A geografia: uma utilidade ou ciência de segunda?

Os portugueses não gostam de mapas, porque têm o Google Maps; não gostam de saber o clima, confundindo-o com a meteorologia, porque podem ver o IPMA. O português, como um todo, não gosta da Geografia.

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Mapa Annie Spratt/Unsplash

Se, em certos modos, se assume a Geografia como um “conjunto de mapas”, com professores de óculos redondos e grossos, que oferecem monólogos desinteressantes sobre os rios, perfis longitudinais e transversais, diferenças de maciço antigo, orlas e bacias sedimentares ou, até de um conjunto de políticas europeias, com datas que ninguém conhece, a Geografia é, em verdade, uma ciência que, não só social, se afigura como indispensável ao desenvolvimento humano e permite a continuidade das outras ciências, como a História, a Economia ou até a própria Física. Se olharmos economicamente para um espaço, procurámos formas de o rentabilizar, através da proximidade de recursos ou pessoas, descritos em vários modelos produtivos; a níveis geológicos ou, até, físicos, não se consegue compreender o efeito de Coriolis sem espacializações geográficas ou conceitos climáticos.

Nesta panóplia de conhecimentos entra, irrevogavelmente, a Geografia Física. Comportando a geomorfologia, a estudar o relevo e as suas formas, a climatologia, mas não a meteorologia, certos conceitos de oceanografia, geologia, popularizada com os Sistemas de Informação Geográfica (SIGs), que permitem delinear perfis de risco, distribuições populacionais, enfim, “fazer mapas”, entre outros ramos e subdisciplinas “geográficas”, a Geografia Física assume-se como uma importante forma de compreender as cidades, as populações e todo o Portugal.

O grande problema indexado à Geografia Física, pelo menos em Portugal, é a descredibilização crescente que tem vindo a sofrer. Para ser franco, toda a Geografia o tem feito. Os portugueses não gostam de mapas, porque têm o Google Maps que o analisa por eles; não gostam de saber o clima, confundindo-o com a meteorologia, porque podem ver o IPMA. Enfim, o português, como um todo, não gosta da Geografia. A grande questão advém do facto de a Geografia ser determinante a compreender porque Portugal é assim e como deve seguir o seu caminho. Se, ao construirmos uma cidade, tivermos em conta as formas do relevo e o tipo de solo (geomorfologia, por exemplo), podemos prevenir inundações; se tivermos em conta as nuances climáticas, podemos, por exemplo, saber que as baixas pressões térmicas ibero-africanas são responsáveis pelo tempo “de trovoada” do Verão. Assim, é fundamental compreender a geografia, neste caso física, para o desenvolvimento de um Portugal informado.

As nuances topográficas, de latitude, da distribuição da população, da relação dos oceanos, da distribuição dos recursos, pertencem a rigorosas e exaustivas análises geográficas. A capacidade de interligar áreas especializadas do saber, como a Geologia, a Física, a Economia, a Sociologia, a Medicina, torna a Geografia uma poderosa “arma” de desenvolvimento económico. É importante, portanto, relevar a Geografia às ciências do saber mais banalizadas, como a Matemática ou até o Português. É tão importante saber ler como saber localizar o Norte (pelos musgos, por exemplo), ou saber contar como saber compreender a direcção dos rios entre jusante e montante. Podemos, assim, considerar uma “romagem à ancestralidade”.

Relevar a Geografia começa, portanto, por relevar os seus profissionais, os geógrafos, sejam estes professores (com melhores carreiras e maior tempo lectivo aos alunos), investigadores, técnicos, entre outros. Ao potenciarmos estes empregos, não só potenciaremos o desenvolvimento económico, como o desenvolvimento científico, importantes num Portugal que se afigura cada vez mais ultrapassado.

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