António Costa: “É preciso coragem acrescida para assinar um acordo de médio prazo”

Acordo foi assinado neste domingo, em Lisboa, pelo primeiro-ministro, pelas quatro confederações patronais e pela UGT. CGTP ficou de fora. António Costa garante que o Orçmento do EStado para 2023, que amanhã é apresentado, vai reflectir “plenamente” o acordo.

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António Costa assinou, neste domingo, um acordo para a legislatura com as quatro confederações patronais e com a UGT LUSA/ANTÓNIO COTRIM

O primeiro-ministro, António Costa, considera que Acordo de Médio Prazo para a Melhoria dos Rendimentos, Salários e Competitividade para os próximos quatro anos, assinado neste domingo, é da “maior importância política”, um “marco de confiança” e o princípio de um caminho”, destacando a coragem dos parceiros sociais ao assumirem um compromisso no actual contexto de incerteza.

“O que é mais importante nestes tempos de incerteza é reforçar a confiança, e este acordo é um marco de confiança, porque dá aos portugueses e a todos os agentes económicos certeza quanto aos objectivos que temos pela frente e previsibilidade sobre o contributo que cada um tem de dar para alcançarmos estes objectivos”, afirmou.

Neste momento de incerteza, reconheceu, “é preciso uma coragem acrescida para assinar um acordo de médio prazo”.

António Costa destacou que o documento não é só de rendimentos, só de salários ou só de competitividade”. É, disse, uma proposta abrangente e com vários objectivos, nomeadamente aumentar em 2% a produtividade, alcançar 48% do peso dos salários no conjunto da riqueza nacional e melhorar a competitividade internacional.

Na intervenção com que encerrou a cerimónia, o primeiro-ministro destacou a importância do diálogo no actual contexto de incerteza. “Nenhuma maioria, por mais absoluta que seja, se basta a si própria”, sublinhou.

“Tem de respeitar as competências próprias dos órgãos de soberania, mas tem, sobretudo, de dinamizar o diálogo. Foi por isso que, em Julho, assinámos com a Associação Nacional de Municípios Portugueses o acordo que permitiu definir o processo de descentralização. Foi por isso que, em Setembro, acordámos com o principal líder da oposição na metodologia que nos permitirá de uma vez por todas tomar uma decisão definitiva sobre [o aeroporto]. E aqui estamos hoje a assinar este acordo de médio prazo com os parceiros sociais. E com este acordo enviamos uma mensagem fundamental, é que nestes momentos de incerteza, de dificuldades, de ansiedade e de angústia nada como o diálogo”, reforçou.

O primeiro-ministro remeteu o detalhe das medidas para esta segunda-feira, quando o ministro das Finanças apresentar o Orçamento do Estado para 2023, que irá reflectir “plenamente” o acordo. Ainda assim, destacou o aumento, em 2023, do limite da matéria colectável a que se aplicam as taxas especiais de IRC para Pequenas e Médias Empresas (PME).

Trata-se, na sua perspectiva, de uma medida “da maior importância” e que permite que “as PME que hoje beneficiam, em face do seu volume de negócios, de uma taxa de IRC de 17%, em caso de fusão, conservarão a taxa de 17%, ainda que o seu volume de negócios ultrapasse os limites fixados”.

António Costa lembrou que o acordo não pode ignorar os problemas imediatos e que exigem resposta no presente. A medida de maior impacto, destacou, é a transferência de três mil milhões de euros para sistema nacional de energia, com o objectivo de mitigar as subidas dos preços da electricidade e do gás.

Na área fiscal, está previsto limitar em 50% o terceiro pagamento por conta de IRC relativo a 2022 para micro, pequenas e médias empresas, abrangendo sobretudo o comércio e serviços; enquanto a agricultura vai beneficiar do reforço de 20% para 40% da majoração, em sede de IRS e IRC, dos gastos com fertilizantes e rações para animais e terá um apoio extra de dez cêntimos por litro no âmbito do gasóleo agrícola.

O Governo e os parceiros sociais assinaram neste domingo um acordo que prevê aumentos salariais médios anuais de 4,8% até ao final da legislatura e um conjunto de medidas destinadas às empresas e aos trabalhadores. A cerimónia pública decorreu no Palácio Foz, em Lisboa, e contou com a presença do primeiro-ministro, de vários membros do Governo e de representantes dos parceiros sociais.

Depois da maratona de reuniões dos últimos dias e das cedências a algumas das exigências dos patrões, o documento acabou por ter luz verde das quatro confederações patronais e da UGT, tendo a CGTP ficado de fora.

Os parceiros foram chamados por ordem alfabética para assinarem o documento, começando pela Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), seguindo-se depois a Confederação Empresarial de Portugal (CIP), a Confederação do Turismo de Portugal (CTP) e a UGT. António Costa foi o último a assinar, selando o acordo com um aperto de mão aos parceiros sociais presentes.

A Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP) assinou o acordo mas não participou na cerimónia pública, manifestando o seu “desagrado” pela forma como o processo de negociação foi conduzido.

“As negociações arrastaram-se durante meses, tendo apenas em cima da mesa propostas vagas e inegociáveis, culminando nos últimos dias numa negociação apressada, não compaginável com decisões serenas e bem fundamentadas”, justificou a confederação num comunicado.

“Um ponto de partida” e o “início de uma caminhada"

A tónica dominante das intervenções dos parceiros sociais foi no sentido de considerarem o acordo “um ponto de partida” e o “início de uma caminhada” que, na perspectiva da UGT, pode ser atribulada.

Eduardo Oliveira e Sousa, presidente da CAP, destacou a diferença entre a proposta final e as primeiras versões do acordo. “Subimos um degrau”, disse, sublinhando a abrangência das medidas que permitem chegar a todos os agricultores. “Queríamos melhor, mas para isso era preciso mais tempo”, lamentou.

O acordo permite, na perspectiva de António Saraiva, presidente da CIP, “reduzir a instabilidade, aumentar a previsibilidade e baixar parte dos riscos”. Mas é “um ponto de partida, não de chegada”, declarou o responsável que espera que, nos próximos orçamentos, seja possível conseguir medidas mais ambiciosas.

Francisco Calheiros, presidente da CTP, reconheceu que no início do processo “as esperanças da CTP eram muito baixas, por causa da incerteza e porque os últimos acordos do tempo da geringonça não deixaram boa memória”.

Afinal, “e pela primeira vez”, há uma grande diferença entre a proposta inicial e a final que “é um ponto de partida”, afirmou Francisco Calheiros, criticando a forma como as negociações foram conduzidas em contra-relógio.

As intervenções dos parceiros terminaram com Mário Mourão, secretário-geral da UGT, que olha para o acordo como o “início de uma caminhada que pode ser acidentada”.

O documento, frisou, traz “inegáveis vantagens” para os trabalhadores: “Dadas as dificuldades que os trabalhadores enfrentam, este acordo pode ser entendido como uma baliza que não permita a continuada perda de poder de compra”.

A intervenção de Mário Mourão acabou com um inesperado elogio à ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, pelo empenho que demonstrou em todo o processo. Ainda assim, confessou, “às vezes pôs-me a cabeça em água”.

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