Cartas ao director

Os cucos das belas causas

Uma particularidade dos cucos é a de colocarem os seus ovos em ninhos alheios, aproveitando o esforço e a dedicação de outras espécies para fazerem vingar as suas crias, expulsando inclusive do ninho os inocentes que a ele tinham direito.

Nos anos 1980, fui expulso de uma marcha “pela paz”, organizada na sequência do anúncio da instalação de mísseis americanos na Europa. Aparentemente, os Pershing americanos constituíam uma ameaça à paz, mas os SS-20 soviéticos não. Dizer “nem a leste, nem a oeste” não era coisa aceitável dentro dos objectivos dos organizadores. Hoje, ainda continuamos a ver muitos “pacifistas unilaterais” e algumas posições quanto à tragédia em curso na Ucrânia estão aí, claras.

Outra boa causa actualmente parasitada por “cucos” é a do ambiente. Se é indiscutível a necessidade de mudarmos os nossos hábitos, convém recordar que a eficácia virá de uma abordagem racional e científica e não de um fervor religioso ou emocional. Sobretudo, é inquestionável serem os países ocidentais e “capitalistas” que mais preocupação e acções concretas têm tomado neste capítulo.

Aproveitar a inquietação dos jovens quanto ao futuro e apropriar-se delas para apelar ao “fim ao capitalismo”, sobretudo quando os modelos alternativos pouco ou nada fizeram pelo dito ambiente, é manipulação desonesta, é uma subversão dos objectivos e um péssimo favor à causa. Cucos…

Carlos J.F. Sampaio, Esposende

Qatar e o nosso regabofe

O Qatar, Doha a quem doer, está a ser palco do Campeonato do Mundo de futebol, onde não se olharam aos milhões que se gastaram e gastarão. Entretanto, os direitos humanos de milhares de inocentes, para tais bandas, foram e continuam a ser esquecidos. Cá na terrinha lusa, dos badalados “brandos costumes”, é um regabofe de desperdício, uma vez que o triunvirato que está à frente da nação, ou seja, o Presidente da República, o presidente da Assembleia de República e o primeiro-ministro não se coíbem de ir lá, em demanda da bola.

E, em contraciclo do apertar o cinto para a população em geral, para eles é o “deita para lá”; é “à tripa forra”; é um “desgoverno”​, enquanto também esquecem os direitos humanos flagelados. As três individualidades bem podiam ficar em casa a ver os jogos, como a grande maioria dos seus compatriotas. Mas não! Poupavam-nos gastos mais que inoportunos, beneficiavam o ambiente com a deslocação e honravam o martirizado ser humano.

José Amaral, Vila Nova de Gaia

Deslocações ao Qatar

Entre os vários argumentos que os políticos usam para justificar a qualquer custo as suas deslocações ao Qatar, distingue-se o que apresenta a selecção como o símbolo da bandeira nacional, que representa o país e que por esse facto os mais altos dignitários do Estado devem estar presentes, não só para o apoio representativo do país à selecção, mas também para internacionalmente projectarem Portugal.

Se assim é, quantos dos nossos atletas, que também vestindo a bandeira nacional, nunca viram tais dignitários presentes nos campeonatos mundiais em que participaram, honrando e prestigiando este país com a atribuição de medalhas de ouro, prata e bronze? Por exemplo, alguém esteve presente no Campeonato Mundial de Hóquei em Patins, onde até era previsível um lugar de destaque nesse Mundial? E que dizer ao esquecimento geral a que foi votada a selecção nacional feminina de hóquei em patins, que também vestiu a bandeira nacional e que honrou o país com um 3.º lugar? Nem uma única palavra de reconhecimento foi dada.

Se querem a todo o custo ir ao Qatar, vão, façam-no a título particular e não usem os nossos impostos para pagar esses delírios. Deixo um desafio aos senhores jornalistas: investiguem e publiquem os gastos que estas viagens custaram ao erário público.

Victor Soares

Direitos humanos vs. futebol

Muito se tem falado dos direitos humanos no Qatar a propósito do Mundial de futebol. Convém não esquecer que em 1970, quando o Brasil foi campeão do mundo, a pátria que viu nascer Manuel Bandeira, Olavo Bilac e Machado de Assis era governada por uma ditadura militar encabeçada por Emílio Médici. Quando a Argentina ergueu o troféu em 1978, uma poderosa ditadura militar era quem mais ordenava. A bola é redonda, mas a justiça nem sempre é cega. O Irão participa no Mundial do Qatar e participa numa imensa repressão sobre contestatários. Onde rolam as sanções? A cada golo festejado, um grito ecoa nas masmorras. Nada que a impeça de tentar a sagração. O desporto é sagrado. Não devemos misturar política nas competições desportivas. Sendo assim, os desportistas russos podiam e deviam participar em competições internacionais.

Ademar Costa, Póvoa de Varzim

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