Nova edição do PSuperior: Marcelo preocupado com “clivagem” no acesso à informação

“A pobreza também se traduz no acesso à cultura” e à informação, disse o Presidente da República, que marcou presença na cerimónia de apresentação da 4.ª edição do PSuperior.

Foto
Marcelo Rebelo de Sousa esteve esta tarde na redacção do PÚBLICO Aleks Arkin

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, disse nesta terça-feira que “se está a aprofundar uma clivagem” na sociedade portuguesa no que diz respeito ao acesso à informação. O chefe de Estado falava na redacção do PÚBLICO de Lisboa durante a cerimónia de apresentação da 4.ª edição do programa PSuperior, que tem mais de 5000 assinaturas do PÚBLICO para atribuir a estudantes do ensino superior. Desinformação e fake news foram os temas que, além de estarem na ordem do dia, estiveram em debate.

“Está a aprofundar-se uma clivagem, que já não é só uma clivagem etária: os menos jovens, considerando-se muitas vezes num gueto e arrumados num canto, e os jovens, não percebendo exactamente o país e o mundo que herdam e considerando-se injustiçados neste sentido”, disse Marcelo Rebelo de Sousa. "Há uma divisão no acesso à informação cada vez mais profunda entre estes dois hemisférios.”

No primeiro “hemisfério”, o dos mais velhos, estão as pessoas que têm um menor e pior acesso à informação, onde cada um “vai descolando da realidade e vai chegando à realidade por meios cada vez mais distantes, vagos, difusos”. Não são, de resto, só os mais velhos, mas também os mais pobres, disse Presidente da República. “Porque a pobreza também se traduz no acesso à cultura” e, subsequentemente, à informação.

Por outro lado, os jovens acedem com mais facilidade à informação, a informação certificada e de qualidade, “tendo uma apetência para saber mais, conhecer mais, ter melhor informação, para seleccionar as fontes de informação, para controlar a fidedignidade das fontes de informação”, frisou Marcelo.

Com projectos como o PSuperior esse acesso é facilitado. Mas Marcelo Rebelo de Sousa fala de uma tarefa “desigual e muito difícil”, devido a “uma grande assimetria” no acesso à informação. “Esta assimetria preocupa-me porque passamos a ter várias sociedades, várias sociedades no acesso à informação, na utilização da informação, na tomada de posições perante a informação. E, depois, vários discursos para essas várias sociedades.”

PSuperior: uma ponte entre a academia e a actualidade

Presente na cerimónia esteve também o secretário de Estado do Ensino Superior, Pedro Teixeira, que sublinhou a importância da iniciativa tanto para os estudantes como para as instituições de ensino. Do lado dos estudantes, porque são “exigentes” e querem “uma formação superior de qualidade, científica e pedagógica”. Mas também “querem que o ensino superior seja um espaço de realização e de desenvolvimento pessoal do ponto de vista da cidadania e muito do seu dinamismo e da relevância decorre de as universidades e os institutos politécnicos serem um espaço de cidadania”.

Por outro lado, o PSuperior é importante para as universidades e politécnicos na medida em que a sociedade pede ao ensino superior que “esteja aberto e atento à comunidade”. “Mas pede-nos também que seja um ensino superior com autonomia crítica relativamente ao mundo, para o compreender, para o analisar e para o criticar. Por isso, esta iniciativa é muito importante, porque cria uma ponte com a actualidade.”

Para o presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), António Sousa Pereira, vive-se actualmente “num tempo em que a verdade e a mentira se confundem e em que competem quase sem distinção pelo mesmo espaço público”. Para o também reitor da Universidade do Porto, o PSuperior representa uma forma de os jovens chegarem a uma “informação livre, plural e rigorosa”, num ambiente em que a literacia mediática predomine “entre os estudantes universitários, contribuindo para a sua instrução num saber hoje essencial”.

A abrir a sessão esteve o director do PÚBLICO, Manuel Carvalho, que frisou: os jovens que receberam a assinatura gratuita do PSuperior ​estão no mesmo “nível de interesse e de envolvimento com as notícias que o PÚBLICO produz diariamente” que qualquer outro assinante tradicional. Para o director, os jovens apresentam, também, o mesmo índice de leitura e o mesmo tempo investido na leitura que os assinantes de 40 ou 50 anos de idade. É isso que os dados mostram, ou seja, “a ideia feita de que os jovens não se interessam tanto por notícias” não é real. E deixou uma mensagem aos jovens, pedindo-lhes “que se preocupem, que se empenhem e que não deixem que as grandes causas do nosso tempo fiquem entregues a terceiros”, fazendo-o “com conhecimento de causa” e com base no acesso a informação com rigor.

O PSuperior conta com uma rede de mecenas da qual fazem parte a Fidelidade, a Fundação José Neves, a Fundação Inatel, a Fundação Eugénio de Almeida, a Google, a NTT Data, a Fuel, a Porto Editora e a Mediabrands.

Um dos beneficiários de uma assinatura no PÚBLICO, na 3.ª edição do programa, foi João Veloso, recém-licenciado pelo curso de Ciências da Comunicação da Universidade do Porto. “O PSuperior deu-me acesso a mais e a melhor informação e ajudou-me na minha educação superior, na área da comunicação e do jornalismo, mas ajudou-me também a tornar-me num melhor cidadão”, disse. “Um cidadão que se interessa em ser bem informado e em informar bem os outros. Um cidadão que quer ouvir diferentes opiniões e pontos de vista. Um cidadão com um espírito crítico mais forte. Um verdadeiro cidadão.”

“Pessoas mais informadas são melhores profissionais"

Segundo a administradora executiva da Fundação Eugénio de Almeida, Maria do Céu Ramos, a literacia mediática, em concreto, através das assinaturas dos jovens, pode promover a igualdade de oportunidades. “O acesso a jornalismo de referência e notícias que o são verdadeiramente” contribui para que os jovens “criem hábitos de leitura de jornais”. Maria do Céu Ramos acrescentou ainda que cultura “não é só ir ao teatro, ao cinema ou aos concertos”. É também “ler notícias”.

Jorge Magalhães Correia, da Fidelidade, referiu que no mundo actual, e em concreto para as empresas, “não basta ter bons médicos, bons advogados ou bons gestores”. “Precisamos também que essas pessoas sejam bons cidadãos. Ou seja, pessoas que sejam capazes de contribuir para a valorização do país, pessoas que acreditem nos valores de um estado de direito, democracia, nos valores de humanismo, que possam compreender a complexidade do mundo actual, que exerçam uma cidadania informada. Essa é a única vacina contra o populismo”, sublinhou. “Pessoas mais informadas são melhores profissionais e são pessoas decentes e ajudam melhor o país.”

Pedro Nuno Teixeira, secretário de Estado do Ensino Superior Aleks Arkin
João Veloso, estudante da 3.ª edição do PSuperior Aleks Arkin
Bernardo Correia, country Manager Portugal Google Aleks Arkin
Jorge Magalhães Correia, presidente do Conselho de Administração da Fidelidade Aleks Arkin
Manuel Carvalho, director do PÚBLICO Aleks Arkin
António Sousa Pereira, presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas Aleks Arkin
Administradora executiva da Fundação Eugénio de Almeida, Maria do Céu Ramos Aleks Arkin
Francisco Caneira Madelino, presidente do Conselho de Administração da Fundação INATEL Aleks Arkin
Fotogaleria
Pedro Nuno Teixeira, secretário de Estado do Ensino Superior Aleks Arkin

Durante a cerimónia, a humorista Luana do Bem levou ao tema da literacia mediática e desinformação um tom mais descontraído. Apesar de ter confessado ser uma “carta fora do baralho”, uma vez que as fake news são uma das formas de desenvolver o seu trabalho humorístico, acredita que “apostar” na literacia mediática é uma forma de se combater os problemas da desinformação, com os quais muitas vezes goza.

Por sua vez, o presidente do Conselho de Administração da Fundação INATEL, Francisco Caneira Madelino, aconselhou os jovens a tornarem-se “mais capazes de ler as notícias e percebê-las” e a não quererem “passar a vida a imitar os outros”.

Sugerir correcção
Ler 6 comentários