Cartas ao director

A mão no coração

“Para cumprimentar uma mulher, coloca a tua mão direita sobre o coração.” Esta é uma das regras para quem se deslocar ao Qatar para assistir ao Mundial de futebol. Não deixa de ser poética esta forma cavalheiresca de cumprimento. No entanto, somada a outras recomendações, o cartão vermelho é apontado aos adeptos. “Em público, não se deve olhar as pessoas nos olhos, nem ter demonstrações de afecto.” Conhecidas as condições de laboração dos trabalhadores da construção civil que construíram os estádios para a festa maior do futebol, os adeptos deviam, ao entrar, colocar a mão no peito em homenagem aos 6750 trabalhadores migrantes que morreram em acidentes de trabalho para que milhões de pessoas rejubilem com os esperados golos.

Ademar Costa, Póvoa de Varzim

PS a privatizar a TAP

É sabido que o jogo de palavras é um dom de um bom político. Ao querer integrar a TAP num grupo europeu, ou seja, a Lufthansa (não tenhamos ilusões), a sua privatização é óbvia. Vejamos: comparar a TAP e a posição negocial de Portugal com as grandes economias sólidas europeias e os gigantes da aviação não é sério. British Airways e Iberia são dois gigantes que se respeitam. KLM e Air France também. A Lufthansa, apesar de ter grande peso, tem relações históricas e mais fiéis com a Suíça e Áustria (Airlines). Alguém no seu perfeito juízo pensa que, estando inseridos num grupo de gigantes como estes, a TAP não vai ser rapidamente absorvida? Acham mesmo que o grupo vai encaixar capital na TAP sem ter um bom retorno? Ainda por cima com as nossas rotas de ouro para o Brasil, que tem cerca de 20 metrópoles com mais de um milhão de habitantes? Lamento, mas sim! A partir do momento que inserirmos a TAP num grupo, dali a dois anos o grupo compra rapidamente o resto das acções ao nosso Estado. É lamentável que esta ideia venha de um governo socialista, que sempre quis uma TAP pública. Lamentável, ainda mais, é o processo como isto tudo ocorre e não tanto a discussão política e estratégica que, essa sim, é saudável!

Cláudio Borges, Lisboa

Marketing (lembrando Fernando Namora)

No dia 4 de Outubro saí à rua e, como nos anos anteriores por esta altura, vi começarem a levantar-se as decorações de Natal. Se antes isso era ridículo em termos de poluição e desperdício energético, nos dias de hoje é absurdo, com os problemas mundiais, que todos conhecemos, e que provavelmente nos farão retroceder para tempos de má memória, de grande inflação e dificuldades económicas. Há problemas com o preço da energia, mas que importa, pois julgam que os ganhos com este tipo de propaganda compensam? Não aceitemos.

Alberto Valente, Matosinhos

Migalhas também é pão

Acabo de ler a crónica de Carmo Afonso. Não posso concordar mais com ela. O senhor José Miguel Almeida (administrador da CMVM), talvez mais avisado e letrado no jogo dos produtos jogados no mercado de capitais, acha que a minha tia lá na aldeia sabe o que ele sabe e por isso estranha.

Ela foi “batizada” nesse jogo (já noutro tempo era assim) com as ações da Torralta. Por isso não comprou mais acções, nem do BES, nem do Millennium, nem da Portugal Telecom. “Migalhas também é pão”, diz ela, e passou a pôr o seu dinheirito nos Certificados de Aforro. Ficou vacinada.

José Rebelo, Caparica

Nem Cerejeira foi tão longe

O líder da Igreja Ortodoxa russa, Cirilo, amigo de Putin e apoiante da invasão da Ucrânia pelas tropas russas, numa ânsia de ajudar o seu amigo no recrutamento de 300 mil cidadãos reservistas, afirmou que os soldados russos que morrerem na guerra da Ucrânia vão ser perdoados de todos os seus pecados, que é como quem diz: aceitem o recrutamento porque, se morrerem em combate, irão para o céu.

Este caso de um líder da Igreja amigo de um ditador trouxe-me à memória o caso de um líder da Igreja em Portugal também amigo de um ditador. O cardeal Cerejeira era “unha com carne” de Salazar. A amizade e o mesmo pensamento político fizeram com que o cardeal, através das igrejas espalhadas pelo país, ajudasse a governação do seu amigo Salazar, mas não foi tão longe como o primaz Cirilo: nunca ouvi o cardeal Cerejeira prometer o céu aos soldados que morressem nas guerras das colónias.

Acácio Alferes, Évora

Sugerir correcção
Comentar