Só IL fica ao lado do Chega a defender comissão de inquérito à gestão da covid-19

PSD, PS, BE, PCP e deputados únicos rejeitam proposta para investigar aquisições de bens e serviços durante a pandemia.

Foto
André Ventura defendeu que a maioria dos contratos públicos não teve controlo do Tribunal de Contas Nuno Ferreira Santos

A “banalização” de propostas para a criação de comissões parlamentares de inquérito e o escrutínio que já é feito pela Assembleia da República foram os dois principais argumentos que levaram os partidos a rejeitar a intenção do Chega de avançar para mais uma comissão de inquérito, desta vez à gestão da pandemia de covid-19.

No debate desta manhã, só a Iniciativa Liberal (IL) defendeu a necessidade deste instrumento parlamentar para apurar “responsabilidades políticas”. Mesmo assim, João Cotrim Figueiredo não deixou de acusar o Chega de tentar banalizar a criação de comissões de inquérito “por tudo e por nada”. Neste caso, a proposta em discussão “faz sentido” para se saber se a “actuação do Governo foi tão fantástica como diz ser”. Já em propostas anteriores de comissões de inquérito propostas pelo Chega, a IL mostrou o seu apoio. A proposta foi chumbada com os votos favoráveis do Chega e IL, e os votos contra das restantes bancadas.

O líder do Chega, André Ventura, argumentou a necessidade de criar um inquérito parlamentar com a falta de fiscalização a “milhares de contratos” feitos para aquisição de bens e serviços, apontando o caso dos ventiladores e máscaras. São mais de 22 mil contratos que envolvem “dois mil milhões de euros”. “De todos estes, 88,5% não tiveram fiscalização ou controlo do Tribunal de Contas”, disse o líder do Chega, apontando que “as suspeitas já levaram a procuradoria-geral europeia a investigar a aquisição de vacinas na União Europeia, incluindo em Portugal”.

À direita, o PSD colocou-se de fora, apesar de sublinhar o impacto da mortalidade gerado por aquilo que “se deixou de fazer” no SNS nas consultas e cirurgias. Guilherme Almeida admitiu até que avaliar o que aconteceu com a gestão da pandemia teria interesse, mas diz que cabe às autoridades fazê-lo. “Não estão reunidas as condições para a comissão de inquérito, não permitiria substituir a propaganda pela verdade”, disse.

O bloquista Pedro Filipe Soares acusou o Chega de falta de “seriedade” ao propor comissões de inquérito sucessivas. “É um desporto, não é uma vontade política. Não inviabilizaremos, mas não vamos branquear”, disse, lembrando que, quando havia pedidos à população para se resguardar, o Chega promovia “festas covid políticas” em almoços “sem máscara e sem distanciamento”.

Tanto o PCP como os deputados únicos do Livre e do PAN defenderam que a gestão da covid já é acompanhada transversalmente por várias comissões parlamentares e que um inquérito não se justifica.

“Agenda mediática protoconspiracionista”

O PS acrescentou ao argumento da banalização das comissões de inquérito outras críticas. André Pinotes Baptista acusou o Chega de ter uma “agenda mediática protoconspiracionista em explorar a dor”. O deputado considerou que o partido proponente “está a esvaziar as comissões do Parlamento” e que tenta “minar a credibilidade das instituições”, lembrando que na legislatura passada já existiu uma comissão de acompanhamento da gestão da covid.

Foi essa mesma comissão que João Cotrim de Figueiredo lembrou, mas para dizer que, nas suas conclusões, aprovadas pelo PS, apontava para a necessidade de continuidade da avaliação noutras conjunturas. Só que, ressalvou, a actual circunstância é de maioria absoluta. O líder (demissionário) da IL disse ver uma sintonia entre o partido de Ventura e o do Governo: “Uma perfeita simbiose política entre o Chega e o PS. A vossa banalização e exagero permitem ao PS fugir às suas responsabilidades.”

Em nome do Governo, a secretária de Estado da Promoção da Saúde, Margarida Tavares, recordou que “nenhum país estava preparado” para a pandemia de covid-19 e que se foi “aprendendo” com as medidas tomadas, sem se referir à questão dos contratos ou de outros actos específicos do Governo para combater a crise de saúde e social, que é o objecto do inquérito proposto. Um discurso que André Ventura disse ser “caricato” e assemelhar-se a um “acto de contrição na Igreja”.

Desde o início da legislatura, o Chega propôs cinco comissões de inquérito, tendo retirado a que pedia uma investigação à avaliação do processo de reestruturação do SIRESP. Já foram discutidas três propostas e duas foram chumbadas: uma sobre a credibilidade dos Relatórios Anuais de Segurança Interna que o Governo apresenta à Assembleia da República, outra sobre a actuação do Estado português nas parcerias com associações de cidadãos russos sobre o acolhimento de cidadãos ucranianos em Portugal. O mesmo destino parece ter a terceira proposta debatida esta manhã em plenário.

Falta ainda discutir a proposta sobre um inquérito parlamentar em torno da eventual ingerência do primeiro-ministro no Banco de Portugal para proteger a filha do ex-Presidente de Angola. O debate está marcado para dia 14 deste mês.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários