Covid-19: imunidade natural reduz risco de doença grave em 88%

Autores do estudo publicado esta quinta-feira na revista Lancet sublinham que a vacinação continua a ser o modo mais seguro de conseguir imunidade.

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Variantes pré-Omicron deram imunidade natural "substancialmente reduzida" contra a reinfecção com a estirpe Omicron BA.1 Reuters/STEPHANE MAHE

A imunidade adquirida após a infecção pelo coronavírus SARS-CoV-2 oferece uma boa protecção contra a doença — e risco de hospitalização e morte — durante pelo menos dez meses, indica um estudo divulgado esta quinta-feira. O risco de doença grave é 88% menor em comparação com alguém sem imunidade.

O trabalho publicado esta quinta-feira na revista científica The Lancet constitui a análise "mais abrangente" feita até agora sobre o nível de protecção após o contágio por diferentes variantes daquele vírus, embora não inclua dados sobre a infecção com a variante Omicron XBB e as suas sublinhagens.

Os investigadores indicam, por outro lado, que as infecções com variantes pré-Omicron forneceram uma imunidade natural "substancialmente reduzida" contra a reinfecção com a estirpe Omicron BA.1., em que dez meses após a primeira infecção a protecção era de apenas 36%.

Foram revistos e analisados 65 estudos de 19 países, que comparam "a redução do risco de covid-19 entre indivíduos não vacinados contra uma reinfecção por SARS-CoV-2 e indivíduos não vacinados sem infecção anterior até Setembro de 2022", refere um comunicado de divulgação do estudo.

De acordo com a investigação, o nível e a duração da imunidade "contra reinfecção, doença sintomática e doença grave" são pelo menos iguais aos fornecidos por duas doses das vacinas de mRNA (Moderna, Pfizer-BioNtech) para as estirpes Alpha, Delta e Omicron BA.1.

"A vacinação é o modo mais seguro de conseguir imunidade, enquanto a obtenção da imunidade natural (através do contágio) deve ser ponderada face aos riscos de doença grave e morte associados à infecção inicial", diz Stephen Lim, do Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde (IHME, na sigla em inglês) na Escola de Medicina da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, o autor principal da análise, citado no comunicado.

Caroline Stein, também do IHME e co-autora do estudo, assinala que "as vacinas continuam a ser importantes para todos" para proteger quer as populações de alto risco, como os maiores de 60 anos e os que já têm outras doenças.

"Isto também inclui populações que não foram infectadas anteriormente e grupos não vacinados, bem como os que foram infectados ou receberam a última dose da vacina há mais de seis meses", adianta, defendendo que a imunidade natural e a situação em relação à vacinação devem ser tidas em conta para "obter uma imagem completa do perfil de imunidade de um indivíduo".

Desde Janeiro de 2021, foram divulgados vários estudos sobre a eficácia da infecção pelo SARS-CoV-2 na redução do risco de reinfecção e sobre como a imunidade vai diminuindo com o tempo, mas nenhum avaliava de forma abrangente quanto tempo duraria a protecção após a infecção natural contra diferentes variantes.

A análise dos dados de 21 estudos sobre a infecção com uma variante pré-Omicron "estimou que a protecção contra a reinfecção de uma variante pré-Omicron foi de cerca de 85% no primeiro mês e caiu para cerca de 79% após 10 meses", enquanto a imunidade natural conseguida com "uma infecção da variante pré-Omicron contra a reinfecção da variante Omicron BA.1 foi menor (74% num mês) e diminuiu mais rapidamente para 36% em cerca de 10 meses".

"No entanto, a análise de cinco estudos relatando doenças graves (hospitalização e morte) revelou que a protecção a este nível permaneceu universalmente alta durante 10 meses: 90% para as ancestrais alfa e delta e 88% para a Omicron BA.1".

Outros seis estudos que avaliaram a protecção especificamente contra sublinhagens da variante Omicron (BA.2 e BA.4/BA.5) indicavam que a protecção era bastante menor quando a infecção anterior era de uma variante pré-Omicron, mas que se mantinha a "um nível mais alto" quando a infecção anterior se deveu à estirpe Omicron, de acordo com o estudo divulgado esta quinta-feira.

Segundo outro dos co-autores do estudo, Hasan Nassereldine, do IHME, a menor protecção das infecções com as estirpes ancestrais em relação à variante Omicron e às suas sublinhagens reflecte as mutações que ocorreram e que lhes permitem "escapar da imunidade adquirida mais facilmente do que outras variantes".

"Os dados limitados que temos sobre a protecção da imunidade natural da variante Omicron e das suas sublinhagens sublinham a importância de uma avaliação contínua, principalmente porque se calcula que tenham infectado 46% da população em todo o mundo entre Novembro de 2021 e Junho de 2022", diz o cientista, adiantando serem também necessárias mais investigações para "avaliar a imunidade natural de variantes emergentes e analisar a protecção fornecida por combinações de vacinação e infecção natural".

Os autores do estudo "Protecção da infecção com SARS-CoV-2 contra a reinfecção: uma revisão sistemática e metaanálise" alertam que o trabalho tem algumas limitações, dado serem limitados os dados sobre a variante Omicron BA.1 e as suas sublinhagens, bem como sobre situação em África.

Adiantam que os cálculos sobre a protecção também podem ter sido influenciados por os dados disponíveis além dos dez meses após a infecção inicial serem limitados, bem como pelo registo incompleto ou inconsistente de informação, por exemplo, sobre uma infecção anterior ou internamentos hospitalares.

Desde 1 de Junho de 2022, estima-se que a pandemia de covid-19 tenha causado 17,2 milhões de mortes (6,88 milhões das quais foram registadas) e 7,63 mil milhões de infecções e reinfecções, segundo o estudo, que adianta que "uma grande proporção dessas infecções ocorreu após 14 de Novembro de 2022".

"A imunidade conferida por infecções deve ser ponderada juntamente com a protecção conseguida com a vacinação na avaliação dos encargos futuros com a covid-19, fornecendo indicações sobre quando os indivíduos devem ser vacinados e sobre políticas que tornem a vacinação obrigatória para trabalhadores ou restrinjam o acesso a locais onde o risco de transmissão é alto (...), com base no estado imunológico", refere ainda o estudo.

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