Ainda sobre as creches

Esta é uma etapa muito delicada e importante do desenvolvimento das crianças e que não deve incentivar o florescimento das creches, mas antes dar a possibilidade de opção pela situação que for mais adequada a cada família e por consequência também a cada criança.

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"A equidade não passa por termos medidas iguais para todos, mas antes por cada um ter aquilo que precisa" Anna Costa/Arquivo

A gratuidade das creches para as crianças de um ano teve início já este ano, no sector público. Esta não é a única alternativa que os pais deviam dispor de apoio social à educação dos seus filhos. Existem outras, com toda a certeza.

Há coisas que não mudam e uma delas é o cuidado que as crianças pequenas necessitam antes de evidenciarem a necessidade de socializar com outras crianças. Para alguns pais, aqueles que financeiramente conseguem ter escolha e opção, a questão entre pôr os filhos na creche, ficar um dos progenitores em casa ou encontrar uma pessoa que se ocupe da criança durante todo o dia, sempre esteve em cima da mesa.

Por esta exposição de opções já se vê que a creche gratuita não é a única possibilidade que o Estado pode apoiar. A questão vai além de se os pais têm dinheiro para garantir qualquer que seja a opção. A escolha devia recair sobre aquilo que seria o melhor em cada caso. Os trabalhos dos pais, as suas condições económicas e psicológicas, o apoio familiar que tem e as outras pessoas a quem podem recorrer.

À partida, para além dos pais, as pessoas mais preparadas para colaborar com estes estão em instituições que têm a valência de creches. São profissionais da educação, que estudaram para esse efeito, que fazem formação periodicamente, onde existe vigilância a vários níveis, em espaços com vistorias e inspecções em conformidade. Isto quando pensamos que os pais são aqueles que melhor sabem cuidar dos seus filhos, o que por vezes, embora raras e ainda bem, assim não acontece.

Se pensarmos na primazia do cuidado dos pais, então deviam ser-lhes dadas condições e apoios para cuidarem dos seus filhos até mais tarde. Também há famílias que optam por deixar os seus filhos ao cuidado de pessoas que conhecem ou não, mas que contratam propositadamente para esse efeito. Então nesta opção há histórias para todos os gostos, desde as que têm um final feliz, àquelas que escaparam por um fio a um final muito pouco risonho.

Esta é uma etapa muito delicada e importante do desenvolvimento das crianças e que não deve incentivar o florescimento das creches, mas antes dar a possibilidade de opção pela situação que for mais adequada a cada família e por consequência também a cada criança.

Com a gratuidade das creches também podemos levantar outras questões do ponto de vista do trabalho: como é encarado pelos clientes/pais, um trabalho tão importante, que passa a não ter qualquer peso financeiro no seu orçamento?

Que valorização e respeito são dados pelos pais a um trabalho que passou a ser a custo zero?

Como encaram os pais que pagavam de acordo com os seus rendimentos a creche dos filhos e que de um momento para o outro esta passou a ser de graça?

Será que o factor custo, tinha aqui alguma importância para quem precisa do serviço e para quem o disponibiliza?

E para quem atribui um valor a este trabalho e não um custo? Para quem o interpreta como um verdadeiro trabalho de parceria com a família?

E na cabeça de quem presta o serviço, o facto da entidade pagadora passar a ser outra, mudou quem é o cliente? E como continua a ser a relação com quem usufrui do serviço, o verdadeiro cliente?

Sempre ouvi dizer que não devemos fazer de graça um trabalho que deve ser remunerado. Não está a ser realizado de graça, estamos todos a pagar por ele. Tal como todo o outro ensino público, iremos percorrer o caminho da qualidade versus custo, valor e reconhecimento dos profissionais.

A verdadeira inclusão da diversidade e equidade passa por apoiar diversas alternativas e não apenas só uma. A creche pode não ser a melhor opção para muitas crianças e será certamente o que melhor pode acontecer para muitas outras.

O fortalecimento do Estado Social não passa apenas por este tipo de acções, mas pela concertação de diversas alternativas, com opção por aquela que, com a ajuda de técnicos especializados, será a melhor para cada situação. E quem pode pagar deveria poder continuar a pagar.

A equidade não passa por termos medidas iguais para todos, mas antes por cada um ter aquilo que precisa. E se para pagar, temos de ir ao ensino privado, então claramente estamos a reconhecer o ensino privado como serviço público de educação. Quantos pais não ficaram um pouco espantados por, de um dia para o outro, terem deixado de pagar a creche dos filhos? É sempre bom ter serviços gratuitos, mas cuidado com as consequências e repercussões que isso traz ou pode trazer.

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