Manchester United divorciou Cristiano Ronaldo de Jorge Mendes

Agente deixou mesmo de representar a sua super-estrela em Novembro, quando Cristiano rompeu com o United à sua revelia. Até ontem, a Polaris ainda geria os direitos de imagem.

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O empresário Jorge Mendes NUNO FERREIRA SANTOS

E tudo o Manchester United levou. Nesta frase, resume-se aquele que pode ter sido o final do mais frutuoso relacionamento de sempre entre um agente e um futebolista português. Estávamos a meio de Novembro passado quando, contra a vontade de Jorge Mendes, Cristiano Ronaldo tornou irreversível o divórcio com o clube inglês, ao conceder ao jornalista Piers Morgan uma entrevista propositadamente ofensiva para o treinador, para a estrutura e até para o cozinheiro. Mendes levava meses em busca de uma equipa de elite que aceitasse Cristiano e sabia que só havia uma: o Manchester United. Fechada essa porta, não se abriria outra.

Ronaldo e Mendes divergiam sobre o que estava para vir há algum tempo. O segundo pudera sentir bem o mercado quando Cristiano e a Juventus quiseram separar-se. O primeiro não admitia conformar-se com um papel secundário ou um palco menor do que a Liga dos Campeões.

Já em Old Trafford, a saída do antigo colega Solskjaer do Manchester United, e a entrada do alemão Ralf Rangnick (a quem, na entrevista, Ronaldo desconsiderou, chamando-lhe director desportivo), acelerou o choque com a realidade e também a frequência dos maus comportamentos de Cristiano, a maioria deles nunca vindos a público, mas sempre motivos de queixa do United a Jorge Mendes.

Ainda assim, havia em Rangnick uma bonomia de que o sucessor Ten Hag não é adepto. Perante a mesma relutância de Ronaldo em aceitar a autonomia do treinador, o neerlandês reagiu com dureza, para dentro e para fora. Demasiado para Cristiano.

Por essa altura, foi ainda Jorge Mendes quem atirou com a única alternativa (o Al-Nassr) que casava com a maioria das exigências do seu jogador, mas, quando rebentou a ponte com o Manchester United, não era na Arábia que Cristiano estava a pensar. Mendes estava enganado. Apesar de não ter feito pré-época, apesar dos parcos seis jogos a titular desde Setembro, apesar do registo de três golos, Ronaldo faria um Mundial lendário e a Europa voltaria a cair-lhe aos pés.

Em vez disso, chegou ao Qatar com o rendimento normal para um jogador de 38 anos sem ritmo e, pior do que isso, replicando o comportamento de Manchester. Jogadores e FPF abafaram quase tudo, mas o capitão foi um foco de irritação constante, sobretudo depois do Portugal-Coreia do Sul e acelerando rapidamente para o inflamatório depois do Uruguai-Portugal. Por essa altura, entra em cena a terceira figura do triunvirato, Ricardo Regufe.

Regufe começou como representante da Nike em Portugal há talvez vinte anos e, nessa condição, fez apoio logístico para a marca tanto na selecção como a Ronaldo. Com o tempo, cada vez menos à primeira e cada vez mais ao segundo, até se tornar membro a tempo inteiro do staff do jogador, sem abandonar os estágios e deslocações da equipa nacional, estranheza que ia sendo menos indiferente a uns colegas do que a outros.

Entre a Gestifute, empresa de Mendes, e Regufe também foram nascendo anticorpos. Embora o agente tenha continuado sempre com linha directa a Cristiano, os restantes elementos da empresa (a Polaris, por exemplo) passaram a lidar apenas com o braço direito. Curiosamente, ainda que tenham efectivamente cessado os serviços de representação desportiva de Mendes, a Polaris Sports, também da Gestifute, continuava responsável pela gestão dos direitos de imagem de Ronaldo. Pelo menos, até esta terça-feira.

Falhado o Campeonato do Mundo, e apesar das “muitas oportunidades na Europa, no Brasil, na Austrália, nos Estados Unidos e até em Portugal”, o primeiro acto de Ronaldo foi instruir Ricardo Regufe a contactar o Al-Nassr para saber se se mantinha o interesse comunicado em Novembro por Jorge Mendes. Não há notícia, contudo, de propostas da Europa e as de Portugal são difíceis de conceber, por vários motivos, mas talvez FC Porto, Sporting ou Benfica possam esclarecer a parte deles, supondo que tenha sido um dos grandes a interessar-se por trazer Ronaldo de volta a um campeonato que só conheceu pela rama.

A apresentação pelo Al-Nassr, nos tons em que a fizeram, e a afirmação, por Cristiano, de que mais nada havia a conquistar na Europa encerram definitivamente, e da pior maneira, a parceria Mendes-Ronaldo. O que fizeram não terá sido, a 100%, uma inovação. Beckham já trilhara um pouco os caminhos da superestrela (aliás, continua a ser o quarto futebolista mais seguido nas redes sociais, 10 anos depois da reforma), mas em termos de escala e planificação esse casamento superou tudo. Mas até a melhor planificação tem limites. Nos gabinetes da Gestifute, há quem diga há muito que Ronaldo acabaria no deserto.

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