PS deixa em aberto posição sobre renúncia a créditos salariais

Depois de terem viabilizado uma proposta do BE, socialistas mudaram a sua posição. PCP contesta baixas de curta duração e forçou o adiamento da votação final da Agenda do Trabalho Digno.

Foto
Francisco César, deputado socialista, anunciou que o PS iria rever a sua posição quanto à possibilidade de os trabalhadores despedidos abdicarem de créditos devidos pela empresa Rui Gaudêncio

No início de Janeiro, o PS viabilizou uma proposta do BE que permitia acabar com a possibilidade de os trabalhadores abdicarem de créditos que lhes são devidos pelo empregador, no momento em que são despedidos ou em que o seu contrato cessa. Nesta quarta-feira, os deputados socialistas anunciaram que iriam rever essa posição, remetendo a decisão final para o dia de amanhã.

A proposta de alteração ao Código do Trabalho da autoria do BE – e que teve o voto favorável do PS - previa que a lei passasse a dizer expressamente que “os créditos do trabalhador (…) não são susceptíveis de extinção por meio de remissão abdicativa”.

Com esta norma, as empresas ficariam impedidas de exigir aos trabalhadores que, no momento do fecho de contas, assinassem uma declaração a dizer que nada mais têm a receber, prescindindo de salários, de horas de formação, de subsídios de férias ou de Natal e de trabalho suplementar que eventualmente não lhe tenham sido pagos.

Durante a reunião desta quarta-feira do grupo de trabalho que está a discutir a Agenda do Trabalho Digno, e sem que nada o fizesse prever, o PS apresentou uma nova redacção para a norma.

A proposta apresentada oralmente pelo deputado socialista Francisco César mantém a regra introduzida pelo BE, mas acrescenta um novo ponto que vai ao encontro do que defende o PSD, permitindo que em determinadas situações o trabalhador possa abdicar de direitos.

“Sempre que seja prestada ao trabalhador informação detalhada e a respectiva fundamentação de todos os créditos, por escrito, pode o trabalhador declarar expressamente a renúncia aos créditos referidos no n.º 1 em acordo com o empregador, desde que as assinaturas sejam objecto de reconhecimento notarial presencial ou em processo judicial”, referiu o deputado do PS, citado pela Lusa.

Este volte-face surpreendeu o deputado do BE José Soeiro, que alertou que a iniciativa socialista "apresentada de surpresa" é "gravíssima porque resulta num recuo" e numa “cedência à chantagem dos patrões".

O posicionamento inicial do PS sobre este assunto tem sido alvo de críticas, nomeadamente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP).

Numa carta enviada aos empresários, António Saraiva, líder da CIP, alertava que as alterações ao Código do Trabalho, “em vez de melhorarem o enquadramento da actividade, parecem talhadas para dificultar a gestão das empresas e penalizar a competitividade”.

E acusava o Governo de desprezar os parceiros sociais e o Parlamento de adoptar normas “inaceitáveis”, dando como exemplo “a impossibilidade de extinção dos créditos laborais por via da remissão abdicativa”.

Na semana passada, a deputada do PSD Clara Marques Mendes já tinha alertado que a norma do BE devia ser novamente discutida, argumentando que punha em causa os acordos assinados em tribunal para acabar com os conflitos entre empresa e trabalhador.

O PS, que na altura não se mostrou sensível a estes argumentos, acabou agora por anunciar que iria rever a sua posição.

Com o adiamento do processo de votações das alterações à lei laboral, a proposta socialista não foi votada nesta quarta-feira e, em declarações ao PÚBLICO, o deputado Francisco César admitiu que a solução final poderá não ser exactamente a que foi apresentada.

“Estamos a analisar melhor e não sabemos se vamos avançar por aí”, frisou, remetendo uma decisão para amanhã.

A reunião desta quarta-feira ficou também marcada pelas críticas do PCP à simplificação das baixas por doença até três dias, o que levou ao adiamento da votação final global das alterações à lei laboral, prevista para esta sexta-feira, 3 de Fevereiro.

A proposta em cima da mesa prevê que as baixas até três dias, que implicam a perda do salário e não são subsidiadas, possam ser justificadas mediante uma “autodeclaração” do trabalhador, sob compromisso de honra, emitida através do SNS24, com limite de dois a seis dias por ano.

O deputado do PCP Alfredo Maia apresentou um requerimento potestativo para adiar a votação da proposta, com o argumento de que se trata de um assunto de “extrema complexidade” e apelando para que os socialistas a retirassem do âmbito das votações da Agenda do Trabalho Digno, apresentando antes um projecto de lei para o efeito "bem fundamentado".

De acordo com o socialista Francisco César, com o adiamento potestativo do PCP, "não será possível levar na sexta-feira a votação final global" a proposta legislativa, alertando para as "consequências" que tal adiamento poderá trazer quanto à caducidade das convenções colectivas.

"Ao nível da caducidade, sabemos que a lei tem um prazo (...), pode ter consequências ao nível da caducidade dessas convenções e, portanto, o PCP que assuma as suas responsabilidades", afirmou.

Sugerir correcção
Comentar