Universidade abre inquérito a reputado paleontólogo após denúncias de assédio sexual

Professor do Departamento de Ciências da Terra da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa nega “veementemente qualquer acusação de assédio sexual”.

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O professor nega "qualquer acusação de assédio sexual" Nuno Ferreira Santos

A Universidade Nova de Lisboa decidiu abrir recentemente um inquérito a Octávio Mateus, reputado paleontólogo português que dá aulas na Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT) daquela instituição, após ter recebido de várias denúncias de assédio sexual de investigadoras e alunas, noticiou esta sexta-feira a revista Sábado.

"A Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT) da Nova recebeu (...), a 22 de Abril de 2023, uma carta sobre alegados factos que podem configurar a prática de assédio sexual e que visam o professor Octávio Mateus. Mal tomou conhecimento da carta, o director da FCT da Nova reuniu com os signatários da mesma. A 24 de Abril, a queixa foi submetida ao portal de denúncias (...) A 26 de Abril, a Reitoria da Nova abriu um processo de inquérito, que está, de momento, a decorrer. A FCT Nova tem uma política de tolerância zero para comportamentos de má conduta e/ou de assédio, seja ele de que índole for", respondeu a faculdade àquela publicação.

Num longo trabalho, a revista cita algumas das alunas e investigadoras e descreve, segundo as mesmas, os pormenores de vários casos de que foram alvo, alguns dos quais remontam a 2010. Contactado pela revista, Octávio Mateus recusou ser entrevistado e respondeu por escrito. "Respondo a todas as suas perguntas com uma só expressão: nego veementemente qualquer acusação de assédio sexual! O tema é de extrema gravidade, coloca em causa o bom nome do visado e depois de publicitado, independentemente, da sua inveracidade, o nome ficará sempre manchado, assim, agirei em conformidade, quanto tiver conhecimento de alguma publicação atentatória contra o meu bom nome, consideração pessoal e profissional. Os meus advogados, se tal acontecer, já estão mandatados para apresentar a competente queixa-crime por difamação, pois a liberdade de expressão não pode, jamais, pôr em causa, o bom nome e a reputação dos cidadãos. Como docente tenho-me pautado pela ética, transparência, diligência e colaboração e, acima de tudo, pelo respeito dos alunos e das alunas".

Uma das denunciantes é Melanie During, paleontóloga holandesa que diz ter sido alvo de assédio de Octávio Mateus, professor no Departamento de Ciências da Terra da FCT e presidente da mesa da assembleia geral do Museu da Lourinhã.

Diz que o caso aconteceu em 2014, durante uma conferência em Berlim. Era estudante de mestrado na Universidade de Utrecht. “Tinha 25 anos e era a primeira vez que assistia a uma conferência de paleontologia”. Logo no primeiro dia, um professor holandês apresentou-a a Octávio Mateus. "Oh, és tão bonita!!”, terá sido, diz, o comentário do professor português. “Ele não falou de nada, nem de fósseis, nem de trabalho, só falou do meu aspecto. Disse-lhe, imediatamente, que me fazia sentir desconfortável, que eu estava ali para apresentar o meu trabalho. Mesmo quando eu estava a apresentar o meu trabalho, ele apareceu para dizer o quão bonita eu era”. A situação, conta, repetiu-se várias vezes durante os quatro dias do congresso. "Ele punha o braço à volta da minha cintura de cada vez que me via. Tocou-me nas pernas, nas ancas. Afastava-o sempre mas ele parecia não ligar. Voltava a fazer o mesmo outra vez".

Investigadora reúne queixas

Melanie During foi contactada recentemente por uma investigadora da Universidade Nova de Lisboa, que está a reunir as queixas e deu o seu testemunho. A cientista já estava a fazer este trabalho antes do inquérito aberto pela instituição. Também ela diz ter sido assediada pelo professor e decidiu criar uma plataforma de denúncias.

“Criámos esta plataforma de denúncias muito recentemente porque não aguentamos mais o assédio sexual, assédio moral, intimidação e retaliação. Sem grande esforço, recolhemos oito denúncias. Mas já sei que o número de vítimas é muito superior. Há casos de 2010 até este ano de 2023". As queixas detalham as situações: "Tenta beijar as estudantes, apalpa-as, propõe-lhes sexo, agarra-as, toca-lhes no pescoço, no rabo e até na zona genital", descreve a investigadora que falou à Sábado, sob anonimato. A revista falou ainda com mais jovens que deram conta dos casos de assédio de que foram alvo.

Mas o emergir destas histórias terá começado em Janeiro de 2022 na sequência de uma publicação no Facebook do paleontólogo holandês Dann Wolthuis. "Octávio Mateus, isto é para ti. Devias ter vergonha das tuas acções! Abusaste do teu poder para assediares sexualmente e beijares mulheres sem o seu consentimento. Na área da paleontologia, nunca mais trabalharei contigo e incentivo outros que saibam o mesmo que eu a fazerem o mesmo. Alguém confiou em mim e contou-me uma história completa sobre o que se passou entre ela e este homem (...) Algum tempo depois, outra mulher confiou-me que ela também tinha experiências semelhantes com este mesmo homem. Ele é um cientista muito respeitado e adorado por muitos na sua área (...), mas (...) um homem que abusa da sua posição de poder para intimidar sexualmente mulheres mais jovens, a maioria das quais provavelmente consideram-no uma figura de autoridade numa área em que ambicionam fazer carreira."

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