Senador nigeriano traficou homem para Inglaterra para obter um rim para a filha doente

Ike Ekweremadu, a mulher e um médico foram declarados culpados pela Justiça britânica por terem prometido uma recompensa a um vendedor ambulante de Lagos em troca da doação do seu órgão.

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O senador, a mulher e o médico nas fotos da Polícia Metropolitana de Londres Met Police

Um tribunal de Londres anunciou nesta quinta-feira que o senador nigeriano Ike Ekweremadu e a sua mulher foram declarados culpados de tráfico para Inglaterra de um jovem vendedor ambulante do seu país, a quem prometeram uma recompensa, em troca da doação de um rim, que teria como destino a filha do casal, que se encontra gravemente doente.

Segundo o tribunal de Old Bailey, Ekweremadu, de 60 anos, e Beatrice, de 56, ofereceram alguns milhares de dólares e a promessa de trabalho no Reino Unido ao homem de 21 anos – cujo nome não foi revelado – para ele se apresentar num hospital londrino e oferecer o seu órgão de forma altruísta.

Advogado e membro do Partido Democrático do Povo, na oposição, Ekweremadu é senador desde 2003 e foi vice-presidente do Senado da Nigéria entre 2007 e 2019. Aparece descrito no processo judicial como alguém com “um grau significativo de riqueza”, e, de acordo com o Guardian, até fundou uma organização de apoio aos pobres, a qual ajudou na elaboração de leis contra tráfico de órgãos na Nigéria.

O médico Obinna Obeta funcionou como intermediário de todo o processo e também foi declarado culpado pela Justiça britânica.

No pedido de visto e nos documentos apresentados em Fevereiro do ano passado ao hospital Royal Free, a vítima – um vendedor de peças de telemóvel num mercado de Lagos, que o procurador Hugh Davies diz tratar-se de um indivíduo em “circunstâncias de pobreza” – foi apresentada como um primo de Sonia Ekweremadu, filha do senador, que estudava numa universidade de Newcastle, até ter abandonado o curso por causa da sua doença.

Em declarações ao tribunal, o senador disse ter sido vítima de um esquema fraudulento e Beatrice Ekweremadu negou ter tido qualquer conhecimento sobre o caso. Já Obeta afirmou que não foi oferecida qualquer recompensa à vítima e insistiu que a mesma quis doar o seu rim por iniciativa própria.

Nos documentos entregues ao hospital, Ekweremadu e o médico declararam, no entanto, que a vítima era familiar de Sonia – que foi ilibada de quaisquer acusações.

“Trata-se de uma conspiração horrível para explorar uma vítima vulnerável para a traficar para o Reino Unido com o objectivo de transplantar o seu rim”, criticou Joanne Jakymec, procuradora-chefe da Coroa britânica.

“Os arguidos condenados demonstraram total desrespeito pela situação económica, pela saúde e pelo bem-estar da vítima e usaram a sua considerável influência como um elevado grau de controlo, com a vítima a ter uma compreensão limitada sobre o que lhe estava realmente a acontecer”, acrescentou, citada pela Reuters.

Davies disse ao tribunal londrino que o senador e o médico trataram a vítima e outros potenciais doadores como “activos dispensáveis” e que todo o processo foi gerido como uma “transacção comercial”. Além disso, considerou o comportamento de Ekweremadu “desonesto e hipócrita”, tendo em conta o seu perfil e a obra política.

“[Ekweremadu] concordou recompensar alguém por um rim para a sua filha – alguém em circunstâncias de pobreza e do qual ele se distanciou e não fez quaisquer perguntas, e com o qual, para a sua própria protecção política, não teve contacto directo”, relatou o procurador, citado pelo Guardian.

“Aquilo que ele acordou não foi um simples expediente nos interesses clínicos da sua filha, Sonia. Foi exploração. Foi crime. Não serve de defesa dizer que agiu por amor à sua filha. As necessidades clínicas dela não podem ser satisfeitas à custa da exploração de alguém na pobreza”, referiu ainda.

O caso chegou aos tribunais depois de a vítima ter feito queixa à polícia londrina. Trata-se do primeiro veredicto ao abrigo da Lei da Escravatura Moderna, de 2015. A condenação vai ser revelada no dia 5 de Maio.

Num comunicado, a detective-inspectora Esther Richardson, da Polícia Metropolitana de Londres, afirmou que a decisão judicial “envia uma mensagem clara, para a todo o mundo, de que o Reino Unido não irá tolerar a indústria internacional do transplante ilegal de órgãos”, e elogiou a vítima pela “sua bravura, ao declarar contra estes criminosos”.

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