Série Semana de Quatro Dias (4): uma vantagem competitiva para as empresas

Os exemplos de empresas que já adotaram a semana de quatro dias demonstram que ela é uma vantagem competitiva única para a atração de talentos.

A economia mudou de forma avassaladora nos últimos 50 anos e com ela o tipo de trabalhos que fazemos. Com o avanço tecnológico os trabalhos rotineiros estão a desaparecer, frequentemente substituídos por máquinas. Em contrapartida, a economia do século XXI está a criar trabalhos não-rotineiros abstratos, que exigem criatividade e maior esforço mental. Algumas empresas cujo funcionamento depende maioritariamente de tarefas rotineiras veem os empregados como descartáveis e facilmente substituíveis. Outras empresas que dependem de tarefas não-rotineiras abstratas necessitam de profissionais altamente qualificados e especializados que veem como "ativos humanos" fundamentais para enfrentar os desafios do mercado global.

Nestas empresas, a capacidade de atração e retenção de talentos não é um mero slogan; é, de facto, vital para o crescimento e sucesso a longo prazo. A competição pelos melhores profissionais é feroz, e as empresas procuram destacar-se entre as demais oferecendo: um salário competitivo, plano de saúde, mesas de matraquilhos e almoços gourmet no escritório ou viagens à República Dominicana. A crescente preocupação com o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal faz com que cada vez mais profissionais procurem empregadores que valorizem seu bem-estar. Os exemplos de empresas que já adotaram a semana de quatro dias demonstram que ela é uma vantagem competitiva única para a atração de talentos.

A semana de quatro dias é um benefício concreto, único e valioso. Sérgio Vieira, o CEO da 360imprimir, uma empresa que está a experimentar a semana de quatro dias desde setembro, afirmou que nenhum trabalhador sai da empresa por mais "200 euros". No jornal espanhol El País, uma trabalhadora afirmou que teriam de lhe pagar o dobro para voltar a trabalhar cinco dias. Recentemente foram divulgados os resultados da experiência-piloto com empresas dos Estados Unidos, Irlanda, Austrália e Nova Zelândia, organizada pela 4 Day Week Global, uma associação sem fins lucrativos que apoia empresas a adotar a semana de quatro dias. Os investigadores questionaram os cerca de mil trabalhadores sobre qual seria a percentagem de aumento salarial necessária para voltar a trabalhar cinco dias. Para voltar ao "normal", 42% dos trabalhadores reclamariam aumentos de 25% a 50%, 13% reclamariam mais de 50%, e 13% afirmaram que não voltariam a trabalhar cinco dias por qualquer valor.

A semana de quatro dias pode ser uma alternativa a aumentos salariais por parte de pequenas e médias empresas que não têm a capacidade financeira para competir com salários mais elevados pagos pelas grandes empresas. É uma forma difícil de valorizar o emprego porque obriga à alteração do funcionamento da empresa, mas é mais vantajoso por causa dos ganhos de produtividade e a redução de custos intermédios que compensam – total ou parcialmente – a mudança.

A capacidade da semana de quatro dias para reter e atrair bons trabalhadores não se resume a setores de tecnologia. Contrariando a ideia de que é impossível reduzir a semana em setores intensivos em trabalho, muitos restaurantes estão a adotá-la. Existe demasiado stress nas cozinhas dos melhores restaurantes, e a preocupação com a saúde mental está a levar muitos deles a abrir apenas quatro dias por semana, como por exemplo o Noma, Baumé, Kitching 21212, ou Sat Bains. Restaurantes menos luxuosos não fecham três dias, mas organizam o serviço em turnos de quatro dias, como por exemplo o Plattens, um restaurante de fish and chips que participa na experiência-piloto no Reino Unido, ou La Francachela, uma cadeia de restaurantes madrilena. Ao contrário das empresas do setor, nenhum destes restaurantes tem problemas de recrutamento. Também existem hotéis que reduziram a semana de trabalho.

A pandemia foi um gatilho que está a gerar uma mudança cultural no modo como lidamos com o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, sobretudo entre os mais jovens. Quer se queira quer não, as regras do jogo estão a modificar-se. As empresas que perceberem esta mudança cultural – que aumentou o valor que os trabalhadores atribuem ao tempo livre – e que a souberem aproveitar, terão uma vantagem competitiva enorme no mercado de trabalho.

Isto é criação de valor.

As empresas interessadas em saber mais sobre o projeto podem inscrever-se nas sessões de esclarecimento, que decorrerão até final de janeiro, no site: https://www.iefp.pt/projetos-e-iniciativas

Pedro Gomes é coordenador da experiência-piloto da semana quatro dias, organizada pelo Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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