Inclusão? Só às terças-feiras

Não tenho fórmulas ou receitas. Corroboro Coimbra de Matos e os que o perpetuam: é pela relação que nos damos um ao outro e nos transformamos. Nisto eu acredito.

Nas ementas preparadas para a semana, cada dia traz estipulado o feito gastronómico que será consumido em cada dia específico. Uma questão de organização.

As escolas fazem parte desta organização. Cada aluno saberá qual a ementa semanal numa rápida pesquisa. Mas, contrariamente ao desejado, a escola traz mais cardápios que saem do âmbito do refeitório. Às segundas têm Cidadania, às terças “Inclusão”, às quartas Educação Física, às quintas Matemática, às sextas reuniões e tabelas Excel e, no final da semana, acabamos em modo exclusão. Num exclusivo onde desejaríamos menos precedentes.

Vejamos, a inclusão, ou respeito pela diversidade (expressão que prefiro), não carece de decreto. Quando decretado ou formalizado, toda a sua dimensão e objetivo perece antes de florescer. Situações como olhar para os alunos com mais limitações como colegas de turma; auxiliar nas necessidades possíveis; acompanhar o colega à sala fazem parte de uma consciência cívica, fazem parte de uma sociedade mais empática e tolerante. E, por muitas evidências ou ações necessárias para ilustrar um Projeto Educativo e um Plano Anual de Atividades, são precisamente aquelas que não estão sob a luz de holofotes ou fotografias que desempenham exatamente a função.

Parece existir uma espécie de memória muscular onde alunos, embora com limitações, mas perfeitamente capazes de estar num contexto educativo, são delegados apenas para professores coadjuvantes e assistentes operacionais. São as ilhas da escola. Onde a assunção de pertencerem à turma é deturpada por esta dimensão paralela. Alguém se encarrega, eu não. Sem evidências científicas que me sustentem, arrisco afirmar que este distanciamento é mais flagrante no Ensino Secundário.

Vamos a factos registados. Há professores que “fogem” na hora de dar aula aos “especiais (como são chamados) para voltar logo a seguir. Há projetos de inclusão que são tratados e celebrados em Word. Com muitas fotografias e notícias no final. Com muitas visitas exteriores numa maratona, que poderia facilmente ser intitulada: “A nossa escola é melhor do que a vossa.” Há pedidos a pais para que os colegas possam fazer uma escala para ajudar os (aqui vamos mais uma vez)” especiais” dentro e fora da sala de aula. Há pais que não concordam e outros que apoiam, mas apenas à terça-feira.

As cadeias comportamentais não se quebram por ações pontuais ou por enumerar os pontos legislativos que obriguem A ou B a aceitar X ou Y. Não há nenhuma tabela de Excel que contabilize em percentagem o bom senso ou consciência cívica.

Num universo paralelo, sem qualquer tipo de autoanálise, é neste ridículo que tropeçamos e aceitamos. Horas marcadas para a empatia. Dias para ser um bom samaritano. Um check no fim da tarefa diário. E de olhos vendados seguimos, de legislação em riste porque, estando escrito e tabelado, torna-se evidente.

Não tenho, também, fórmulas ou receitas. Corroboro Coimbra de Matos e os que o perpetuam: é pela relação que nos damos um ao outro e nos transformamos. Nisto eu acredito.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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