Medidas anticovid da China originam protestos na maior fábrica de iPhones do mundo

Pequim mantém política “covid zero”, mas os casos estão a aumentar e as perspectivas económicas a diminuir. Na fábrica contratada pela Apple, milhares de trabalhadores fugiram às restrições.

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Três anos de pandemia depois, a China mantém medidas restritivas para conter o vírus CHINA DAILY/Reuters

Os trabalhadores da maior fábrica de iPhones do mundo, na China, iniciaram uma vaga de protestos contra as medidas impostas para combater a pandemia de covid-19. A manifestação mais recente aconteceu na manhã desta quarta-feira e terá envolvido centenas de operários, alguns dos quais quebraram janelas e câmaras de vigilância.

Na fábrica da Foxconn de Zhengzhou, de onde saem cerca de 70% de todos os iPhones a nível mundial, trabalham à volta de 200 mil pessoas. No fim de Outubro, quando foram detectados casos de covid entre os trabalhadores, a empresa subcontratada pela Apple estabeleceu um sistema que implica que estes nunca abandonem as instalações, para impedir a propagação do vírus.

A decisão levou muitos a fugir, segundo a Reuters, e obrigou a Foxconn a aumentar salários e a prometer bónus aos trabalhadores que ficassem. Esta quarta-feira, muitos queixaram-se em vídeos publicados nas redes sociais que a empresa falhou o pagamento dos bónus e que nos dormitórios coabitam pessoas infectadas e não infectadas.

“É evidente que a produção em circuito fechado da Foxconn só evita a propagação da covid para a cidade, mas nada faz (se é que não faz mal) pelos trabalhadores na fábrica”, comentou à agência Aiden Chau, da organização China Labour Bulletin.

As imagens que correm nas redes sociais mostram os trabalhadores a marchar e a gritar palavras de ordem, enquanto uma multidão de pessoas com fatos brancos e a polícia de choque lhes impedem a passagem. “Põem-nos em quarentena, mas não nos dão comida”, queixa-se um homem, citado pela BBC. “Mudaram-nos o contrato, para que não pudéssemos receber o subsídio que tinham prometido”, acrescenta.

A Foxconn disse que é “manifestamente falso” que os trabalhadores infectados com covid-19 estejam a coabitar com os outros e também negou que tenha pagamentos de bónus em falta.

A fuga de operários está a originar problemas graves na fábrica, onde quase um terço das linhas de produção está parada. A Apple já anunciou que espera uma chegada mais lenta do novo iPhone 14 ao mercado. Um gabinete do Exército chinês pediu aos veteranos, em carta aberta publicada na semana passada, que respondessem “ao apelo do Governo” e ajudassem “na retoma da produção”. O jornal chinês Global Times calculou que são necessários 10 mil operários para repor os níveis de produção.

As decisões da Foxconn estão alinhadas com a política “covid zero” do Governo de Xi Jinping, que ao fim de três anos de pandemia continua a impor confinamentos rigorosos e medidas muito restritivas para tentar conter uma propagação generalizada do vírus. Na terça-feira, segundo os dados oficiais, foram registados 28.883 novos casos, o que é um valor baixo para uma população que supera mil milhões de pessoas, mas já está quase ao nível dos níveis mais altos de infecção diária registados em Abril.

Todavia, o número de novas infecções está a subir e as autoridades decretaram novos confinamentos, que estão a tornar-se cada vez mais impopulares. Em Pequim foi encerrado o acesso a parques e em Xangai os recém-chegados estão impedidos de frequentar restaurantes e outros locais. Um pouco por todo o país as administrações locais e regionais estão a fazer testagens maciças.

“Apesar de a estratégia covid zero se ter vindo a tornar mais leve com o tempo, a combinação entre variantes de covid mais contagiosas e falhas persistentes na vacinação têm levado a confinamentos mais frequentes, afectando o consumo e o investimento privado”, alertou Gita Gopinath, economista-chefe do Fundo Monetário Internacional.

As últimas projecções da organização apontam para um crescimento de 3,2% do PIB chinês em 2022, o que corresponde a uma queda face ao crescimento do ano passado (8,1%) e ao segundo pior desempenho da economia chinesa desde 1980. O pior foi em 2020.

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