Este país vai mal

Portugal é, neste momento, um exemplo de como o situacionismo mina a alma popular e leva à descrença nas virtualidades únicas e imprescindíveis da vida democrática.

Ouça este artigo
--:--
--:--

Os media marcam significativamente o tempo da política. O que não passa nas televisões e não sai nos jornais é como se não existisse. Os atores políticos falam para os cidadãos através dos media. O tempo da mediação direta é quase nulo. Têm, por outro lado, um papel que, a ser bem cumprido, é essencial para o debate das ideias. Sem ideias diferentes ou até muito diferentes resta o situacionismo, aquilo a que a linguagem popular designa como “são todos iguais e o que querem é apanhar-se lá em cima, mas com o meu voto não”. Aqui medra a extrema-direita e todos os que se servem da democracia para a amordaçar já confessadamente.

Portugal é, neste momento, um exemplo de como o situacionismo mina a alma popular e leva à descrença nas virtualidades únicas e imprescindíveis da vida democrática. O grande problema dos portugueses é o custo de vida, a falta de habitação, a desgraça da seca, a desertificação de país que vai encolhendo e encostando-se ao mar que se expande, a falta de infraestruturas, designadamente o aeroporto de Lisboa, o ensino, a saúde e a justiça. O empobrecimento aumenta, um em cada três portugueses vive mal. Falta decência à nossa vida coletiva.

Não é aceitável que o Estado e as principais autarquias não construam habitação social; a iniciativa privada constrói se quiser, mas é inaceitável que os impostos recolhidos deem para pagar a loucura dos banqueiros (nesta desgraça anunciam lucros fabulosos, sem baixar as taxas de juro) e não dê para minimizar a desastrosa situação de quem quer viver debaixo de um teto e não de uma ponte.

A seca está aí com muita força e a pergunta tem de ser feita, o que se está a fazer para impedir que o Sado desapareça ou outros rios sigam o mesmo fim? E para impedir a desertificação do território que faz fronteira com Espanha?

O computador do adjunto de Galamba deve ter alguma importância, mas gastar horas, dias, semanas a debater o assunto é uma bizantinice e uma incapacidade das elites dirigentes para acertar o rumo da governação.

Pode o PS, sob pena de suicídio, ignorar a corajosa e democrática luta dos professores pelo ensino e pelo futuro do país?

Pode o PS continuar a fechar serviços no SNS que vão abrir no setor privado e fazer de conta que as pessoas não se revoltam primeiro por dentro e depois nas urnas e nas ruas contra quem as despreza?

Pode o PS continuar este ciclo inenarrável de ver como a justiça se degrada, apodrece desde o tempo até às prescrições e à vida sem vida dos funcionários judiciais?

O Governo descarrilou, há ministros que pura e simplesmente não existem; há uma que a propósito da seca anunciou a grande medida - pedir a Bruxelas que declare a seca. Onde está a cabeça desta gente, cá ou lá?

E a oposição? Corre atrás de computadores, dos aviões, dos palcos caros, das ruas em obras para aumentar a rede do metro. Resta a senhora Jonet com um banco para os pobrezinhos, falta como na década de cinquenta do século passado cada família ter um pobrezinho. Azeitonas, pão e um copinho de vinho, pobretes, mas alegretes. Há oitenta anos.

Corre ainda atrás dos "Leopardos" para a Ucrânia e questiona grosseiramente um Presidente de um país amigo com uma proposta de paz para a Ucrânia. Há mais interesse em mostrar a Washington que é preciso derrotar militarmente a Rússia e até prender Putin do que ouvir, estudar e responder a essa proposta.

Os media puxam pelos casos até à exaustão tentando agarrar os cidadãos pela barulheira em torno deles, parecendo que realmente o país é uma escadaria de casos sem fim à vista, criando a ilusão de que entre os partidos políticos tudo é a mesma coisa, matando esperanças de mudanças. A superficialidade virar-se-á contra os próprios media e correrão o risco de se nivelar no tamanho dos títulos.

Este país vai mal. Tem uma oposição de direita, o PSD, que quase nada de diferente tem a propor. Pois bem, se qualquer um dos partidos serve, os franceses, por exemplo, trocaram num abrir e fechar de olhos Hollande pelo seu ministro da Economia, o liberal centrista Macron. Et par cause… Se, por outro lado, as esquerdas do PS continuarem a ver qual é a melhor e de costas voltadas, a orientação política continuará a vir de Bruxelas e Washington onde a música é cada vez mais a mesma.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

Sugerir correcção
Ler 8 comentários