Ambientalistas alertam para atraso no sistema de depósito de embalagens

Portugal agilizou leis para o plástico, mas agora tem de tirar do papel o sistema de depósito e retorno de embalagens de uso único. Esta ferramenta evita que o resíduo seja queimado ou enterrado apelando ao bolso: só recebe o dinheiro de volta quem devolve o recipiente vazio.

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O sistema de depósito incentiva os consumidores a levar as embalagens vazias até aos pontos de recolha Zuzanna Szczepanska/DR

Portugal apresenta-se como um bom “aluno” no que toca à regulação dos plásticos de uso único, de acordo com um relatório divulgado recentemente pela Rethink Plastic Alliance. Contudo, a associação ambientalista Zero sublinha que este resultado positivo se deve unicamente ao modo como Portugal transpôs a directiva comunitária sobre embalagens de utilização única. Agora, avisam, falta o mais difícil: tirar as medidas do papel.

“O nosso país está na frente e até propôs até medidas bastante ambiciosas, mas pode rapidamente ficar para trás e ganhar uma avaliação negativa se as coisas não avançarem. Estamos em 2022 e, neste momento, ainda nem sabemos qual será o desenho do sistema de depósito para recuperar embalagens de plástico”, afirma ao PÚBLICO Susana Fonseca, ambientalista da Zero.

O sistema de depósito é um mecanismo que vai incentivar os consumidores a levar as embalagens vazias até aos futuros pontos de recolha. A ideia é que o consumidor pague no acto da compra não só o valor do produto mas também um depósito (a Zero sugere que seja 10 cêntimos). Uma vez vazia, a embalagem pode ser levada até aos centros de recolha e, no acto da devolução, o valor do depósito seria restituído. Assim, a motivação financeira entra na equação da valorização do plástico, fazendo com que a taxa de recuperação das embalagens plásticas colocadas no mercado possa ascender até aos 90 %, segundo a Zero.

“O ambiente em Portugal é de absoluta estagnação. Ninguém está disposto a aprender com os erros. O sistema de depósito não é um tema novo, não consigo compreender como é que podemos continuar a permitir que cerca de quatro milhões de embalagens continuem a ser enterradas ou queimadas todos os dias em Portugal”, argumenta a dirigente da Zero.

A legislação nacional previa, desde 2018, a colocação em prática desse sistema de depósito para embalagens de uso único de bebidas de plástico, vidro e metal para Janeiro de 2022. A Zero sublinha que, até agora, pouco se sabe sobre como e quando sistema vai ser implantado. E, tendo em conta que são necessários “12 a 18 meses” para pôr o método em marcha, muito dificilmente haverá retorno de plásticos de uso único antes de 2024, prevê Susana Fonseca.

“Sem um sistema de depósito com retorno será impossível a Portugal cumprir com a obrigação de recolha de 77% em peso das embalagens de bebidas em plástico até final de 2025 e de 90%, em peso, até final de 2029”, lê-se no comunicado divulgado este domingo pela Zero em articulação com a Sciaena, uma organização também dedicada à conservação ambiental.

As duas associações concordam que Portugal têm mostrado ambição no que toca à redução de copos de bebidas e embalagens de plástico para take away (redução de 80% até final de 2026 e de 90% até 2030, tendo por referência os valores de 2022). No capítulo da comida comprada para comer em casa, também passou a ser obrigatória a disponibilização de soluções reutilizáveis a partir de Janeiro de 2024. Contudo, tanto a Zero como a Sciaena afirmam que não basta ambição no papel, é urgente que as coisas avancem no terreno.

“A directiva apelava a que os Estados-Membros propusessem objectivos de redução significativos, mas não definia metas específicas, deixando-as à decisão dos Estados. Contudo, dado que os objectivos de redução apenas se aplicam aos copos e recipientes para alimentos para take away em plástico, esta redução, aparentemente ambiciosa não irá implicar necessariamente uma redução no número total de copos e recipientes para alimentos usados no país, mas antes uma transição para outros materiais, não necessariamente melhores do ponto de vista do ambiente e mesmo da saúde humana”, refere o documento.

A directiva 2019/904 - aquela que se debruça sobre os plásticos de uso único - foi aprovada no 3 de Julho de 2019 pelo Parlamento Europeu e o Conselho. No diploma, estava previsto o prazo para transposição por todos os Estados-Membros até 3 de Julho de 2021. Portugal cumpriu o estabelecido mas com pequenas falhas pelo caminho. O decreto-lei 78/2021 de Setembro de 2021 chegou com quatro meses de atraso e transpõe apenas parcialmente a directiva em causa, uma vez ficou de fora a parte da responsabilidade alargada do produtor.

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