Relação da Alemanha com a China: a mudança tarda

Serão passos “cautelosos, mas decisivos”? Há sinais de uma estratégia diferente, mas relatos de posições diferentes do chanceler e da ministra dos Negócios Estrangeiros.

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Importância do respeito pelos direitos humanos na China apareceu no programa da coligação do Governo alemão EPA/JEROME FAVRE

Uma das lições que a Alemanha tirou da Rússia irá afectar a relação com a China? Na Alemanha “há uma analogia entre a Rússia e a China”, responde Piotr Buras, analista do European Council on Foreign Relations (ECFR), “no sentido em que a interdependência já não é uma garantia de segurança”.

Mas se no caso da Rússia a dependência da Alemanha era apenas energética, da China a dependência é muito mais difícil de resolver. Porque é do mercado, e numa economia baseada em exportações será ainda mais difícil redireccionar estas vendas do que está a ser difícil encontrar fornecimento de gás alternativo, nota Buras, numa conversa telefónica com o PÚBLICO.

O analista vê, porém, “alguns passos cautelosos” do Governo alemão, com o ministro da Economia, Robert Habeck, a negar pela primeira vez garantias do Estado a investimento estatal. “Não é ainda uma revolução, mas são passos numa direcção ligeiramente diferente.”

O analista do German Marshall Fund Noah Barkin fez, no entanto, uma apreciação diferente na sua newsletter Watching China in Europe: Berlim tem mandado mensagens contraditórias em relação a Pequim, o que está a deixar frustrados não só o lado chinês, por querer que não haja mudanças, e o lado americano, por querer que haja.

Barkin concluiu que o gabinete de Olaf Scholz é quem está a definir a política alemã em relação à China, apesar de ser a ministra dos Negócios Estrangeiros, Annalena Baerbock, que está a preparar uma nova estratégia a seguir. E Scholz, que fará uma visita a Pequim a 3 e 4 de Novembro (o Presidente francês Emmanuel Macron também irá, separadamente), não estará a querer uma mudança tão significativa como defendem os Verdes (e os liberais, foi por pressão de ambos os partidos que a importância do respeito pelos direitos humanos na China apareceu no programa da coligação do Governo).

No início de Setembro, relatos de que o Ministério da Economia, de Robert Habeck (co-líder dos Verdes) estava a preparar mais medidas para tornar menos atractivo o investimento na China, incluindo os limites das garantias mas também mais medidas, como deixar de promover feiras de comércio e cursos para gestores no país. Isto levou, segundo a agência Reuters, a protestos das organizações empresariais alemãs.

“Numa altura destas, uma saída estratégica do nosso maior parceiro comercial será mais um duro golpe na nossa economia dependente de exportações”, disse Volker Treier, especialista em comércio das Câmaras Alemãs da Indústria e Comércio.

Buras diz que, nos primeiros meses do ano, o investimento alemão na China ainda não diminuiu – na verdade, aumentou. Mas não vê nisso uma negação da mudança da atitude da Alemanha face à China. Para o analista do ECFR, a maior diferença entre os ministros dos Verdes e o chanceler é que “Scholz é mais cauteloso; percebe que há problemas, mas não partilha o sentimento de urgência” de Baerbock e Habeck.

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