Orçamento penaliza quadros técnicos especializados e carreiras docentes

Atitude que o corpo docente perceciona como profundamente injusta, agrava o mal-estar nas escolas e pode dar lugar a movimentos “sindicais” inorgânicos radicalizados e extremistas, sob o anonimato incontrolável das redes sociais.

A inflação tem vindo a subir de forma galopante, cada vez que renovamos o nosso cabaz de compras sentimo-lo na “pele” e principalmente na carteira! Isto para já não falar da compra de combustível automóvel indispensável a grande parte dos professores, por esse país fora, de modo a poderem cumprir quotidianamente os seus horários letivos e outros em escolas mais ou menos distantes, não raro em lugares recônditos.

Sempre sem direito a qualquer ajuda de custo ou subsídio de renda, como, neste caso, acontece com os agentes do Ministério Público e com outros magistrados.

Lamentavelmente, a proposta de Orçamento do Estado para o próximo ano prevê a penalização de grande parte das classes médias assalariadas, que, devido ao facto de terem investido muitos recursos na sua formação inicial e contínua, desempenham funções científicas e técnicas especializadas, como é o caso de engenheiros, médicos, inspetores, enfermeiros, investigadores e professores, entre outros. Para estes quadros e técnicos superiores mais especializados, que integram carreiras do regime especial, o Governo propõe atualizações salariais de apenas 2% a 3%, quando, por ex., para os assistentes operacionais, propõe aumentos até aos 8%...

Com a agravante de que, no caso dos professores, o Governo não quer ouvir falar na recuperação dos 6 anos, 6 meses e 23 dias do tempo de serviço congelado e que ainda falta ser recuperado. Atitude que o corpo docente perceciona como profundamente injusta, agrava o mal-estar nas escolas e pode dar lugar a movimentos “sindicais” inorgânicos radicalizados e extremistas, sob o anonimato incontrolável das redes sociais, idênticos ao “movimento zero” das forças e serviços de segurança.

Em sede de IRS, segundo as melhores expectativas, apenas haverá atualizações de escalões em linha com a inflação ou, porventura, alguma baixa mas apenas nos escalões iniciais. Também aqui excluindo uma boa parte das classes médias assalariadas, as quais, no fundo, são quem mais paga impostos na nossa terra, já que grande parte das micro, pequenas e médias empresas, porque não apresentam muitos lucros no final de cada exercício, pouco ou nada acabam por entregar ao fisco.

Os vencimentos brutos das carreiras docentes (do básico, secundário, politécnico e universitário) em Portugal até nem se comparam muito mal com os vencimentos dos professores dos países da OCDE, o problema são os vencimentos líquidos, pois o fisco retém na fonte um quinhão demasiado grande. Quinhão esse que fica a fazer falta às famílias!

Refiro-me às famílias das classes médias assalariadas que, fruto de políticas públicas como a dos “vistos gold”, quando desproporcionados (atualmente a carecerem de revisitação por parte do legislador), e agora das relativas aos chamados nómadas digitais, foram sendo relegadas para territórios urbanos cada vez mais periféricos, e que, não obstante, se encontram sobrecarregadas com a subida dos juros relativos às prestações da casa e do carro. Nuns casos sem acesso a vaga em creches gratuitas por perto e noutros a terem de custear os estudos universitários dos filhos mais velhos.

Ainda se o “Leviatã” que absorve os nossos réditos nos proporcionasse um Serviço Nacional de Saúde minimamente satisfatório (por ex., dispondo de médicos dentistas, sem filas de espera desmesurada para consultas de especialidade ou para atos cirúrgicos urgentes e sem maternidades inesperadamente encerradas à tão necessária natalidade…) e com padrões de qualidade de um país europeu não teríamos necessidade de descontar para a facultativa ADSE e/ou também para seguros de saúde privados.

Não é desvalorizando salarialmente os quadros das carreiras especiais, com mais formação técnica e científica (note-se, por ex., que para o ingresso na carreira docente dos ensinos básico e secundário passou a ser exigido como habilitação de ingresso o grau de mestre, desde 2008) que se aplica o princípio da equidade ou que se evita o aproveitamento por parte de países estrangeiros da nossa geração mais qualificada de sempre, como o Governo gosta de a designar, mas que, como aqui se constata, pouco ou nada faz para que ela fique ao serviço do desenvolvimento económico e social de um país cada vez mais envelhecido.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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