Precisamos cuidar da saúde mental das nossas crianças e jovens

Infelizmente, o orçamento público para a saúde mental continua reduzido, dificultando a sinalização dos problemas e, em consequência, de apoio efetivo. Esta segunda-feira celebra-se o Dia Mundial da Saúde Mental.

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"A nossa saúde mental é afetada pelo ambiente em que vivemos e os últimos anos têm sido particularmente difíceis" @petercalheiros

egunda-feira, 10 de outubro, celebra-se o Dia Mundial da Saúde Mental. Portugal tem investido no tratamento da doença mental e a população está mais sensível ao tema desde que a covid assolou o mundo e pôs a descoberto dificuldades com consequências graves para quem sofre. Segundo dados do Infarmed, entre janeiro e agosto de 2020, foram vendidas mais de 6,5 milhões de embalagens de antidepressivos, o que representa um aumento de cerca de 5% em relação a 2019.

A saúde mental é essencial ao bem-estar de cada um de nós, contudo, as perturbações mentais são frequentemente ignoradas ou subvalorizadas aumentando o sofrimento da pessoa e impedindo que a mesma receba tratamento adequado.

Em relação às crianças e adolescentes não é diferente, dado que nem sempre as famílias estão capazes de dar a devida atenção aos sinais e sintomas que expressam sofrimento psicológico e isso interfere com o funcionamento das crianças e dos jovens em áreas essenciais, desde a saúde até a educação.

Problemas de saúde mental como a ansiedade, a perturbação de défice de atenção com hiperatividade (TDAH), a depressão, as perturbações alimentares ou os problemas de comportamento podem comprometer a vida futura da criança e do jovem e devem ser encarados com seriedade, tanto pelas famílias como pelo Estado, mas infelizmente, o orçamento público para a saúde mental continua reduzido, dificultando a sinalização dos problemas e, em consequência, de apoio efetivo.

A saúde psicológica deve ser vista num contínuo onde há momentos em que estamos em equilíbrio, ou seja, desfrutamos da vida, temos capacidade para enfrentar contrariedades do dia-a-dia e até as situações mais difíceis, e há outros momentos em que, por razões diversas, não somos capazes de lidar com os problemas de forma adequada ou sem que nos cause prejuízo. Quando estes últimos momentos estão mais presentes e são prolongados no tempo podem consubstanciar-se numa perturbação mental que causa prejuízo para a pessoa e para a sua família.

Além dos fatores biológicos, a nossa saúde mental é afetada pelo ambiente em que vivemos e os últimos anos têm sido particularmente difíceis. Passamos por uma pandemia (que ainda não acabou) e pela guerra na Ucrânia que, apesar de para alguns parecer longe, representa uma ameaça para todos e as notícias vão dando conta de que a sua evolução não é favorável.

É urgente uma abordagem mais robusta junto da sociedade que foque na prevenção e na promoção de cuidados relacionados com a saúde mental, que contribua para a literacia da população nesta área e, ao mesmo tempo, reduza o estigma e aumente a possibilidade de concretização da ajuda.

Quanto aos pais, há várias formas de contribuir para a promoção da saúde mental dos filhos, eis alguns exemplos:

Dê atenção aos sinais e sintomas da criança e do adolescente

A saúde mental não é ausência de doença, mas estados emocionais positivos que fazem com que a pessoa se mova na vida de forma satisfatória. É importante que os pais estejam atentos à capacidade dos filhos de brincar/relacionar-se e divertir-se com os seus pares; à capacidade de aprender; aos seus sinais de tristeza, ansiedade, agitação excessiva ou irritabilidade; a queixas de dores continuadas ou mal-estar; agressividade; choro fácil; desligamento do que se passa à sua volta; dificuldades de concentração; alteração nos padrões de sono e alimentação. Caso uma ou mais destas dificuldades esteja presente de forma continuada e persistente os pais devem procurar ajuda profissional.

Encoraje os seus filhos a falarem sobre emoções e sentimentos

Falar sobre as emoções é um bom começo. É comum os adultos terem dificuldade de falar sobre o que sentem, sobretudo porque foram assim educados, mas as crianças que aprendem a linguagem das emoções desde cedo são mais bem-sucedidas emocionalmente e conseguem compreender o impacto das emoções no seu corpo, nos seus pensamentos e sentimentos e agir em conformidade.

Não tenha vergonha de falar com o seu filho sobre aquilo que sente e encoraje-o a fazer o mesmo, sem tabus

Dê um nome à emoção que está a sentir e faça o mesmo sempre que perceber que o seu filho está a sentir uma emoção. Assim irá permitir que ele associe aquela palavra a um estado interno e a tornar-se mais consciente do mesmo podendo agir em consonância. Reconhecer emoções e sentimentos poderá também ajudá-la a a ser empática e a responder de modo adequado a essa pessoa.

Há livros infantis sobre as emoções ou sobre dificuldades específicas, como por exemplo, sobre o medo ou sobre a raiva, que podem ajudar. Um exemplo é o livro As aventuras da Joana contra o Medo.

Saiba ouvir o adolescente

A tendência natural das pessoas é começar a disparar frases feitas, sermões ou conselhos que podem ser sentidos por quem ouve como uma forma de desvalorizar o seu sentimento e que não ajuda em nada. Com os jovens, muitas vezes acontece precisamente o contrário – fecham-se e isolam-se porque sentem que ninguém os compreende e que não têm o apoio pretendido.

O que o adolescente que está mal precisa é que o escutem, sem julgamentos, sem comparações com os outros e que usem perguntas que o façam refletir sobre o que pode fazer, que tipo de ajuda deve pedir e a quem.

Tente vestir a pele do seu filho e não diminua os seus sentimentos, nem seja crítico. O pior que pode fazer quando está a ouvir alguém que desabafa um mal-estar, quer seja momentâneo ou prolongado, é centrar a conversa em si e naquilo que gostaria que o jovem fizesse. Não é este o momento porque pode ser sentido como uma forma de desvalorização do que ele está a sentir, sobretudo quando acontece de forma repetida.

Ajude a criança e o adolescente a autorregular-se emocionalmente

É importante que os jovens compreendam que as emoções positivas e negativas existem e devem ser vividas e que os sentimentos negativos mudam com o tempo. Além disso, a forma como lidamos com eles influencia o nosso bem-estar. Tentar esconder ou não falar sobre as emoções negativas é um erro sendo melhor ajudar o seu filho a reconhecer e mostrar aceitação pelo sentimento que o incomoda, atribuindo-lhe um nome e sugerindo uma forma positiva de lidar com a situação. Se ele estiver muito ativado emocionalmente, não prolongue a conversa para não aumentar o descontrolo.


A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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