O que é que quer que o ChatGPT faça por si?

Já tenho tempo a menos para as pessoas de quem realmente gosto, que além do mais cozinham fabulosamente, e não estou em fase de me amigar com uma criatura escondida por detrás de um ecrã.

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"Filha querida, não te iludas, estas coisas sobram sempre para nós!" @designer.sandraf
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Querida Mãe,

Sou péssima a lidar com novas tecnologias. Faço resistência digna de qualquer Velho do Restelo. Não por qualquer preconceito ou porque imagine que vão trazer mal ao mundo, mas apenas porque a priori me parece sempre tudo muito confuso, nunca tenho espaço suficiente no telefone, tenho medo de vírus e fraudes associadas, etc..

Por tudo isto, a conversa do ChatGPT passou-me ao lado e, ao contrário do meu marido, que me manda textos cómicos de cinco em cinco minutos criados na plataforma, eu nunca a tinha experimentado. Nem sequer sentia o menor interesse em explorar o assunto. Mas tudo mudou quando num daqueles reels que consumimos quando não temos mais nada para fazer, vi a coisa mais incrível de sempre.

Espere, mãe, tenho de fazer um preâmbulo; não sei se sabe que odeio, mas odeio mesmo, organizar um plano semanal ou mensal de refeições — bloqueio! Reconheço, no entanto, que seria maravilhoso ter tudo pensado, até para que eu e os ingredientes necessários acabássemos juntos na mesma casa, na mesma cozinha, evitando ter de recorrer aos douradinhos de última hora.

Pronto, agora posso retomar o fio à meada: o que esse reel me revelou é que posso dizer ao ChatGPT: "Faz-me um plano semanal de refeições. Somos tantos à mesa, e não gostamos de x, y ou z, e gostamos muito disto ou daquilo.” E, a seguir, posso acrescentar: “Agora dá-me a lista das compras do que preciso para fabricar estas refeições.” E, mãe, ele dá!

Talvez isto pareça tudo muito óbvio para muita gente, mas a mim parece-me um milagre!

A moral da história é perguntarmo-nos: "Qual é coisa, qual é ela, que dava tudo para que um robô fizesse por mim?" E avançar.

E a mãe, o que é que quer que o ChatGPT faça por si?


Querida Ana,

Há momentos em que me pergunto se não terás sido trocada na maternidade — listas de ingredientes, refeições... que pesadelo! Se me dissesses que tinhas encontrado uma cozinheira virtual, uma Siri ou uma Alexa — acho que é assim que se chamam! — que ia a tua casa fazer o jantar, percebia melhor a tua felicidade.

Mas, espera, não me esqueci, perguntavas o que esse tal Chat pode fazer por mim, coisas que delegava a terceiros de boa vontade.

Antes de te responder fui ler algumas coisas sobre este teu novo amigo, como faz qualquer mãe que se quer certificar de quem são as companhias dos filhos.

Li, e foi num artigo do New York Times, que o devemos tratar como um estagiário que entrou ao serviço, o que significa que é preciso tirar tempo para o ensinar, para o ajudar a acumular informação sobre quem somos, e que precisamos de pensar muito bem nas perguntas que lhe fazemos, porque não é um motor de busca banal em que se insere uma palavra e já está.

Ou seja, mesmo para lhe pedir uma lista de refeições é conveniente perder tempo a contar-lhe aquilo de que se gosta de comer, se os bifes são bem ou mal passados, quanto pesamos e quanto gostaríamos de pesar, etc., etc..

Aconselham-nos a fazer dele um aliado.

Ora, Ana, desculpa, mas não preciso de mais amigos. Já tenho tempo a menos para as pessoas de quem realmente gosto, que além do mais cozinham fabulosamente, e não estou em fase de me amigar com uma criatura escondida por detrás de um ecrã.

Dito isto houve, de facto, um serviço que me pareceu útil. Li que posso pedir-lhe um plano de exercícios para perder barriga, mas lá está, quem os tinha de fazer era eu! Filha querida, não te iludas, estas coisas sobram sempre para nós!


O Birras de Mãe, uma avó/mãe (e também sogra) e uma mãe/filha, logo de quatro filhos, separadas pela quarentena, começaram a escrever-se diariamente, para falar dos medos, irritações, perplexidade, raivas, mal-entendidos, mas também da sensação de perfeita comunhão que — ocasionalmente! — as invade. E, passado o confinamento, perceberam que não queriam perder este canal de comunicação, na esperança de que quem as leia, mãe ou avó, sinta que é de si que falam.

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