Cientistas? A precariedade dos investigadores

Investir na educação é fundamental, mas na ciência é essencial. Apesar de acontecer em Portugal, a investigação e a docência não podem ser exercidas em plenitude quando combinadas.

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A precariedade dos investigadores Matilde Fieschi

Numa altura em que a greve na educação se encontra num ponto de tensão crítico, onde as promessas do Governo não enchem as “barrigas” famintas de justiça social e reconhecimento pelo difícil trabalho de ser mestre das gerações futuras do país, existem, ainda, outras causas merecedoras de atenção, ainda que camufladas pela comunicação social.

Se é crucial ensinar as novas (e menos novas) gerações, qualificando-as, de forma a aumentar a produtividade económica e a literacia de um modo geral, também é crucial compreender, desmistificar e, algumas vezes, refutar os conceitos e conjuntos, agregações e formações do sistema que é a Terra.

Neste campo, os investigadores, comummente referidos como cientistas (pela relativa popularidade do típico homem já idoso, de bata branca, bigode e grossos óculos), são o principal corpo de progresso científico. O seu contributo, nas mais variadas formas, campos e saberes, permitiu à humanidade evoluir, modernizar-se e, de forma geral, criar meios e técnicas para a educação, produção industrial, literária, entre outras, assim como nos campos da filosofia e ética. A investigação e avanços na ciência permitiram reduzir a mortalidade, revolucionar o matrimónio e, de um certo modo, fizeram evoluir a sociedade.

Infelizmente – e não só em Portugal – esta importante componente da sociedade não sente que os seus esforços e a sua dedicação sejam recompensados. São relegados a bolsas de estudo e investigação, tornando a profissão não uma opção com estabilidade financeira, mas sim uma precariedade tremenda, que só termina – se terminar –​ com o ingresso no mundo universitário.

Este mundo, que transforma os investigadores em docentes, relega a actividade de produção científica para 1.º e 2.º plano ao mesmo tempo. Fica em 2.º plano porque existe a docência, que ocupa largas horas, desde a preparação de aulas, conceptualização de termos e intensas pesquisas bibliográficas; em 1.º plano, por causa dos concursos de progressão e ingressão na carreira, através de uma autêntica “corrida” ao currículo extenso, numa febre de publicações científicas que, muitas vezes, não trazem nada de novo, mas uma repetição do já descoberto, mascarado em tendências e modas turísticas e económicas.

Neste campo, ocorre um autêntico desnível entre as ciências de progressão longa, como a Geomorfologia, a Física, a Estratigrafia, entre outras, e as ciências de progressão rápida, como as Humanidades. Nas primeiras, a observação, recolha de dados, entre outros, demora muito tempo. Nas Humanidades, muitas vezes, estão à distância de um inquérito, que serve de base a muitos artigos. Tal facto, de uma maneira geral, torna muito mais difícil ingressar no mundo universitário destas ciências que, se não se “aliarem” às Humanidades (como acontece no caso do Turismo), por exemplo, tornam impossível a recolha de financiamentos em projectos de tamanha relevância ao panorama nacional e internacional.

Investir na educação é fundamental, mas na ciência é essencial. Ao educar, é preciso compreender o que há para poder capacitar os professores. E, apesar de acontecer em Portugal, a investigação e a docência não podem ser exercidas em plenitude quando combinadas. É preciso haver uma separação dos campos, permitindo a sua confluência através dos centros de investigação. Aos docentes, a educação; aos investigadores, a investigação, precavendo corridas desnecessárias e vocações perdidas ou mal direccionadas, por competições das ditas “capelas” universitárias.

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