2019, constata-se que no Porto, Beja, Faro e Funchal a diferença foi de, pelo menos, 1,5 graus Celsius”, refere o documento.

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Chuva mantém-se dentro da norma

Ao contrário da temperatura, os dados de precipitação – ou seja, chuva – não indicaram até ao momento uma tendência óbvia de decréscimo ou subida. “De 1960 a 2022, os períodos de fraca precipitação foram sempre ocorrendo, independentemente da década e da estação meteorológica”, lê-se no relatório. Apesar da seca hidrológica que Portugal enfrenta nos últimos anos, 2022 apresentou valores de precipitação total dentro da norma de cada estação meteorológica.

Emissões nacionais em queda

No domínio das emissões de gases de efeito de estufa, os números indicam que Portugal tem tido uma evolução positiva. O país reduziu as emissões em 35% face a 2005, ao passo em que a União Europeia registou um decréscimo de 24%.

Desde 1990, refere o relatório da Pordata, Portugal tem estado no grupo dos nove países que se mantiveram sempre abaixo do valor global da União Europeia no que diz respeito às emissões por habitante. No espaço europeu, Luxemburgo é o país líder de emissões per capita.

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Sectores mais poluidores: transportes e energia

Os grandes sectores poluidores em Portugal são o dos transportes e da energia. Juntos, são responsáveis por cerca de metade das emissões nacionais. Os dois anos da pandemia constituíram uma excepção no padrão de emissões: no período entre 2020 e 2021, o contributo desses dois sectores situou-se acima do 40%, graças em grande parte à desaceleração da actividade nas indústrias de energia.

Estes resultados no domínio dos transportes e da energia estão em linha com o padrão global da União Europeia. “Apenas o sector dos resíduos, que em Portugal contribui para cerca de 9% das emissões de gases com efeito de estufa, se distancia do padrão europeu, onde o contributo dessas emissões tem rondado os 3%”, destaca a Pordata.

As emissões nos diferentes sectores tendem, contudo, a decrescer. Isto vale tanto para Portugal como para a União Europeia, sempre face a 2005 (ano de referência para o Objectivo de Desenvolvimento Sustentável). A única excepção nessa tendência é o sector agrícola em Portugal: as emissões com origem na agricultura cresceram 4,7%.

Carvão quase desaparece do “cabaz energético”

Um “cabaz energético” funciona como um cesto onde encontramos as diferentes fontes de energia de um país. Em 2021, mais de metade do cabaz português estava ocupado por energia fóssil: 40,6 % correspondia ao petróleo e 23,6% ao gás natural. A boa notícia é que, nesse ano, uma fatia de 31,6% já era oriunda de fontes renováveis.

“Face a 2000, o peso do carvão baixou drasticamente de 15% para menos de 1%, o petróleo caiu mais de 20 pontos percentuais, o gás natural cresceu 16 e as renováveis 17 pontos percentuais”, refere o relatório da Pordata. Em 2021, quase 65% da produção de energia eléctrica no país tinha origem em fontes renováveis.