Como se recupera de um AVC?

No Dia Mundial do AVC, nada melhor que mostrar um exemplo real de que existe vida depois de um acidente vascular cerebral e de que um acompanhamento médico pode fazer toda a diferença.

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"O ideal é mantermos os cuidados de saúde para ajudar a prevenir um AVC" PÚBLICO/Arquivo

A 29 de outubro assinala-se o Dia Mundial do Acidente Vascular Cerebral (AVC). Apesar da sigla amplamente repetida, pode não ser claro para todos que um AVC isquémico acontece quando se entope uma artéria que leva sangue para o cérebro e um AVC hemorrágico ocorre quando uma artéria cerebral rebenta. Sabemos que as consequências variam com a zona do cérebro atingida, mas, frequentemente, o doente manifesta pelo menos um dos sinais de alerta: dificuldade em falar, desvio da boca, ou falta de força num lado do corpo.

O ideal é mantermos os cuidados de saúde para ajudar a prevenir um AVC: uma alimentação saudável, atividade física regular, não fumar e uma vigilância médica para detetar e tratar problemas que aumentem o risco de AVC. Mas, sofrendo-se um AVC, para além dos tratamentos da fase aguda, há a considerar a prevenção secundária, ou seja, medidas para evitar poder ter um novo AVC e a reabilitação física, psicológica, assim como a reintegração familiar, social e profissional.

Após um AVC isquémico, é administrado um medicamento para a circulação sanguínea, evitando que se possam entupir de novo as artérias. É importante estudar o que possa ter causado o AVC, para se tratar e evitar repetição, mantendo-se a vigilância médica e realizando exames e análises de prevenção. É igualmente fundamental deixar de fumar, melhorar alimentação e atividade física, tratar as tensões altas, baixar o colesterol e tratar outras doenças detetadas.

Quanto à reabilitação e reintegração, são processos que requerem a colaboração do doente, da família e de uma equipa multidisciplinar de profissionais de saúde, para recuperar tanto quanto possível as funções afetadas. Começa na fase aguda e prolonga-se durante o tempo necessário, por vezes cronicamente. É essencial que a reabilitação seja ágil e continuada, sobretudo nos primeiros meses após o AVC.

Para aqueles que foram afetados pela doença, é importante deixar uma mensagem de esperança, e nada melhor que uma experiência contada na primeira pessoa, pelo que partilho o testemunho real de António Conceição, sobrevivente de AVC.

Dou-lhe a palavra:

“Tinha 41 anos quando fui atingido por um AVC isquémico, que se transformou em hemorrágico. Um quadro deveras complicado, sobretudo sequelas físicas e motoras e algumas limitações na fala. Havia muito trabalho a fazer na recuperação possível, e na reabilitação, isto é, também na reintegração pessoal, familiar, social e profissional. Menos de quatro meses depois, comecei a ser acompanhado pela professora Elsa Azevedo.

Quando eu ‘apostava todas as fichas’ na rápida reabilitação, percebi que também era muito importante tentar apurar as razões do AVC, e, claro, evitar que voltasse a acontecer de novo.

Quanto à recuperação, eu acreditava ainda que havia de ser capaz de fazer tudo na minha vida de forma igual a antes. Felizmente, não fui claramente desmentido: ainda bem, porque poderia ser complicado psicologicamente. Fui descobrindo as limitações que teimavam em persistir, mas também as formas de as ultrapassar ou, pelo menos, contornar. Porque, com o AVC, a vida não cessa; quando muito, adequa-se! — um lema.

Voltei a trabalhar, embora em funções algo diferentes das anteriores. A nível familiar, consegui que quase nada se alterasse. Em suma, retomar a vida em plenitude, ‘apenas’ integrando as limitações que ainda hoje possuo: não apesar delas, mas com elas.

Estimulado e acompanhado pela minha médica, lançámo-nos na tarefa que hoje me ocupa quase todo o tempo: a criação da Portugal AVC – União de Sobreviventes, Familiares e Amigos, que, muito resumidamente, quer ajudar os que passam por idêntica experiência, sem esquecer o contributo que também podemos dar na prevenção. Sinto-me hoje integrado na sociedade, eventualmente muito mais útil do que antes, até mesmo, provavelmente, com muito mais contacto social. Porque, como costumo dizer, a recuperação, pese todo o esforço e o recurso a múltiplos meios, pode só chegar até onde os conhecimentos científicos e terapêuticos atuais permitem; mas a reabilitação pode ser plena, quase independentemente daquela.”

O António Conceição é o exemplo de que existe vida depois de um AVC. É certo que a gravidade das complicações e o tempo de recuperação da doença variam de acordo com cada caso. Contudo, um acompanhamento médico adequado, com uma abordagem multidisciplinar, pode proporcionar uma melhor recuperação.


A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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