Índia

Uma estrada para os Himalaias está a deixar centenas sem casa

As fissuras abrem-se — e tornam-se grandes o suficiente para colapsar construções. Os residentes estão a deixar as casas nesta aldeia indiana.

Fissuras numa parede Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
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Fissuras numa parede Reuters/ANUSHREE FADNAVIS

As brechas abrem-se nas paredes das casas que rodeiam uma auto-estrada construída para levar peregrinos a locais sagrados dos Himalaias. Abriram-se, pela primeira vez, há 18 meses — e desde então alargaram. Os residentes temem o futuro: em breve, deverão ter de abandonar a aldeia. "É uma aldeia antiga. Isto é destruição absoluta", diz Butola, 55 anos, à Reuters, enquanto observa os trabalhos de terraplanagem para dar continuidade à estrada.

A construção quer suavizar o percurso para os milhões de peregrinos hindu e sikh que visitam o local sagrado. O desenvolvimento da área é parte da estratégia do primeiro-ministro indiano Narendra Modi, que quer reafirmar a presença do país ao longo da fronteira com a China. "A ligação moderna é também um garante de segurança nacional. As áreas fronteiriças do país estão a ser conectadas com as melhores estradas", disse em Outubro, numa aldeia junto à fronteira, onde garantiu que as novas ligações de transportes deveriam levar desenvolvimento às regiões remotas.

Mas os residentes não parecem concordar: centenas protestaram por causa dos estragos que as obras provocaram nas suas habitações, no estado de Uttarakhand. Os edifícios e as terras onde as casas estão construídas foram enfraquecidos — dizem geólogos, habitantes e outros responsáveis — pela construção rápida em montanhas geologicamente instáveis. A Reuters não obteve respostas do gabinete do ministro de Uttarakhand, do Governo ou das empresas responsáveis pelo projecto.

Nove habitantes das três vilas que se estendem ao longo da estrada de 125 quilómetros mostraram à agência de notícias os estragos nas suas casas. Afirmam que começaram depois das explosões que deram início à construção de túneis. "Quando as explosões começaram, as montanhas abanaram e novas fissuras apareceram", afirma Ravi Chopra, ambientalista.

Oito famílias vizinhas de Butola já deixaram a aldeia. "Há trabalhos toda a noite e o cimento das casas continua a cair. Vivemos em risco", lamenta o residente Munni Devi. A construtora RVNL quer comprar 1387 hectares de terra aos habitantes por cerca de 3,6 milhões de dólares. Butola afirma que representantes da RVNL disseram-lhe que a sua casa estaria incluída na compra, mas ainda não recebeu uma notificação ou pagamento. Entretanto, mais de 80 quilómetros de túnel já foram construídos, e a obra deverá estar concluída no próximo ano. A RVNL não respondeu ao pedido para comentar.

A situação em Uttarakhand ganhou atenção nacional depois de, em Janeiro, terem aparecido fissuras em mais de 800 casas em Joshimath, a 100 quilómetros da fronteira com a China. Algumas casas colapsaram completamente, forçando centenas de habitantes a evacuarem o local.

Na casa de Mukesh Khanduri, as fissuras são grandes o suficiente para caber um punho. Está à espera de receber uma compensação, para ser realojado. "As pessoas vão deixar de existir aqui. Só as estradas vão ficar."

Montanhas em Uttarakhand
Montanhas em Uttarakhand Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Sunita Devi, 35, chora ao conhecer o padre hindu Swami Avimukteshwaranand Saraswati, que consolou os residentes da aldeia
Sunita Devi, 35, chora ao conhecer o padre hindu Swami Avimukteshwaranand Saraswati, que consolou os residentes da aldeia Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Bhagwati Devi, 80
Bhagwati Devi, 80 Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Fissuras na parede de uma habitação
Fissuras na parede de uma habitação Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Uma escavadora na zona de trabalhos, onde está a ser construída a estrada
Uma escavadora na zona de trabalhos, onde está a ser construída a estrada Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Zona residencial e hotéis em Joshimath, em Uttarakhand
Zona residencial e hotéis em Joshimath, em Uttarakhand Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Parede de uma habitação com fissuras
Parede de uma habitação com fissuras Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Um vaso usado em rituais hindu, entre as fissuras criadas nas paredes de uma casa
Um vaso usado em rituais hindu, entre as fissuras criadas nas paredes de uma casa Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Trabalhos de construção da estrada
Trabalhos de construção da estrada Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Os habitantes da aldeia são obrigados a mudarem-se
Os habitantes da aldeia são obrigados a mudarem-se Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
O cartaz "NPTC Go Back" é dirigido à maior produtora de energia do governo, a NTPC
O cartaz "NPTC Go Back" é dirigido à maior produtora de energia do governo, a NTPC Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Bikram Singh Chauhan, 49
Bikram Singh Chauhan, 49 Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Fissura no chão de um campo de badminton
Fissura no chão de um campo de badminton Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Habitantes protestam contra a NTPC
Habitantes protestam contra a NTPC Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Janelas partidas e fissuras nas paredes de um centro desportivo
Janelas partidas e fissuras nas paredes de um centro desportivo Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Anshul, 12, com a prima Meghana, 3, num edifício transformado em abrigo para os que têm visto fissuras nascer nas suas casas
Anshul, 12, com a prima Meghana, 3, num edifício transformado em abrigo para os que têm visto fissuras nascer nas suas casas Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Bikram Singh Chauhan, 49, along with some labourers, loads his family belongings onto a truck after cracks developed inside the house he and his family rented in the Manohar Bagh area of Joshimath, in the northern state of Uttarakhand, India, January 14, 2023. Chauhan works as a day labourer in Gauchar, a town around 80km from Joshimath, while his wife Geeta Devi, 40, was staying in Joshimath in a rental house with her youngest child, a son. They had moved from Lambagad, a village, to Joshimath eight years previously for their kids' education. After the cracks developed in the house, they moved back to Lambagad. "We will face the same issue of educating our kids again," he said. "Where do we go now?"     REUTERS/Anushree Fadnavis    SEARCH "FADNAVIS HIMALAYAS" FOR THIS STORY. SEARCH "WIDER IMAGE" FOR ALL STORIES.
Bikram Singh Chauhan, 49, along with some labourers, loads his family belongings onto a truck after cracks developed inside the house he and his family rented in the Manohar Bagh area of Joshimath, in the northern state of Uttarakhand, India, January 14, 2023. Chauhan works as a day labourer in Gauchar, a town around 80km from Joshimath, while his wife Geeta Devi, 40, was staying in Joshimath in a rental house with her youngest child, a son. They had moved from Lambagad, a village, to Joshimath eight years previously for their kids' education. After the cracks developed in the house, they moved back to Lambagad. "We will face the same issue of educating our kids again," he said. "Where do we go now?" REUTERS/Anushree Fadnavis SEARCH "FADNAVIS HIMALAYAS" FOR THIS STORY. SEARCH "WIDER IMAGE" FOR ALL STORIES. Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Paredes danificadas colapsam
Paredes danificadas colapsam Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Ganesh Devi Rawat (4th-L), 68, ajuda na mudança de uma família
Ganesh Devi Rawat (4th-L), 68, ajuda na mudança de uma família Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Sunita Devi, 35
Sunita Devi, 35 Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Rajeshwari Devi, 34
Rajeshwari Devi, 34 Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Rama Devi (R), 88
Rama Devi (R), 88 Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Mukesh Khanduri, 37
Mukesh Khanduri, 37 Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Fissuras na parede
Fissuras na parede Reuters/ANUSHREE FADNAVIS
Rajeshwari Devi, 34, dorme com a família num abrigo
Rajeshwari Devi, 34, dorme com a família num abrigo Reuters/ANUSHREE FADNAVIS