A minha concordância com Paulo Raimundo

O grau de atração do partido é reduzido e será cada vez mais. Estes artigos dos Estatutos são uma forma de blindar o partido a qualquer mudança e de manter a sua estrutura intocada.

Tenho de concordar com Paulo Raimundo: o PCP não vai mudar e quem quiser aproximar-se tem de esquecer os motivos que os levaram a sair. Reconhecerão implicitamente que estavam errados e reaproximar-se-ão, coitados deles que se deixaram levar pelos gabirus que queriam outra coisa que não era o PCP.

Um dos grandes problemas do PCP não está nos que saíram; está, sobretudo, nos motivos que os levaram a sair e que se mantêm intactos e que são considerados por esta direção os traços essenciais definidores da natureza do partido.

O artigo 1.º, n.º2, estatui o seguinte: o PCP é a vanguarda da classe operária e de todos os trabalhadores. O papel de vanguarda do Partido decorre da sua natureza de classe, do acerto das suas análises e da sua orientação política…

Ora nos tempos que correm, tendo em conta o aumento dos assalariados provenientes de classes sociais designadamente pequenos agricultores e pequenos empresários, de profissões liberais; as modificações operadas dentro das classes trabalhadoras com a criação de novas camadas sociais; a natureza dos trabalhos ligados diretamente à produção fabril; a desindustrialização; a financeirização da economia; o alastramento dos serviços em detrimento da agricultura e da indústria, forçoso será concluir que a classe operária, no sentido histórico, deixou de ter todo o peso que tinha. Hoje já não tem a homogeneidade de há algumas décadas e muito menos do início do século XX. Rosa Luxemburgo, em 1916, em plena primeira Grande Guerra, defendia que, se a classe operária se mobilizasse, imporia à burguesia o fim da guerra.

O artigo 2.º estabelece: o PCP tem como base teórica o marxismo-leninismo, concepção materialista e dialéctica do mundo, instrumento científico de análise da realidade e guia para a acção que constantemente se enriquece e se renova dando resposta aos novos fenómenos, situações, processos e tendências de desenvolvimento. Em ligação com a prática e com o incessante progresso dos conhecimentos, esta concepção do mundo é necessariamente criadora e, por isso, contrária à dogmatização…

É preciso resolver uma questão acerca desta “fidelidade”, a saber, foi com base no marxismo-leninismo, o tal instrumento científico de análise da realidade e com a conceção do mundo necessariamente criadora, que os partidos comunistas dos países socialistas implodiram. Daqui decorre que, tendo todos eles guiado a sua política por este instrumento, o resultado foi um enorme desastre. Não foi científico, nem criador.

O artigo 16.º, n.º1, declara: a estrutura orgânica e o funcionamento do Partido assentam em princípios que, no desenvolvimento criativo do centralismo democrático, respondendo a novas situações e enriquecidos com a experiência, visam assegurar simultaneamente, como características básicas, uma profunda democracia interna, uma única orientação geral e uma única direcção central…

Foi com base nesse tal centralismo democrático e criativo que foram aplicadas diversas sanções a vários membros do partido por expressarem opiniões diferentes das da direção.

Enquanto uma dúzia de dirigentes tiver o poder de selecionar listas fechadas de dirigentes a todos os níveis do partido, a base da seleção serão os que esse núcleo escolhe e que o partido aceita, porque não tem outra alternativa para os que querem continuar a militar.

Acrescente-se que o centralismo permitiu a Álvaro Cunhal dar uma entrevista ao jornal espanhol El Mundo contra a direção da altura, afirmando que nela havia elementos liquidacionistas, portanto não respeitando a regra do centralismo. Criativo foi Cunhal, que mandou o centralismo pela janela fora.

Com base nestas orientações, o grau de atração do partido é reduzido e será cada vez mais. Estes artigos dos Estatutos são uma forma de blindar o partido a qualquer mudança e de manter a sua estrutura intocada, como foi confirmado por Paulo Raimundo, na entrevista ao último Expresso, com todo o prejuízo para o resgate e reconfiguração do ideal comunista.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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