Linha crítica da direcção do Bloco avança com candidatura

Críticos da direcção do Bloco pedem balanço sobre derrotas eleitorais, autonomia e mais democracia interna.

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Catarina Martins anunciou na segunda-feira que não se vai recandidatar a coordenadora do partido Daniel Rocha

Um conjunto de críticos da actual direcção do Bloco de Esquerda (BE), do qual fazem parte os ex-deputados Carlos Matias e Pedro Soares, o histórico da UDP Mário Tomé ou Rui Cortes, vão avançar com uma candidatura alternativa à dos dirigentes do partido na próxima convenção nacional, em Maio.

Ao PÚBLICO, Carlos Matias, que faz parte do movimento Convergência, explica que este grupo de militantes irá apresentar uma moção de orientação que incide essencialmente sobre três questões: fazer um "balanço rigoroso do ciclo de derrotas", analisar a "situação internacional e nacional" para definir as "linhas de acção" de um "programa de carácter autónomo" — por oposição à proximidade ao PS que criticam desde os tempos da "geringonça" — e promover o "funcionamento democrático" e a "participação", que dizem faltar ao partido.

Embora valorizando o trabalho feito por Catarina Martins na última década, o ex-parlamentar acusa a direcção de se "recusar" a fazer uma análise sobre as derrotas eleitorais passadas, em particular, das legislativas de 2022, e acredita que a passagem de Catarina Martins para Mariana Mortágua como coordenadora não é uma garantia de mudança.

"Tirar uma actriz e pôr uma economista não garante nada", acusa, considerando que "garantir a continuidade é continuar derrotas" e que "um líder bom tem que tirar conclusões" das mesmas. Algo com que, "por muito brilhantista" que Mortágua seja, "não se tem comprometido", diz.

Embora na anterior convenção do partido se tenham apresentado cinco moções, desta vez deverão ser só duas: a moção dos dirigentes e a da Convergência que, neste momento, tem 40 promotores e está a tentar agregar os restantes críticos. Na última mesa nacional, os bloquistas alteraram o regulamento, passando a fazer as moções dependerem de 200 assinaturas ao invés das 20 até então pedidas.

O objectivo foi distinguir as moções das plataformas locais, uma ideia que já não é de agora e que não as impede de participarem num "debate amplo" na convenção, defendem dirigentes ao PÚBLICO, lembrando que a moção da Convergência, na convenção passada, conseguiu ter o dobro dos subscritores.

Mas para os críticos internos a decisão é vista como "programada". Além de Carlos Matias - que classifica esta regra de "excludente" e considera que vai "enfraquecer os contributos minoritários" -, Ana Sofia Ligeiro, membro da comissão política e também crítica do actual rumo do partido (embora já não faça parte da Convergência), diz tratar-se de um "aprofundamento da asfixia democrática".

E alerta para o perigo de "polarização" entre as duas moções na convenção e de "pulverização" das restantes sensibilidades do partido. Também a dirigente pede que se discuta a "lógica de organização colegial" e "centralizada", se abra um "maior espaço de diálogo" e pense como "apoiar os militantes de base".

Mas não acredita que os dirigentes estejam a dar passos nesse sentido, considerando que querem perpetuar uma "direcção monolítica" e que mais do que "um líder forte" como Mariana Mortágua, o que é preciso é outra orientação política.

Houve "renovação", diz direcção

Além da mudança ao nível da coordenação, a actual direcção não prevê fazer grandes alterações aos quadros, nem na orientação política. Fabian Figueiredo, da comissão política, frisa que "as razões de ser do BE não mudam" e que as "traves mestras" continuarão a ser a mesmas, mas contrapõe: "É natural que a maioria" dos membros da direcção "se mantenham", tendo em conta o "processo de renovação nos últimos anos".

Além disso, o dirigente garante que o Bloco é, e continuará a ser, "um partido plural" e reconhece que há um trabalho de "enraizamento e alargamento" que tem de ser feito, mas considera que isso já estava em curso sob a liderança de Catarina Martins. Como aliás, Marisa Matias, que também identificou ao PÚBLICO a necessidade de "alargamento da base de apoio" e de "articulação com movimentos sociais", mas assumiu que as alterações que aí vêm não são "uma mudança de fundo, radical".

Embora os dirigentes garantam que o partido permanece unido e que a próxima liderança será consensual, o grupo de aderentes que, na convenção passada, foi a segunda lista mais votada, promete levar uma cara alternativa à convenção, mas ainda não a definiu.

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