Julgamento de militares da GNR de Odemira prosseguiu em Beja

Os depoimentos ouvidos na manhã de hoje realçam o bom comportamento dos sete elementos da corporação acusados de estarem envolvidos no sequestro e agressão de cidadãos indianos.

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Ouvidos os testemunhos prestados por militares da GNR, familiares e amigos de alguns arguidos LUSA/NUNO VEIGA

Prosseguiu esta manhã no Tribunal de Beja o julgamento de Rúben Candeias, Nelson Lima, Diogo Ribeiro, Nuno Andrade, João Miguel Lopes, Carlos Figueiredo e Paulo Cunha, militares da GNR acusados pelo Ministério Público (MP) por crimes de abuso de poder, sequestro e ofensa à integridade física qualificada. Incorrem em 33 crimes contra imigrantes em Odemira, em casos ocorridos em 2018 e 2019.

Na primeira sessão de julgamento que decorreu a 30 de Novembro, a Lusa referiu que os arguidos Nelson Lima e Diogo Ribeiro “foram os únicos que aceitaram prestar declarações ao colectivo de juízes do Tribunal de Beja que está a julgar o caso, depois da identificação dos arguidos e de um resumo dos factos que lhes são imputados”.

Nelson Lima, um dos dois arguidos que prestou declarações, classificou o sequestro de que são acusados os sete militares da GNR de “brincadeira parva e estúpida”, frisando, contudo, que não encarou a situação “com maldade”.

Também Diogo Ribeiro, o outro militar ouvido pelo colectivo, utilizou a expressão “brincadeira parva” para se referir a um dos casos de agressões em que reconheceu ter utilizado uma régua para atingir as vítimas.

Na sessão que decorreu na manhã desta segunda-feira no Tribunal de Beja foram ouvidos os testemunhos prestados por militares da GNR, familiares e amigos de alguns arguidos.

Bruno Miguel Tomaz, militar GNR, diz que “conhece bem” Rúben Candeias, considerando-o um militar “cumpridor” e que “gostava de ajudar” os outros.

João Tiago, também elemento da GNR, identificou perante o colectivo de juízes presidido por Vítor Maneta alguns objectos que os arguidos teriam utilizado na acção de sequestro, nomeadamente o que parecia ser uma caneta, mas que na realidade era um aparelho de gás pimenta, que o militar da GNR reconheceu ter um efeito “incómodo”.

Ao pronunciar-se sobre o carácter do arguido, Nelson Lima definiu-o como “um militar cumpridor e que nunca teve conhecimento de que tenha sido visado por comportamentos menos correctos”. Do ponto de vista pessoal, caracteriza-o como um “cidadão calmo, cumpridor, que não se impunha a ninguém”.

Também a postura e a conduta do arguido Carlos Figueiredo revelam um “homem cumpridor, trabalhador, bom colega”. Disse que não tem conhecimento de condutas “menos próprias”, sempre preocupado “pelo cumprimento da lei”.

Sobre Nelson Lima pronunciou-se Rui Miguel, militar da GNR, realçando as facetas de “bom camarada e amigo, com capacidade de iniciativa, voluntarioso, calmo, ponderado”, em relação ao qual não conhece queixas de colegas ou de civis.

A companheira de Nelson Lima, com quem vive em união de facto, também depôs na audiência desta manhã, para dizer que “nunca viu em casa nada que se parecesse com aparelhos para lançar gás pimenta. “O Lima é uma pessoa resguardada que quando não está de serviço está quase sempre em casa e nunca viu nem ouviu falar em vídeos”, acrescentou.

Um cidadão indiano que tem um supermercado no Algarve e conhece o arguido garantiu que é um “GNR muito bom a trabalhar”, lembrando que foi várias vezes ao seu estabelecimento para dirimir conflitos. E um amigo de há sete anos diz que o Nelson Lima é “um brincalhão” e que trata por igual toda a gente, sejam nepaleses, brasileiros ou moldavos. Quanto ao incidente de que é acusado, interpreta-o como “uma brincadeira sem intenção” de fazer mal, frisando que o que aconteceu não tem nada a ver com racismo.

O juiz Vítor Maneta perguntou-lhe que tipo de brincadeiras fazia com as vítimas. Mas não obteve uma resposta convincente.

O ponto alto da audiência de hoje no tribunal de Beja começou com o depoimento do pai de outro dos arguidos, João Miguel Lopes, quando foi questionado sobre uma das vozes que se ouvem no vídeo feito no decorrer de uma das acções de sequestro que envolvem os sete elementos da GNR.

Diz ter visto as imagens muitas vezes, mas nenhuma é do seu filho. “A voz não é do meu filho, juro pela minha honra”, garantiu. O juiz pediu-lhe que ouvisse e visse mais uma vez o vídeo em tribunal, mas continuou a afirmar que não identificou a voz do filho.

Outro militar da GNR, Luís Filipe Santos, também não viu nada de especial no vídeo e não identifica em João Lopes comportamentos racistas, embora admita que as imagens “têm coisas que não são correctas”. Também ele não conhece as vozes que dialogam enquanto prosseguem os maus-tratos a um cidadão indiano que se contorce com dores. “Se é a voz do Lopes, não consegui identificá-la, mas quase de certeza que não me parece o Lopes”, assume.

O juiz pergunta-lhe se sabe que o arguido já “foi condenado por comportamentos menos próprios em relação a cidadãos indianos”. O militar da GNR desconhecia. Daniel Fernandes, com o posto de capitão que comanda o destacamento de Gouveia, confirma ter visto o vídeo dos maus-tratos aplicados a um cidadão indiano e também não conhece no som gravado, a voz do Lopes.

As alegações finais do processo que envolve os sete militares da GNR serão pronunciadas no próximo dia 19 de Dezembro, pelas 9h30

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