Tribunal dá luz verde a obra que tinha sido travada em zona histórica do Porto

Prédio mais alto do que os edifícios à volta gerou polémica e suscitou dúvidas até na Câmara do Porto. Vizinho apresentou queixa, mas providência cautelar foi indeferida. Caso vai para a Justiça.

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Construção está a ser feita em "área histórica" pelo PDM do Porto Paulo Pimenta
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Vizinho tentou travar construção com uma providência cautelar Paulo Pimenta

O Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto indeferiu a providência cautelar que no final do mês de Outubro tinha travado uma obra na Travessa da Boa Morte, numa “área histórica”, em Lordelo do Ouro. O requerente, um vizinho que tem um Alojamento Local próximo, alegava que a empreitada era ilegal e feria o regulamento do Plano Director Municipal (PDM) – e pedia a suspensão imediata dos trabalhos, declarando danos para o seu negócio. O juiz entendeu, no entanto, que o alegado prejuízo da construção já está consumado e não justifica o título cautelar. A Câmara do Porto notificou o promotor da obra esta quarta-feira e os trabalhos já podem ser retomados – mas o autor da queixa não vai desistir.

David Baltazar vai levar o caso ao Tribunal Administrativo, mesmo prevendo um jogo de paciência. “As expectativas são mais do que más em termos de tempo – estamos a falar de anos. Mas em termos de desfecho não são más, embora saibamos que não há um historial de demolições no Porto”, disse ao PÚBLICO, comentando a sentença proferida no dia 12 de Dezembro e a possibilidade de a construção ser, no futuro, demolida.

O autor da queixa decidiu insistir na “luta” por várias razões: “Em primeiro lugar por causa do PDM e de se tratar de uma zona histórica. E depois porque, infelizmente, muita gente da vizinhança, em vez de ver aquilo como uma ameaça paisagística, vê como uma oportunidade para fazer mais um andar. É uma questão cívica.”

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Construção é mais alta do que os prédios vizinhos e gerou polémica em Lordelo do Ouro Paulo Pimenta

Recordemos o caso. A obra iniciada em Agosto deste ano num edifício típico daquela zona da cidade acrescentou um piso relativamente às casas vizinhas. A proposta de reconstrução e ampliação da moradia levantou dúvidas, inclusive, aos técnicos do município, que deram dois pareceres desfavoráveis ao projecto.

A casa, inserida no Bairro Particular S. João do Carmo, “área histórica”, segundo o regulamento do PDM, é mais alta do que as existentes à volta e tem um telhado plano de betão com terraço que, segundo David Baltazar, compromete as vistas para o Douro a partir do seu edificado. O entendimento da avaliação técnica da Direcção Municipal do Urbanismo ia nesse sentido, referindo ainda que a ampliação pedida não cumpria o regulamento e a cércea existente deveria ser mantida.

A promotora da obra fez alterações ao projecto, tendo em conta essa avaliação, mas o segundo parecer foi também desfavorável. “A volumetria resultante da proposta afigura-se excessiva face ao contexto urbano onde o prédio se insere”, referia, acrescentando ainda que o projecto não contribuía para a “imagem patrimonial da zona onde se insere”.

Em Junho de 2019, no entanto, a directora do departamento municipal de gestão urbanística mudava o rumo da história e emitia um parecer favorável. “A altura agora proposta para a edificação em pouco agrava a altura pré-existente, nem descaracteriza o conjunto no qual se insere, tratando-se de um edifício sem aparente qualidade construtiva”, escreveu, no despacho que seguiu para Pedro Baganha. O vereador com a pasta do Urbanismo acabaria, então, por licenciar a obra.

Os argumentos do juiz

Para o juiz que analisou o pedido de providência cautelar, os danos expostos por David Baltazar – o facto de o seu imóvel ter deixado de ter vistas para o Douro e a zona ribeirinha – são “insusceptíveis de ser evitados pela providência cautelar”, uma vez que o terceiro piso do prédio em causa já está consumado. “A obra já se encontra com a sua forma final, quer ao nível de altura, quer ao nível da volumetria”, lê-se na sentença consultada pelo PÚBLICO.

Tal conclusão não impede, todavia, que o caso tenha uma reviravolta. Se a sentença do processo principal entender que a obra é ilegal, o requerente terá direito “à reconstituição da situação que existiria se o acto anulado ou declarado nulo não tivesse sido praticado”, aponta o juiz, acrescentando que tal pode acontecer “através da demolição do edificado” ou “por conta da reintegração no seu património de todos os valores pecuniários de que se viu privado, designadamente, através de indemnização”.

Os prejuízos decorrentes desta obra – e a perda de valor do seu edificado – eram também argumentos de David Baltazar. Mas o juiz considerou não haver provas contundentes da “desvalorização imobiliária” e da interferência nas “receitas” do negócio.

A Câmara do Porto acrescenta, nas respostas ao PÚBLICO, que já agendou uma inspecção ao local para o dia 8 de Fevereiro.

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