Macron espera ter reforma das pensões em França em vigor “até ao fim do ano”

Presidente francês pronunciou-se publicamente sobre a controversa lei pela primeira vez em várias semanas. “Acham que tenho prazer em fazer esta reforma?”, perguntou, sublinhando “necessidade” da lei.

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Emmanuel Macron deu esta quarta-feira uma entrevista a dois canais franceses Reuters/GONZALO FUENTES

O Presidente francês espera que a reforma das pensões que tem gerado enorme controvérsia entre em vigor “até ao fim do ano”.

Pela primeira vez em quase um mês, Emmanuel Macron pronunciou-se esta quarta-feira sobre a lei que uniu as principais centrais sindicais e toda a oposição contra si. “Entre as sondagens de curto prazo e o interesse geral do país, escolho o interesse do país”, declarou o chefe de Estado em entrevista às televisões TF1 e France 2, num momento em que a sua popularidade junto dos franceses está no nível mais baixo do actual mandato.

Macron diz que a contestação de centenas de milhares de franceses, ao longo dos últimos dois meses, “é legítima”, mas defendeu a reforma do sistema de pensões como “uma necessidade para o país”, uma vez que o número de reformados está a aproximar-se rapidamente do número de trabalhadores no activo. “Acham que tenho prazer em fazer esta reforma? Acham que podemos continuar com as mesmas regras?”, questionou.

As duas principais medidas da reforma do sistema de pensões são o aumento progressivo da idade legal da reforma dos 62 para os 64 anos até 2030 e, a partir de 2027, a necessidade de ter 43 anos de descontos para receber uma pensão completa.

“Quanto mais esperamos, pior se torna a situação”, argumentou Macron. “A primeira solução era baixar as pensões” e “a segunda era aumentar as contribuições [dos trabalhadores]”, acrescentou, descrevendo ambas as alternativas como impossíveis.

Na entrevista de meia hora, quase exclusivamente dedicada à reforma das pensões, o Presidente disse que “nenhuma força sindical propôs um compromisso” e, sem nomear, atacou as bancadas da oposição que “usam extrema violência” no debate. Ainda assim, tentou apaziguar as ruas, prometendo “recomeçar” o diálogo social “nas próximas semanas” sobre alguns pontos da reforma, como os relativos às carreiras longas e o dos trabalhos desgastantes.

Macron também arremeteu contra as “grandes empresas” que têm “lucros importantes”, às quais o executivo quer exigir “uma contribuição excepcional”. Não se trata de uma taxa sobre os lucros excessivos, explicou, mas um mecanismo para que as firmas “distribuam [lucros] pelos seus assalariados”.

“Desprezo” e “mentira”

Depois de ter sido aprovada na semana passada por decreto, porque o Governo temia não ter maioria para votar favoravelmente o texto, o executivo da primeira-ministra, Élisabeth Borne, sobreviveu a duas moções de censura na segunda-feira – numa delas, por apenas nove votos.

Tanto a primeira-ministra como a oposição anunciaram que vão apresentar a lei ao Conselho Constitucional, para que este organismo independente se pronuncie sobre a constitucionalidade das medidas contempladas. O conselho tem 30 dias para se manifestar. Depois disso, e se a lei for considerada de acordo com a Constituição, o Presidente pode promulgá-la.

Os sindicatos marcaram para esta quinta-feira mais uma jornada de mobilização contra a reforma e esperam-se fortes perturbações nos transportes públicos, nas escolas e na limpeza urbana.

Depois da entrevista, o líder da maior confederação sindical francesa, Laurent Berger, acusou Macron de mentir sobre a impossibilidade de fazer compromissos, porque, argumentou, “a CFDT tem um projecto de reforma das pensões”. Laurent Berger escreveu no Twitter que o chefe de Estado disse isso “para disfarçar a sua incapacidade de encontrar uma maioria para votar a sua reforma injusta”.

Philippe Martinez, dirigente da outra grande confederação sindical, a CGT, acusou o Presidente de “desprezo” pelos franceses e de dar uma entrevista “lunar”. “É: ‘Tudo está bem, eu faço tudo bem, não se passa nada nas ruas’”, criticou.

“Desprezo” foi também a palavra usada tanto por Marine Le Pen, da União Nacional (extrema-direita), como por Jean-Luc Mélenchon, d’A França Insubmissa (esquerda anticapitalista). “Esta tarde ouvimos as palavras mecânicas e dilatórias de um homem cada vez mais sozinho, que parece ter perdido todo o contacto com a realidade”, acusou Le Pen em conferência de imprensa especificamente marcada para o efeito.

Mélenchon disse igualmente que Macron falou com “as tradicionais marcas de desprezo” e está “fora da realidade”. O líder d’Os Republicanos, que se dividiu na votação das moções de censura de segunda-feira, considerou que “as soluções” do Presidente “não estão à altura da crise política e económica” do país.

Emmanuel Macron garantiu na entrevista que vai manter Élisabeth Borne em funções e sublinhou a vitória do executivo face às moções de censura: “Na segunda-feira vimos que não há alternativa [política].”

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