Está a Birmânia a construir uma base para os chineses espiarem a Índia?

Chatham House diz que imagens de satélite mostram melhorias profundas em infra-estruturas nas ilhas Coco, na baía de Bengala, a pouca distância de uma estratégica base naval indiana.

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Estudantes com máscaras do Presidente chinês, Xi Jinping, antes de uma cimeira informal com o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, em 2019 P. RAVIKUMAR/Reuters

Desde o princípio dos anos 1990 que se fala da possibilidade de que a Birmânia tivesse permitido aos chineses construir um posto de escuta nas ilhas Coco, um arquipélago de cinco pequenas ilhas na baía de Bengala. Mas além de uma estação de radar decrépita, nunca houve muitas provas disso até há bem pouco tempo, quando imagens por satélite começaram a mostrar melhorias significativas nas infra-estruturas.

Segundo a Chatham House, num artigo assinado por Damien Symon e John Pollock publicado no domingo no site do think tank, há sinais de modernização militar e da criação de instalações para apoio à aviação, nomeadamente a extensão da pista de aterragem existente, que passou de 1300 para 2300 metros, bem como melhorias no porto que serve a ilha, o que dá a entender que a Birmânia poderá começar em breve a realizar operações de vigilância marítima, a partir da Grande Coco, a maior do arquipélago, que dista apenas 55 quilómetros de Andaman e Nicobar, duas ilhas estratégicas indianas.

Desde o golpe militar de Fevereiro de 2021 e o levantamento popular combatido com repressão brutal que a junta militar da Birmânia (renomeada como Myanmar durante a anterior ditadura militar) está isolada internacionalmente, muito dependente da via mantida aberta pelos chineses.

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A imagem de satélite da Grande Coco tirada pela Maxar Technologies onde é bem visível a pista recentemente prolongada Maxar Technologies/Chatham House

Através do Corredor Económico China-Birmânia, Pequim investiu muito dinheiro para ter acesso às vias marítimas do oceano Índico que lhe permitem contornar o estreito de Malaca e direccionar por mar as importações de combustíveis para a província de Yunnan, que de outra forma teriam de seguir por terra.

A análise às fotos tiradas em Janeiro de 2023 pela Maxar Technologies, dizem os autores do artigo, mostram dois hangares, uma ligação artificial entre ilhas e aparentemente um edifício de alojamento na ilha Coco Grande, todos eles visíveis nas proximidades da recém-alargada pista de aterragem.

Além disso, fotos de Março mostram trabalhos de terraplanagem no extremo sul da Grande Coco, junto à ligação artificial com outra ilha.

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Ligação entre ilhas Maxar Technologies/Chatham House

“A militarização das ilhas Coco pelo Tatamadaw [junta militar], em conjunto com os outros desenvolvimentos no continente, podem representar um desafio securitário significativo para a Índia e a sua Marinha”, escrevem os investigadores da Chatham House. “As ilhas Andaman e Nicobar permitem à Frota Oriental indiana ter profundidade estratégica na baía de Bengala e abordagens de comando no estreito de Malaca.”

Além de passagem para a marinha mercante chinesa, que assim poderá descarregar na Birmânia e esvaziar a vantagem de Nova Deli, a base aérea da Grande Coco poderá servir para observar os movimentos dos navios da marinha de guerra indiana.

No mês passado, a China classificou como “absurdo” o relatório dos serviços secretos indianos que Nova Deli usou para confrontar as autoridades birmanesas sobre o posto avançado de Pequim nas ilhas Coco. A porta-voz do conselho de administração do Estado (nome oficial da junta militar birmanesa), a major-general Zaw Min Tun, diz o diário malaio The Star, classificou também como “absurda” a ideia de que a China estaria a construir uma base de espionagem nas ilhas Coco.

Ainda segundo o jornal The Star, citando fontes governamentais indianas, a Índia mostrou a membros do Governo birmanês imagens de satélite que mostram, segundo o executivo de Narendra Modi, trabalhadores chineses ajudando na construção do posto de escuta no arquipélago na baía de Bengala.

Se a China trocar o investimento de que a junta militar birmanesa tanto precisa pela informação secreta recolhida pelos voos de vigilância a partir da Grande Coco, isso dar-lhe-á uma grande vantagem regional em relação à Índia, acrescenta a Chatham House.

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