A Igreja tem de encarar a realidade e isso não é pecado

Quererá isto dizer que o Direito, ao legitimar a união de dois homens, está a ser cúmplice do pecado perante o Criador?

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Casamento gay Unsplash

Já não é nova a posição da Igreja Católica perante as relações pessoais entre pessoas do mesmo sexo. Apesar da sua abertura para que os homossexuais possam frequentar o templo cristão, ainda está vedada a possibilidade do casamento católico à comunidade gay. Em Março de 2021 e conforme "Responsum ad dubium "(questão formal colocada à Igreja) ao casamento, a resposta foi não, porém aceita a união de facto entre membros do mesmo sexo.

A questão de fundo prende-se, de imediato, com o seguinte raciocínio: aceita-se algo que nos dias de hoje é o mais comum, a união de facto com a prerrogativa de dar direitos aos seus membros nas áreas das pensões, cuidados de saúde e questões sucessórias, mas por outro lado não se aceita o casamento católico em nome do pecado, que na verdade, e olhando de forma estritamente jurídica no que concerne à concessão de direitos adquiridos, pouco ou nada acrescenta.

Resume-se esta contradição a um simples aspecto: o amor verdadeiro entre pessoas do mesmo sexo é abençoado pelo mundo católico mas não é acolhido no seu seio porque é pecado.

Ora, qualquer ser minimamente dotado de capacidades humanas, como creio que o Criador o será, entenderá que a liberdade de escolha individual faz parte integrante de um colectivo e do qual não pode ser excluído. Para além da questão fundamental que é a exclusão ao direito de ver reconhecida a sua união pela religião cristã, a Igreja está a negar-se a si mesma.

Agora, e mais uma vez, a Igreja, pela mão do Papa Francisco, afirma que a homossexualidade não é crime, mas sim pecado. Indo mais longe no seu argumento, afirma Sua Santidade que a união católica entre duas pessoas do mesmo sexo é “uma união não ordenada ao desígnio do Criador”.

A doutrina da Igreja defende que os actos homossexuais são fruto de uma perturbação. Se alguém esperava que o Papa Francisco pudesse alterar esta posição doutrinal, então enganou-se. A ser assim, anda por aí muito ministro de Deus perturbado.

Não será necessário alegar o que a ciência e medicina afirmam sobre a homossexualidade. A Igreja, como uma instituição global presente em todos os cantos do mundo, sempre teve historicamente uma difícil relação na forma como a sociedade evolui nos mais variados temas. A sexualidade é talvez o ponto mais discutível e que rapidamente se torna o mais controverso.

A Igreja, que opina sobre tudo e sobre todos, não acomoda o crescer das coisas mais naturais da vida, como é a visão de hoje do sexo e das suas práticas. Cinge-se aos séculos dos séculos dos séculos, e recusa-se a abrir a porta a outras visões do mundo. Na verdade, toda a sua doutrina com cheiro a mofo é contra aquilo que na verdade o tal Deus ensina: o amor.

Ora, parece que está na hora de a Igreja se despir do preconceito e e passar à clarividência do século XXI sem qualquer pecado. O pecado, aquele que interessa e que a gera grande perplexidade, são os quatro milhões euros que serão gastos com a vinda do Papa Francisco na Jornada Mundial da Juventude. Os valores agora tornados públicos chocam a sociedade. O dinheiro a gastar, através de um ajuste directo que com a cumplicidade do Estado, é dinheiro público. No entanto, a sociedade portuguesa é laica, o que me leva a questionar: porque razão o nosso dinheiro, é aplicado, com o patrocínio de entidades públicas, em eventos de cariz religioso?

Será que se gastaria algum euro que fosse com a vinda de outro qualquer líder religioso? Todos sabemos a reposta. E falta saber qual o real valor da comparticipação da Igreja nos custos.

Na verdade, são posições como estas, totalmente abstractas sem qualquer racionalidade nos tempos que correm, que precisam urgentemente de serem afastadas. A Igreja tem uma missão: em nome do Criador, acolher com amor todos aqueles que a procuram. Recordando as palavras sábias de provérbios 8: 17: “Amo os que me amam e quem me procura me encontra”. Parece ser claro que um gay também poderá procurar a Cristo.

De qualquer forma, certamente muitos homossexuais estarão casados e felizes sem precisarem da Igreja para nada. No entanto, se a razão está no pecado, quererá isto dizer que o Direito, ao legitimar a união de dois homens, está a ser cúmplice do pecado perante o Criador?

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