Adriano Ferreira, o tubarão que consagrou os peixes no tacho cozinhados na hora

“Não criei nem inventei nada, apenas recriei”, diz o homem que quis destacar os peixes nos ensopados e caldeiradas do seu restaurante A Praia do Tubarão da Costa Nova, Gafanha da Encarnação, Ílhavo.

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Adriano Ferreira, dono e cozinheiro do restaurante A Praia do Tubarão Paulo Pimenta

Foi já há mais de três décadas que Adriano Ferreira arribou à Costa Nova com a ideia firme de oferecer comidas de tacho. De peixe e cozinhadas na hora. Consigo trazia a experiência de mais de 20 anos a trabalhar em restaurantes e marisqueiras, e com isso o conhecimento do serviço, dos clientes e das suas preferências.

Entrava-se na derradeira década do século XX quando Adriano abriu o restaurante A Praia do Tubarão, que instalou numa das típicas casinhas de madeira coloridas e depressa virou referência gastronómica.

Depois dos peixes escalados grelhados nas brasas, que chegaram com os que regressavam de África, estavam na moda também os mariscos, o estatuto e reconhecimento social associados às grandes mariscadas, mas Adriano pressentia já correntes da mudança: a procura pelos sabores da memória, pela tradição dos cozinhados de peixes entretanto quase esquecidos com a euforia dos grelhados e dos mariscos.

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Restaurante A Praia do Tubarão na Costa Nova paulo pimenta

“As pessoas tinham saudades das comidas de tacho, os cozinhados feitos na hora. Na região desde sempre comeram o que pescavam na ria e tiravam dos campos, eram as caldeiradas e ensopados de peixe e era isso que queriam”, relata, explicando que essa era então uma novidade na oferta, um novo conceito para a restauração.

E foi esse o seu propósito: trazer para a restauração a lógica das comidas caseiras, a tradição familiar das caldeiradas e ensopados de peixes da ria de Aveiro. “Era isso que as pessoas queriam, os sabores que tinham na memória e não entravam na restauração. Eu não criei nem inventei nada, quando muito recriei”, diz, como que a querer esquivar-se de qualquer protagonismo.

Esse remete-o para os peixes, já que o que procurou foi precisamente destacar nos cozinhados os seus sabores. E foi essa a base em que assentou o imediato sucesso e reconhecimento do seu restaurante, mas Adriano diz também que isso “calhou”, que foi até “por causa de um cliente teimoso”.

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A Praia do Tubarão é ícone da Costa Nova paulo pimenta
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“Queria diferente, dizia que estava farto de comer sempre a mesma coisa" paulo pimenta

“Queria diferente, dizia que estava farto de comer sempre a mesma coisa, e procurei fazer uma caldeirada branca, mais ligeira, onde o principal fosse o sabor do peixe, de início até mais com linguado. Apenas recriei a receita, mas isso mudou o paradigma e foi um sucesso nos anos 90. Hoje é costume dizer-se que fui eu que fiz a Costa Nova, todos os restaurantes servem comida de tacho feita na hora”, relata.

Mas não só os ensopados de peixe. Também na caldeirada de enguias acrescentou o tomate à receita tradicional. “Dava mais consistência e um pouco de acidez, e os clientes gostaram”. Já no ensopado, apenas com batata da região, “é claro que o alho, azeite e pimentas em grão também dão sabor, mas a ideia é que o peixe seja sempre o principal”.

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Adriano Ferreira

Outra das tradições firmes no restaurante é a “galeota”, as larvas de lingueirão que são um petisco de temporada (finais de Março e início de Abril) único da ria de Aveiro. Já muito difíceis de encontrar, são divinas estas larvas, de sabor marinho, fino, intenso e delicado, seja na tradicional caldeirada ou ainda numa fritura crocante, como também se preparam na cozinha d’A Praia do Tubarão.

Adriano Ferreira lembra que nesses primeiros tempos os ensopados, além do linguado, eram mais de rodovalho e robalo. “A garoupa que, tal como o rodovalho, é agora mais procurada, vinha de Moçambique e agora é da Mauritânia ou, por vezes, de Sesimbra, mas a preços quase proibitivos, tal como o cherne dos Açores”, descreve o fundador do restaurante dando conta que os peixes são sempre frescos, sendo entregues dois dias após a apanha por compradores que tem na lota de Aveiro, mesmo ali ao lado.

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A Praia do Tubarão da Costa Nova Paulo Pimenta

Saudades desses tempos de início? “Só do dinheiro que se ganhava. Na altura correu muito bem, em dois anos tínhamos o restaurante pago”, conta, explicando que o grosso da clientela continua ser gente que vem especificamente à procura da cozinha de tacho feita na hora.

A par dos ensopados e caldeiradas, também os arrozes. De amêijoas, berbigão, lavagante, gambas ou de peixes como garoupa, polvo ou tamboril. “É claro que temos também peixe frito ou grelhado quando o cliente quer, mas a comida de tacho é que é a nossa praia”, remata o homem que levou para a Costa Nova a tradição da comida de tacho.

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