Os traumas do FC Porto não ficaram na Champions

O Estoril poderia ter estado a ganhar por 2-0? Sim. O FC Porto poderia ter feito o 1-1 e o 1-2? Também. Estas premissas permitem explicar que o jogo poderia ter tido diferentes desfechos e, no fim de contas, o empate parece ajustar-se ao que se passou.

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Estoril e FC Porto em duelo neste sábado EPA/JOSE SENA GOULAO

O FC Porto foi ao Estoril em pleno momento de trauma – o desportivo, com a goleada sofrida na Liga dos Campeões, e o mental, com a má forma global da equipa e o ataque à família de Sérgio Conceição. Como prevê a saúde em casos de traumas fortes, pode existir, depois, o stress pós-traumático e o FC Porto está a vivê-lo, levando do Estoril apenas um empate (1-1). Com este resultado, o FC Porto pode terminar a jornada a cinco pontos do líder Benfica.

Após a derrota com o Brugge, Conceição tinha dito “mesmo na pré-época, sem ter qualquer objectivo, não nos mostrámos desta forma como nos mostrámos hoje (…) eu sei o que é que faltou (…) era um jogo de Champions. Um jogo em que essas características, associadas à maturidade, têm de estar presentes”.

O técnico parecia referir-se a falta de intensidade, mas nem foi por aí que o FC Porto não venceu neste sábado. Mais energia do que na Champions pareceu existir, o que não houve foi especial engenho.

O Estoril poderia ter estado a ganhar por 2-0? Sim. Alguém estranharia? Não. O FC Porto poderia ter feito o 1-1 e o 1-2? Sim. Alguém estranharia? Não. Estas quatro premissas permitem explicar que este jogo esteve longe de ser de sentido único, com momentos diferentes de prevalência de uma e outra equipa no momento de atirar à baliza. No fim de contas, o empate parece ser o mais justo pelo que se produziu em campo. O Estoril até pode ficar a lamentar só tirar um ponto deste jogo, mas é ao FC Porto a quem mais dói este desfecho.

Losango difícil

O Estoril surgiu nesta partida num 4x3x3 que compreendia dois médios ofensivos: Geraldes e João Carvalho. No papel, as características dos jogadores pareciam comportar alguns riscos de solidez e intensidade sem bola, mas o Estoril tentou compensar esse detalhe com um posicionamento menos audaz de Ndiaye, o médio mais defensivo, que se comportou frequentemente como terceiro central.

Do outro lado o FC Porto mantinha a aposta no 4x4x2 losango, com Pepê a jogar a 10. O desenho portista permitiria explorar o espaço existente entre Ndiaye e a linha média do Estoril, mas Pepê e Taremi andaram frequentemente longe dessa zona – e parecia ser a zona-chave para ferir o Estoril.

A equipa da casa acabou por usar o losango do FC Porto a seu favor, já que este é um sistema que, defensivamente, precisa de médios muito específicos: se os interiores são atraídos ao corredor, há espaço no meio só com Uribe na cobertura, se os interiores são atraídos à zona central, há espaço no corredor.

E o Estoril apostou sempre nesta alternância que deixou André Franco e Eustáquio algo perdidos: ora atraía ao meio com Geraldes e Carvalho para depois activar Rodrigo Martins ou Tiago Gouveia, ou servia um dos alas para depois sair em condução por um dos médios-centro – e ambos foram importantes na “limpeza” que deram a várias saídas.

Incapaz de jogar entre linhas perto da área adversária, o FC Porto só criou lances de perigo nas raras solicitações em profundidade para Taremi - e quando se fala de lances de perigo é algo relativo, já que o primeiro remate portista surgiu apenas aos… 35 minutos.

O Estoril conseguia transições com algum perigo, sobretudo aos 21’ com Martins, aos 31’ com Gouveia e a melhor de todas aos 29’, quando Ndiaye recuperou a bola em zona adiantada – foi atrás de Pepê – e a jogada acabou com defesa de Diogo Costa ao remate de Erison e remate ao poste de Gouveia na recarga.

Além de fazer tudo em esforço e pela via individual (Pepê tinha mais bola, mas quase sempre longe da baliza), o FC Porto estava a errar também no prisma técnico e em zonas defensivas.

Foi o tal lance dos 29’ e foi, depois, aos 41’, quando um passe errado de David Carmo para a zona central deixou o FC Porto descompensado e à mercê de um passe longo que encontrou Tiago Gouveia.

Zaidu, defensivamente incapaz neste lance, rodou 360 graus e esse desnorte deu espaço a Gouveia para receber orientado para o remate vitorioso.

É certo que o FC Porto teve golos anulados aos 34’ e 35’, ambos por fora-de-jogo, mas o resultado, embora fosse demasiado castigador da inércia ofensiva e dos erros defensivos do FC Porto, não era desprovido de total lógica – afinal, foram do Estoril as melhores oportunidades de golo da primeira parte.

Mais FC Porto

O FC Porto regressou do intervalo com os mesmos 11 jogadores e a equipa veio com mais energia. O Estoril já tinha sido uma equipa que errava bastante na construção (sempre curta), mas faltava ao FC Porto predisposição para ter mais jogadores aptos a aproveitarem esse detalhe.

A pressão na segunda parte não passou a ser mais subida – porque já tinha sido bastante audaz na primeira parte –, mas era mais intensa, sobretudo na forma como Eustáquio tentou dar o que Pepê nem sempre conseguiu.

O posicionamento mais defensivo do Estoril também a isso ajudou, é certo, mas a equipa portista esteve claramente mais capaz de criar perigo, mesmo que sem especial engenho técnico.

Houve um remate à trave de Taremi aos 50’, num lance confuso na área, uma oportunidade desperdiçada pelo iraniano aos 63’, um cabeceamento ao lado de Evanilson dois minutos depois e um remate de Galeno aos 68’.

O Estoril esteve perto do 2-0 aos 55’, numa transição, mas o resultado mais lógico seria, por esta altura, o empate – numa hora de futebol, nenhuma das equipas tinha sido claramente melhor do que a outra.

Aos 76’, Ndiaye viu o segundo cartão amarelo após uma falta dura e da infracção nasceu nova bola ao poste da baliza de Figueira, desta vez de Verón.

Para o que se passava em campo, a inferioridade numérica pouco mudou no jogo: o Estoril não ficou mais defensivo do que já estava, apenas começou a sair menos para o ataque.

Já o FC Porto, com muitos jogadores em zona de finalização, continuou a somar lances de perigo, até ao lance supremo: um penálti assinalado com indicação do VAR permitiu a Taremi empatar aos 90+8’.

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