Governo recusa estar a condicionar revisão constitucional sobre emergência sanitária

Ministra da Presidência frisa que “o debate é feito na Assembleia da República”, porém Vieira da Silva sublinha que intenção do Governo consistiu em partilhar informação.

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Mariana Vieira da Silva esteve esta quinta-feira no briefing do Conselho de Ministros LUSA/MANUEL DE ALMEIDA

O Governo recusou esta quinta-feira que esteja a condicionar os deputados sobre a forma como a questão da emergência sanitária deve constar no futuro processo de revisão constitucional, alegando que se tratou apenas de “partilha de informação”.

Esta posição foi transmitida pela ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, depois de ter sido confrontada com a reacção negativa de vários deputados, alguns do PS, pelo facto de o primeiro-ministro, António Costa, ter enviado na quarta-feira para o Parlamento novos contributos da comissão técnica por si nomeada sobre protecção em emergência de saúde pública.

De acordo com a ministra da Presidência, ainda durante a anterior legislatura, o Governo solicitou a um grupo de trabalho uma reflexão sobre as dimensões legislativas necessárias para enquadrar medidas que o executivo, o Presidente da República e Parlamento, “em articulação, tomaram durante a pandemia da covid-19”.

“Estando aberto um processo de revisão constitucional, o Governo entendeu que fazia sentido a partilha de informação actualizada sobre essa reflexão. Fazia sentido que a Assembleia da República, no seu todo, a conhecesse – uma vez que este é um dos temas que pode estar em debate” numa eventual revisão constitucional, justificou Mariana Vieira da Silva.

Neste ponto, a ministra acentuou que o objectivo do primeiro-ministro “foi o de não manter a informação que já tinha sido disponibilizada aos diferentes partidos e Assembleia da República situada no momento anterior do tempo”. Por isso, agora, “foi partilhada informação mais actualizada sobre essa mesma comissão técnica”, reforçou.

Mariana Vieira da Silva defendeu mesmo que “era dever do Governo a partilha dessa informação, tal como já tinha partilhado o estudo feito há alguns meses”.

“O debate é feito na Assembleia da República. Outro tema diferente é partilharmos a reflexão que seria iniciada pelo Governo em outro contexto, no quadro de uma alteração legislativa. Partilhámos informação de que dispomos com o objectivo de essa matéria ser um dos temas que pode vir a estar em causa na revisão constitucional. Quanto às decisões em matéria de revisão constitucional, cabem à Assembleia da República e aos diferentes grupos parlamentares”, acrescentou.

Na nota divulgada na quarta-feira pelo gabinete do primeiro-ministro, refere-se que, “tendo sido iniciado um processo de revisão da Constituição”, António Costa “entendeu solicitar à comissão técnica que ponderasse novamente a necessidade de introduzir uma norma constitucional que reforce a segurança jurídica do conjunto de previsões constantes do anteprojeto de Lei de Protecção em Emergência de Saúde Pública e, em face desta nova circunstância, propusesse o que lhe parecesse mais conveniente”.

Reforço da “segurança jurídica"

Nessa nota, aponta-se que desta “nova ponderação, e com este novo contexto, resultou uma nota com as propostas que, no entender da comissão técnica, eliminam qualquer margem de incerteza e reforçam a segurança jurídica”.

“Não dispondo o Governo de competência de iniciativa em matéria de leis constitucionais, deve, porém, facultar a quem a detém –neste caso, à Assembleia da República – toda a informação técnica adequada à sua livre consideração e apreciação para que, querendo, a possa ter em devida conta”, alega depois o executivo.

Segundo o gabinete do primeiro-ministro, os novos contributos da comissão técnica foram enviados na quarta-feira à Assembleia da República.

A comissão técnica sugere, no âmbito dos trabalhos da comissão eventual de revisão constitucional, que seja aditada uma nova alínea: “Separação de pessoa portadora de doença contagiosa grave ou relativamente à qual exista fundado receio de propagação de doença ou infecção graves, determinada pela autoridade de saúde, por decisão fundamentada, pelo tempo estritamente necessário, em caso de emergência de saúde pública, nos termos da lei.”

Em Junho de 2021, o Governo constituiu uma comissão técnica para o estudo e elaboração de anteprojetos de revisão do quadro jurídico vigente em função da experiência vivida durante a pandemia da covid-19.

A comissão técnica foi constituída pelo juiz-conselheiro jubilado António Henriques Gaspar, o procurador-geral-adjunto João Possante, em representação da Procuradora-Geral da República, Ravi Afonso Pereira, em representação da Provedora de Justiça, e Alexandre Abrantes, professor catedrático da Escola Nacional de Saúde Pública.

No sábado, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, recusou pronunciar-se sobre a revisão constitucional por ser um processo em que não tem qualquer intervenção, mas voltou a alertar para a necessidade de mexidas nas questões dos metadados e da emergência sanitária.

O Chega entregou no Parlamento um projecto de revisão constitucional que foi admitido em 12 de Outubro, com uma observação do presidente da Assembleia da República: “A remeter à Comissão Eventual a constituir para o efeito.” Segundo a Constituição da República, “apresentado um projecto de revisão constitucional, quaisquer outros terão de ser apresentados no prazo de trinta dias”.

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