Asra Panahi, 16 anos, foi morta à pancada por se recusar a cantar hino de apoio ao regime iraniano

Forças de segurança têm atacado liceus onde alunas protestam contra as autoridades do Irão. Numa escola na cidade de Arbabil deixaram várias raparigas feridas: uma morreu, outra está em coma.

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Asra Panahi, numa imagem divulgada nas redes sociais

O seu nome soma-se ao de outras adolescentes mortas nas últimas semanas, desde o início dos protestos contra o regime do Irão. Nika Shahkarami, 16 anos, saiu de casa para participar numa manifestação e a família encontrou o seu corpo dez dias depois, na morgue de um centro de detenção em Teerão. Sarina Esmailzadeh, 16 anos, foi morta num protesto na província de Albortz – espancada com bastões, segundo a Amnistia Internacional. O último nome conhecido nesta lista macabra é o de Asra Panahi, 16 anos, espancada na sala de aula, quando ela e as suas colegas se recusaram a cantar uma canção de propaganda.

“Foi um acidente”. Escaladora iraniana que competiu sem hijab foi recebida por multidão em Teerão Imagem: Reuters. Edição: Joana Gonçalves

De acordo com o Conselho de Coordenação das Associações Comerciais de Professores Iranianos, Asra morreu no hospital, um dia depois de um raide das forças do regime no liceu feminino de Shahed, em Arbabil, uma cidade no Noroeste do Irão. Os membros das “forças de segurança atacaram a escola” e “exigiram a um grupo de raparigas que cantasse um hino que elogia o supremo líder do Irão, o ayatollah Ali Khamenei”, escreve o conselho numa declaração publicada nesta segunda-feira no Telegram. Quando as meninas recusaram, foram espancadas.

O ataque à escola decorreu na quinta-feira da semana passada e deixou outras alunas feridas, incluindo uma que está em coma. Outras ainda foram detidas. O conselho de professores diz que chegou a despublicar um comunicado em que falava da morte de Asra às mãos das forças de segurança, mas explica que reafirma esse relato depois de o ter confirmado junto de professores em Arbabil. A morte da adolescente já motivou protestos durante o fim-de-semana, mas os bloqueios na Internet por parte do regime fizeram com que os pormenores demorassem a vir a público.

O tema que Asra não quis cantar, Olá, comandante, começou a ser cantado nas escolas há alguns meses e foi descrito pelo jornal pró-regime Tehran Times como “uma nova música épica sobre o apoio geracional à República Islâmica”.

Entretanto, como aconteceu nos casos de Nika e de Sarina, um homem que se apresentou como tio de Asra apareceu num programa de televisão a dizer que a jovem tinha um problema cardíaco congénito e que se teria sentido mal em casa do pai, à noite, depois do incidente da escola. O conselho de professores questiona essa versão, notando que, de acordo com fotografias e informações entretanto publicadas nas redes sociais, há três anos Asra ficou em terceiro lugar numa competição regional de natação – este organismo sublinha, em simultâneo, a pouca credibilidade desta versão quando se sabe que outras alunas, suas colegas, foram hospitalizadas no mesmo dia.

Imagens de carrinhas das forças de segurança a entrar em liceus ou a deterem raparigas têm sido publicadas nas redes sociais, a par de outras em que mulheres, mais ou menos jovens, são espancadas na rua. A 5 de Outubro, tinha o ano lectivo acabado de começar, Ali Fadavi, comandante adjunto dos Guardas da Revolução, afirmava já que “a média de idades de muitos dos detidos mais recentes é de 15 anos”.

Nika, Sarina e Asra são apenas três entre milhares de estudantes que nas últimas semanas se juntaram aos protestos que há um mês pedem a queda do regime islâmico do Irão. A contestação foi desencadeada pela morte de Mahsa Amini, uma jovem de 22 anos, detida pela “polícia da moralidade”, que a acusou de usar o obrigatório hijab de forma incorrecta. Horas depois de ser detida, Mahsa entrou em coma, acabando por morrer três dias depois.

O regime, que tem respondido a todos os protestos de forma brutal, insiste no mesmo tipo de explicações. Já no caso de Mahsa, o relatório da autópsia assegura que “a morte não foi causada por golpes na cabeça” – testemunhas da detenção viram a polícia bater-lhe de imediato, empurrando a sua cabeça contra uma carrinha.

Inicialmente, as autoridades falaram em ataque cardíaco, com a família a insistir que Mahsa era absolutamente saudável. A autópsia oficial atribuiu depois a sua morte a uma “falência múltipla de órgãos causada por hipoxia”, ou baixa concentração de oxigénio; quando desmaiou no centro de detenção, explica-se, recuperou a consciência, mas voltou a desfalecer devido a uma “condição preexistente”, seguindo-se a falta de oxigénio no cérebro.

Em relação a Nika e a Sarina, o regime afirma que ambas morreram ao cair de um prédio – a primeira teria sido assassinada por trabalhares de uma obra; a segunda ter-se-ia suicidado. A mãe de Nika, Nasreen, contou à BBC que a tia, um tio e outros familiares foram contactos pelas autoridades para criticarem os protestos e reforçarem a tese oficial: um tio foi obrigado a aparecer na televisão e a dizer que a sobrinha “morreu depois de cair de um edifício”. A Amnistia diz que os familiares de Sarina foram alvo de “assédio intenso para os obrigar ao silêncio”.

Entre os 233 manifestantes mortos nos protestos que a Human Rights Activists News Agency diz ter conseguido confirmar até ao fim-de-semana, 18 eram menores.

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