Estão a seguir o diálogo entre Pedro Nuno Santos e António Costa?

Para Pedro Nuno Santos começa agora uma fase nova. O trabalho junto das bases do partido está adiantado, a angariação de apoiantes de peso também.

Se Pedro Nuno Santos (PNS), em vez daquele lamentável pedido de desculpas, tivesse logo saído do Governo teria feito melhor. Naquela altura, e antes das declarações na parte da tarde, alguma esquerda celebrou o aparente ato de rebeldia representado no despacho referente à localização do aeroporto. Mas a montanha pariu um rato e tudo culminou numa conferência de imprensa desastrosa. Continua a ser incompreensível como aceitou fazê-la naqueles termos.

A demissão de PNS foi um ato digno e, por isso, menos penalizador para o seu capital político. É certo que muitos, sobretudo à direita e na ala mais centrista do PS, duvidam que ainda o tenha. Mais, desejam que assim seja. Mas para PNS começa agora uma fase nova. O trabalho junto das bases do partido está adiantado, a angariação de apoiantes de peso também. Só que a gestão do tempo é fundamental na política e é difícil antecipar se PNS não terá começado os preparativos com demasiada antecedência; se, por isso, não cansará os socialistas, e os portugueses, antes de chegar a sua vez.

PNS tem anunciado que, enquanto António Costa for líder do partido, não desafiará a sua liderança. António Costa, fino como o azeite, respondeu-lhe no podcast de Francisco Pinto Balsemão, “Deixar o Mundo Melhor”, admitindo a possibilidade de fazer mais dois mandatos no PS e de concorrer às legislativas de 2026. Isto significaria uma longa espera para PNS. A entrevista em causa foi gravada antes de rebentar o caso que levaria à demissão de PNS, mas o diálogo entre os dois já dura há muito.

Quanto tempo pode alguém, e de forma declarada, estar em fila de espera para avançar para a liderança de um partido?

Enquanto PNS espera, e se posiciona, a vida acontece.

Fernando Medina, um ministro das Finanças que segue a lógica da consolidação orçamental e que, também por isso, não entusiasma ou disputa os simpatizantes de PNS, faz um bom trabalho na pasta que ocupa. Neste elogio não está implícito um elogio à lógica que segue. É um elogio “apesar de”. Fernando Medina já tinha feito um extraordinário trabalho como presidente da Câmara Municipal de Lisboa e o resultado das eleições autárquicas não lhe fez justiça. Por outro lado, Mariana Vieira da Silva passa uma boa imagem de si mesma e a própria Ana Catarina Mendes marca presença, segurando a taça da lealdade.

Na recente remodelação governamental, António Costa prosseguiu a sua conversa com PNS. Nomeou para o substituir um seu apoiante de sempre, João Galamba, e para a pasta da Habitação a sua secretária de Estado, Marina Gonçalves. O que afirmou António Costa? Não tenho PNS debaixo da asa, mas tenho o seu núcleo duro. O que poderia ser lido como uma compensação a PNS acaba por constituir uma forma de o isolar e de lhe dificultar a missão. Costa cortou o mal pela raiz, anulou a utilidade de parte da base de apoio de PNS. Reparem sobretudo que, se as suas políticas falharem, terá acontecido com a equipa que seria a de PNS.

Mas PNS não se ficou. Anunciou a saída do Secretariado Nacional do partido e deixa assim de ser dirigente. Esta decisão não foi uma despedida ou tão-pouco – arrisco dizer – um descanso, como o próprio afirmou. Ela constitui uma demarcação e é nesse espaço de distanciamento da atual direção do PS que PNS poderá começar a existir como alternativa.

É um diálogo delicado aquele a que assistimos. O que PNS fez, desde o princípio, foi dizer aos portugueses e a António Costa que quer o lugar dele e fê-lo enquanto este o ocupa. PNS pôs a sua ambição política à frente da lealdade a Costa. Ambição política não deve ser aqui lido como projeto individual mesquinho, mas sim como a vontade de pôr em prática uma visão para o partido e para o país. Espera-se de um político que a tenha e que a privilegie. Costa pode não gostar desta postura, mas também não a pode criticar. Por enquanto, e não obstante a natureza dos dois intervenientes ser oposta a isso, a conversa é subtil.

Esta conversa – no meio da profusão de casos gravíssimos, mas medíocres é o melhor que se pode retirar do momento que atravessamos. Não está acabada. Ainda bem. Ela já é profundamente política e chegará à fase em que se discutirão políticas concretas e reformas. Os portugueses precisam. Só isso nos poderá desanuviar de trapalhadas, incompetência e falhas de caráter.

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