Filho que abandonou nonagenária em quarto com dejectos condenado a pena suspensa

Nonagenária acabou por morrer já no hospital, onde entrou em estado de hipotermia, com infecção generalizada no organismo.

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Tribunal da Relação do Porto Manuel Roberto

O Tribunal da Relação do Porto condenou a três anos de prisão suspensa um homem que deixou a mãe de 93 anos sozinha por mais de 24 horas vestida com roupas molhadas num quarto cheio de dejectos.

O acórdão, datado de 4 de Janeiro, deu provimento a um recurso interposto do Ministério Público, revogando a sentença da primeira instância. O Tribunal de S. João Novo, no Porto, tinha absolvido o arguido de um crime de exposição ou abandono, por falta de provas.

No entanto, os juízes desembargadores concluíram que estavam preenchidos todos os elementos objectivos e subjectivos deste tipo de ilícito, tendo o arguido actuado com dolo eventual relativamente ao perigo concreto para a vida da sua progenitora, com a sua conduta "gravemente omissiva" de prestação dos cuidados necessários de que esta carecia.

"Ficou demonstrado que o arguido admitiu, representando como possível e conformando-se com tal possibilidade, que ao deixar a sua mãe sozinha por mais de 24 horas, sem esta se conseguir locomover, estando deitada em sítio húmido e cheio de dejectos, e sem qualquer assistência médica, colocava em perigo concreto a sua vida, como efectivamente se veio a verificar, tendo a sua progenitora vindo a falecer, resultado morte que, como único garante do dever de assistência nas circunstâncias concretas, lhe incumbia evitar", lê-se no acórdão. O arguido foi assim condenado a três anos de prisão, suspensa pelo período de dois anos, tendo ainda de entregar, no prazo de um ano, 2500 euros à Associação Portuguesa de Apoio à Vítima.

O caso remonta a Fevereiro de 2020, quando o homem se deslocou à residência da sua mãe, em Vila Nova de Gaia, e a encontrou caída no chão do quarto. De acordo com os factos provados, levantou-a e colocou-a na cama, não providenciando por qualquer tipo de socorro ou observação médica, apesar de estar ciente que a idosa não conseguia locomover-se pelos seus próprios meios, por modo a que pudesse, por si só, alimentar-se ou cuidar da sua higiene pessoal, ou ainda pedir assistência médica.

Dias depois, regressou à residência da mãe e, vendo-a sem qualquer reacção, telefonou para o 112, para que fosse transportada para o hospital. Quando chegaram ao local os bombeiros encontraram-na deitada na cama, vestida com roupa húmida e suja, mictada, apresentando várias equimoses, em estado de hipotermia. O quarto apresentava "um cheiro intenso a fezes e urina" e estava sujo, com restos de comida na cozinha, existindo também várias ratoeiras e um rato morto.

A idosa deu entrada nos serviços de urgência do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia em estado de hipotermia, infecção generalizada do organismo e pneumonia extensa, com alterações de consciência, problemas que levaram à sua morte.

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