A menos de uma semana da chegada de Lula, direita pressiona Governo e Parlamento

Falta menos de uma semana para o Presidente do Brasil começar a sua visita a Portugal. Posições sobre Ucrânia e presença no Parlamento dividem partidos portugueses.

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Lula da Silva vai estar em Portugal entre os dias 22 e 25 de Abril Reuters/UESLEI MARCELINO

As posições do Presidente do Brasil, Lula da Silva, sobre a guerra na Ucrânia e a sua presença no Parlamento português no dia 25 de Abril estão a gerar críticas entre os partidos portugueses. A menos de uma semana da chegada de Lula a Portugal, o PSD desafia o Governo a demarcar-se das declarações feitas pelo Presidente brasileiro sobre a guerra, mas o PS defende que Lula tem procurado "fomentar a busca pela paz".

"O Governo português — enquanto órgão de soberania responsável pela condução da política externa , respeitando por inteiro a soberania do Brasil, através do primeiro-ministro, António Costa, e do ministro dos Negócios Estrangeiros, não pode deixar de se demarcar, pelas vias diplomáticas adequadas mas também publicamente, da afirmação de que a União Europeia, a NATO e os Estados Unidos estão a fomentar e a estimular a guerra", afirmou o vice-presidente do PSD, Paulo Rangel, numa declaração política feita este domingo no Porto.

Segundo sustentou, "com a mesma franqueza e, até, desassombro com que o Presidente do Brasil fala da cumplicidade e intervenção da União Europeia e procura suavizar ou omitir a responsabilidade do regime de Putin, o primeiro-ministro António Costa deverá afirmar a posição de Portugal a favor do direito internacional, da integridade territorial da soberania ucraniana e da paz".

Horas depois, em declarações à Lusa, a vice-presidente da bancada do PS, Jamila Madeira, considerou que o Presidente do Brasil tem procurado fomentar "a busca pela paz" na Ucrânia, tal como o chefe de Estado francês, salientando não ter ouvido o PSD pedir uma demarcação de Emmanuel Macron. Jamila acrescentou que "a posição de Portugal, do Governo e do PS têm sido absolutamente claras desde o primeiro minuto", em solidariedade para com a Ucrânia e com a "defesa do direito internacional e condenação do Estado que invadiu", a Rússia.

​"Aquilo que nós vemos como vimos fomentada nos últimos dias pelo Presidente [francês Emmanuel] Macron e agora também fomentada pelo Presidente Lula é uma preocupação legítima de Portugal, dos portugueses, dos cidadãos do mundo que é a busca pela paz", contrapôs a deputada socialista.

Para Jamila Madeira, "sem prejuízo de condenar veementemente o momento de violação do direito internacional de provocação desta guerra pela Rússia", é necessário "tentar procurar o mais possível que, no quadro mundial, se retome a premissa da paz".

"Não creio que haja nenhuma dúvida sobre essa matéria e, em relação à diplomacia que cada Estado promove, todas as acções que possam ser no sentido da paz são por nós acompanhadas com os instrumentos habituais. Assim como vimos o Presidente Macron e não creio que o PSD venha dizer que nos temos de demarcar dele também acredito que sejam essas as motivações, bem verbalizadas em vários momentos, do que o Presidente Lula está a promover", afirmou.

Sobre este ponto também o Chega adoptou uma posição crítica. O presidente do partido, André Ventura, defendeu que Lula da Silva deve ser condenado pela "proximidade com a Rússia", pela "incapacidade de ver o sofrimento do povo ucraniano", pela "sua proximidade à China", pela "hesitação em condenar as ditaduras sul-americanas" e pela "corrupção", apesar das decisões que condenaram o presidente brasileiro nesse âmbito terem sido anuladas devido a erros e irregularidades processuais.

"Aliado de Putin"

Mas as divisões entre os partidos não se centraram apenas na forma como avaliam as posições que Lula da Silva tem assumido quanto à guerra na Ucrânia.

Paulo Rangel do PSD salientou a "importância fundamental" da "oportuna e útil" visita de Lula da Silva a Portugal, dentro de alguns dias, e garantiu que o PSD tudo fará para que seja um "sucesso" e permita "relançar fortemente" os laços comuns entre os dois países. O Presidente do Brasil estará em Portugal entre os dias 22 e 25 de Abril.

A IL e o Chega não estão satisfeitos com o modelo escolhido para receber Lula da Silva.

"A Assembleia da República que convidou Zelensky para discursar em 21 de Abril de 2022 não pode receber um aliado de Putin como Lula no 25 de Abril. E o Presidente da República que atribuiu a Ordem da Liberdade a Zelensky não pode estar confortável com a presença de um aliado de Putin como Lula na AR no 25 de Abril", escreveu o líder da IL Rui Rocha, na rede social Twitter.

Num vídeo, Ventura aproveitou para criticar o PSD ao considerar "ultrajante" que o partido de Luís Montenegro saúde "a presença de Lula da Silva no dia 25 de Abril em Portugal". No mesmo vídeo, enviado às redacções, o presidente do Chega confirmou que o partido vai organizar aquela que promete ser a "maior manifestação de sempre contra um dignitário estrangeiro em Portugal", com o objectivo de mostrar que "o centro-direita e a direita portuguesa não são o PSD".

Questionada sobre a posição do presidente da IL, a vice-presidente da bancada socialista respondeu de forma indirecta. "Não vejo nenhuma alteração das nossas relações, nem nenhuma alteração da posição portuguesa relativamente a essa matéria", afirmou.

Lula da Silva será recebido e discursará na Assembleia da República numa sessão de boas vindas no dia 25 de Abril, marcada para as 10h. Uma hora e meia depois realiza-se a tradicional sessão solene que assina o aniversário da Revolução dos Cravos.

Uma solução que agradou ao PCP. "O desfecho final não diminui nem a sessão solene dedicada ao Presidente Lula, nem diminui a sessão dedicada ao 25 de Abril", disse o secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, que considera que considera que as possíveis manifestações marcadas sobre a visita de Lula não vão desviar as atenções em relação às comemorações do 25 de Abril.

A presença no Parlamento do Presidente do Brasil tem estado envolta em polémica desde que, em Fevereiro, o ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, falou explicitamente num discurso de Lula da Silva na sessão solene da Revolução de Abril na Assembleia da República, assinalando o seu carácter inédito, o que mereceu a oposição de PSD, IL e Chega.

O Parlamento acabou por decidir que, em vez de uma intervenção do Presidente do Brasil na sessão solene anual comemorativa, realizará, no mesmo dia, uma sessão de boas-vindas à parte durante a visita de Estado de Lula da Silva a Portugal.

O que disse Lula da Silva

No sábado, o Presidente brasileiro defendeu, no final de uma visita à China, que "os Estados Unidos devem parar de encorajar a guerra" na Ucrânia e "a União Europeia deve começar a falar de paz".

Desta forma, explicou aos jornalistas, a comunidade internacional poderá "convencer" o Presidente russo, Vladimir Putin, e o homólogo ucraniano, Volodymyr Zelensky, de que "a paz é do interesse de todo o mundo".

"É necessária paciência" para falar com Putin e Zelensky, disse. "Mas, acima de tudo, temos de convencer os países que fornecem armas, que encorajam a guerra, a parar", acrescentou.

O ministério dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, estará em Brasília na segunda-feira, onde será recebido no Palácio Itamaraty pelo seu homólogo, Mauro Vieira.

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