Que contribuições pede o acolhimento familiar?

Qual considera ser o melhor tipo de apoio no imediato: colocação da criança numa instituição ou numa família de acolhimento?

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"Desafiador poder-se-á tornar o futuro de crianças que estão em contextos que não salvaguardam os seus direitos" Carlos Magno/Unsplash

Nem todas as famílias conseguem salvaguardar e cuidar das suas crianças. Perante este contexto, as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) ou os tribunais, podem decidir, de acordo com o superior interesse das crianças, retirá-las e colocá-las numa instituição ou família de acolhimento.

Esta decisão é apenas aplicada em casos extremos, isto é, quando o meio natural de vida da criança a coloca em perigo. Atualmente em Portugal, em cada mil crianças, três vivem numa instituição ou família de acolhimento. Esta é uma pequena proporção em comparação com outros países, em que um maior número de crianças se encontra em acolhimento, tal como acontece em Espanha, Inglaterra, Irlanda e Noruega. Neste sentido, em Portugal, denota-se uma preferência pela intervenção e apoio simultâneo à criança e à sua família, podendo este ser um indicador que no nosso país se privilegia as relações de afeto e os laços familiares.

Pensemos agora, nas situações em que crianças têm de ser retiradas das suas famílias por se encontrarem em perigo. Qual considera ser o melhor tipo de apoio no imediato: colocação da criança numa instituição ou numa família de acolhimento?

Entenda-se instituição, a colocação de uma criança numa casa de acolhimento, juntamente com outras crianças e profissionais que trabalham por turnos; e família de acolhimento, a colocação de uma criança junto de uma pessoa singular ou família. Em ambos os casos, espera-se que os cuidadores tenham competências adequadas para promover o integral desenvolvimento da criança, contudo uma família de acolhimento, tal como nome sugere, visa a integração da criança num meio familiar.

Em ambos os contextos, tendencialmente, e numa fase inicial, a colocação é temporária, e a criança poderá manter o contacto com a sua família de origem, caso este seja no seu superior interesse.

Agora que teve tempo para refletir sobre ambas as opções, pergunto novamente, qual considera ser o melhor tipo de apoio no imediato: colocação da criança numa instituição ou numa família de acolhimento?

Pois bem, a legislação, os profissionais e os investigadores também reconhecem a colocação numa família de acolhimento como sendo preferencial face à colocação numa instituição. Porém, como foi mencionado em passados artigos nesta coluna de opinião, na prática, a larga maioria das crianças que se encontra em acolhimento em Portugal vive em instituições; contrariamente à realidade de outros países europeus, em que se privilegia a colocação em família de acolhimento.

No ano de 2021, das 6369 crianças em acolhimento em Portugal, apenas 224 viviam em acolhimento familiar. Tanto Paulo Guerra, como Sónia Rodrigues e Véronique Lerch argumentam que em Portugal urge promover-se o acolhimento familiar, com vista a salvaguardar o direito de todas as crianças, mesmo as que são retiradas das suas famílias, a viver num contexto familiar. Neste sentido, Eunice Magalhães evidenciou que importa igualmente recrutar e selecionar novas famílias de acolhimento.

Inicialmente, poderá pensar que este é um papel intuitivo, pois falamos de promover o desenvolvimento integral das crianças e assegurar um ambiente afetivo. Contudo, apesar do cuidar e do dar amor estarem no centro do papel das famílias de acolhimento, tal como me foi partilhado por uma criança num projeto de investigação: “Acho que é preciso ter amor por uma criança, ter carinho para dar a uma criança, assim como um filho, não é? Acho que todas as crianças necessitam de afeto. Sim, acho que toda a gente, mas principalmente as crianças, não é?”, outros requisitos são igualmente importantes.

Importa, saber cuidar e amar crianças que podem ter dificuldades comportamentais, escolares e de saúde física ou psicológica; estar disposto a colaborar com diferentes profissionais; bem como, estabelecer uma relação de respeito e entreajuda com as famílias de origem das crianças.

Outra criança no mesmo projeto de investigação referiu: “Nós temos sempre pais, por isso acho que não é tirar lugar a ninguém, todos têm um papel diferente.” Logo, famílias de acolhimento têm de “aprender” a saber amar, com o objetivo de apoiar as necessidades individuais de cada uma destas crianças.

O papel das famílias de acolhimento é desafiador, porém mais desafiador poder-se-á tornar o futuro de crianças que estão em contextos que não salvaguardam os seus direitos. Todos somos agentes de proteção das crianças, logo termino com uma pergunta, em formato de desafio, será que o leitor ou alguém do seu núcleo pode fazer a diferença na vida de uma destas crianças?


Membro fundador e membro do conselho consultivo da Associação AjudAjudar, psicóloga, doutoranda na Universidade de Oxford, investigadora e docente na Universidade de Leeds Trinity

A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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