De voz embargada, Jamila Madeira defendeu a sua conduta política perante deputados do PS

A vice-presidente da bancada do PS suspendeu as funções na REN para evitar um parecer que considerava ilegal a acumulação do mandato de deputada com o de consultora da empresa.

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Jamila Madeira só suspendeu as funções na REN no início deste ano LUSA/ANTÓNIO COTRIM

Ao sexto dia como protagonista de notícias sucessivas por acumular, há anos, o cargo de deputada com funções de consultora e também lobbyista na REN, Jamila Madeira sentiu necessidade de defender a sua atitude de “legalidade”, de viva voz perante os restantes deputados da bancada de que é vice-presidente, e acabou por emocionar-se a meio da intervenção na reunião desta quinta-feira de manhã.

Foi a segunda vez que Jamila se dirigiu aos camaradas de Parlamento, depois de no sábado, quando o Correio da Manhã noticiou que acumulara o cargo de deputada com o de consultora da REN (e ganhando 11 mil euros por mês), já ter enviado um email, a partir de Loulé, onde contava apenas uma parte da história, fazia a sua leitura da lei através da qual recusava qualquer impedimento e defendia o seu “sentido de ética” por ter pedido de moto-próprio, pareceres sobre a sua situação. Na reunião, não terá havido perguntas nem grandes manifestações de apoio ainda que se tenham ouvido algumas palmas, descreveram ao PÚBLICO deputados presentes.

Já Eurico Brilhante Dias, líder parlamentar socialista, garantiu ao PÚBLICO que este caso "não afecta a imagem nem fragiliza" a direcção da bancada do PS. E defendeu a actuação da deputada que, disse, "entregou os registos de interesses com a indicação da relação laboral com a REN, fez as mesmas declarações ao Tribunal Constitucional e prestou os esclarecimentos que a Comissão de Transparência entendeu pedir".

Agora, Jamila voltou a desfiar os seus argumentos perante os deputados socialistas, foi mais específica nas datas em que suspendeu funções na REN Serviços e admitiu que fez representação de interesses para a empresa, tal como o PÚBLICO noticiou, entre 2012 e meados de 2016. Um período em que não era deputada mas apenas secretária nacional do PS, abrangendo lideranças de António José Seguro e António Costa.

Procurou, porém, recusar a denominação de lobbyista, e tentou balizar as suas actividades de lobbying no período antes de voltar às lides parlamentares, apesar de a REN ter admitido ao PÚBLICO que Jamila, como “consultora” da empresa, assegurava “contactos com a Comissão [Europeia], diversos comités do Parlamento Europeu e várias outras organizações”. Na quarta-feira, o PÚBLICO noticiou que Jamila teve acreditação activa como lobbyista no Registo de Transparência da União Europeia entre Junho de 2012 e Julho de 2013, mas a própria deputada acabou por admitir que exerceu a actividade de representação de interesses durante mais tempo.

Na reunião da bancada parlamentar do PS discutiram-se também as repercussões para o partido e para o grupo parlamentar do desgaste do Governo com as polémicas semanais, sobretudo nestas duas últimas semanas com a greve de professores e a demissão da secretária de Estado da Agricultura. Acossada pelos comentários gerais sobre controvérsias envolvendo socialistas, e numa altura em que a sua postura em todo este processo levanta dúvidas em colegas de bancada, Jamila Madeira terá sentido necessidade de se explicar.

Entre os deputados do PS o tema não é, de todo, consensual. Se há (poucos) que defendem a atitude de Jamila Madeira de optar pela exclusividade do mandato de deputada, existem algumas vozes em surdina que preferiam que a deputada não mantivesse esta atitude obstinada da leitura que faz da lei e cumprisse o que defendeu no email que enviou: uma postura de verdadeiro "sentido ético".

O problema está sobretudo na interpretação restrita que Jamila Madeira faz da regra do Estatuto dos Deputados: a parlamentar e secretária nacional para as Relações Internacionais do PS defende que pode acumular o cargo na REN Serviços porque a empresa não é concessionária de qualquer serviço público. É para a REN Serviços que trabalha exclusivamente e é a mesma que lhe paga o salário das funções a tempo parcial.

Porém, o seu contrato de trabalho tem o regime de pluralidade de empregadores, que são a REN Serviços e a REN – Rede Eléctrica Nacional, sendo esta última concessionária do transporte de electricidade e de manutenção e operação das respectivas infra-estruturas. Foi esse o argumento usado no parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados, que não chegou a ser votado, e que determinava a ilegalidade da acumulação de Jamila Madeira.

Notícia da Lusa substituída

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