Duarte Cordeiro: “Não fazer nada é caminhar para catástrofe ambiental”

O ministro do Ambiente e Acção Climática, Duarte Cordeiro, mantém ambições do Acordo de Paris e antecipa metas: 80% da energia será de fontes renováveis em 2026 (e não 2030, como previsto).

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LUSA/TIAGO PETINGA

O ministro do Ambiente e Acção Climática considera que a União Europeia (UE), numa altura de guerra e suas consequências, deve manter-se firme nos objectivos ambientais, e avisa que “não fazer nada é caminhar para a catástrofe ambiental”.

Em entrevista à agência Lusa a propósito da 27.ª Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP27), que reúne representantes de quase 200 países a partir de domingo em Sharm el-Sheikh, no Egipto, e na qual vai participar, Duarte Cordeiro garante que esta não é a altura de vacilar. E que é preciso tudo fazer para impedir que o aquecimento global vá além de 1,5 graus Celsius acima dos valores médios da era pré-industrial, como acordado em Paris em 2015.

Acompanhe a COP27 no Azul

A Cimeira do Clima das Nações Unidas é o ponto mais alto da diplomacia em torno das alterações climáticas, onde os países discutem como travar as emissões de gases com efeito de estufa que causam o aquecimento global. Este ano é no Egipto, de 6 a 18 de Novembro. Acompanhe aqui a Cimeira do Clima. 

Porque a COP27 se destina a debater as alterações climáticas, quando se multiplicam catástrofes naturais decorrentes do aquecimento global, Duarte Cordeiro insiste que o preço de não agir agora será muito alto no futuro. “Também temos de perceber que não fazer nada é caminhar para a catástrofe ambiental”, avisa.

O ministro reconhece que a conferência do Egipto é intercalar, que tem um objectivo de prolongar o diálogo estabelecido no ano passado, na COP26, em Glasgow, Reino Unido, mas não lhe retira por isso importância.

A COP27, recorda, vai abordar os temas da mitigação, da adaptação, do financiamento e do diálogo sobre compensação por perdas e danos relativamente aos países mais afectados pelas alterações climáticas.

O impacte da guerra na Ucrânia

Duarte Cordeiro reconhece que quanto à mitigação, sob a forma da redução de emissões de gases com efeito de estufa, há uma preocupação de que a guerra na Ucrânia e as consequências que resultam em crise energética, inflação e crise alimentar, possa levar a “uma menor ambição dos países” face aos objectivos do Acordo de Paris. Mas diz que se espera que Portugal e a UE reafirmem as políticas e os objectivos que podem conduzir às metas de Paris.

“No actual contexto de guerra e crise de energia, países recuaram em políticas por questões de segurança energética. O nosso país manteve e entende que tem condições para acelerar as suas políticas energéticas”, procurando “aproveitar vantagens do país para acelerar a produção de energia renovável”, diz Duarte Cordeiro em entrevista à Lusa.

Duarte Cordeiro reconhece que a nível energético este ano “tem sido difícil”, decorrente da crise provocada pela invasão da Ucrânia pela Rússia e suspensão de fornecimento de gás natural à UE, mas acrescenta que na Europa há uma tentativa de acelerar a transição energética, o mesmo acontecendo em Portugal, que quer ter 80% da energia proveniente de fontes renováveis antes de 2030.

​A par dos projectos de energia renovável, a adaptação das redes eléctricas, adiantando que “em breve” poderá haver respostas a esse nível, sem esquecer a política de gases renováveis, entre eles o hidrogénio verde, com mais de 70 projectos, que se todos se concretizarem representam um investimento de cerca de dez mil milhões de euros.

Duarte Cordeiro afirma-se ainda convicto de que Portugal vai ser um produtor de gases renováveis, e que os vai exportar, tendo um papel na descarbonização do país mas também da Europa.

Actualizar compromissos

“Na COP27, ao nível da mitigação, acho que é fundamental a actualização dos compromissos nacionais, e haver esse compromisso de actualização (das reduções de emissões) é determinante”, adianta. A UE, que tem dos “compromissos mais ambiciosos”, garante, fará a sua parte.

Duarte Cordeiro lembra o “Fit to 55” (Objectivo 55), pacote europeu para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa (GEE) em 55% até 2030. E diz que Portugal está alinhado com esse objectivo, acrescentando que vai mesmo procurar antecipar metas, nomeadamente do lado da energia, procurando que 80% da energia produzida seja de fontes renováveis já a partir de 2026 e não 2030.

O ministro reforça o que diz citando relatórios recentes das Nações Unidas, segundo os quais o esforço de reduzir a emissão de emissões não está a ser suficiente e que a humanidade, com as actuais medidas, caminha para um aumento de temperatura no final do século de 2,8 graus Celsius, com os impactos que tal terá em termos globais.

“É necessário não recuar nas ambições. A UE tem feito parte das zonas do globo com maior ambição em políticas ambientais e em particular na questão da redução de emissões. O apelo vai ser de assumir essas ambições. É importante percebermos as consequências de não fazermos nada ou de recuarmos nos objectivos ambientais que determinamos. Não estamos numa circunstância de não fazer nada. Manter os objectivos ou aumentar a ambição traz consequências, desde logo o impacto das alterações climáticas. Um relatório do Eurostat fala de 145 mil milhões de euros de impacto das alterações climáticas na última década”, diz o ministro.

Sobre o que pode sair da COP27, acrescenta ser “absolutamente determinante que compromissos se materializem, que haja uma actualização” desses compromissos, e que UE tem de dar o exemplo.

E se há essa “evidência” de que se nada for feito as catástrofes vão ser cada vez maiores, a COP27 terá também como grandes temas a adaptação e o financiamento.

Perdas e danos

Neste apoio a países menos desenvolvidos para adaptação às alterações climáticas, Duarte Cordeiro destaca também o papel de Portugal, o compromisso assumido em Glasgow de apoiar a mitigação e também a adaptação. E há, lembra, o compromisso dos países ricos de financiarem a luta dos mais pobres contra o aquecimento global com 100 mil milhões de dólares anualmente, havendo a necessidade de reafirmar esse compromisso, que ainda não foi concretizado.

Portugal, acrescenta o ministro, divide o financiamento assumido até 2030, quatro milhões de euros por ano, entre a mitigação e a adaptação. E está a estudar a possibilidade de reforçar esse apoio.

“Estamos a trabalhar no aprofundamento do reforço de financiamento, através de diálogo com algumas instituições financeiras internacionais”, como Banco Mundial, para que “qualquer financiamento adicional que Portugal venha a acrescentar possa alavancar financiamento internacional e que seja dedicado e concretizado em função dos objectivos dos países em desenvolvimento”, explicou.

O ministro enfatizou ainda o apoio de Portugal a uma iniciativa da ONU para criar um sistema de alertas precoces para desastres climáticos, “fundamental também ao nível da adaptação e preparação, para evitar consequências associadas a catástrofes naturais”.

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