Militares vão fazer contagem paralela dos votos nas eleições brasileiras

Medida inédita surge no contexto das críticas lançadas por Bolsonaro ao sistema de voto electrónico, que os seus opositores vêem como o fundamento para rejeitar uma eventual derrota.

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Bolsonaro tem criticado o sistema de voto electrónico em vigor no Brasil Andre Coelho / EPA

As Forças Armadas brasileiras vão levar a cabo um processo de contagem dos votos nas eleições do próximo dia 2 de Outubro em paralelo com a contabilização tradicional desempenhada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A medida é inédita e é vista como uma resposta à pressão feita pelo Presidente Jair Bolsonaro, que tem propagado dúvidas quanto à infalibilidade do sistema de voto electrónico.

A iniciativa dos militares surge depois de negociações feitas em Agosto entre as Forças Armadas e os juízes do TSE, diz a Folha de S.Paulo. Na prática, no dia das eleições – os brasileiros elegem o Presidente, membros do Congresso federal, governadores estaduais e deputados estaduais em simultâneo –, técnicos militares vão fotografar os códigos QR de 385 boletins de urnas espalhados pelo país e enviar as informações para as chefias das Forças Armadas que vão liderar o processo.

No final, diz o mesmo jornal, as contabilizações dos órgãos eleitorais e dos militares vão ser comparadas. Trata-se de uma iniciativa inédita desde que o sistema de voto electrónico foi introduzido no Brasil, em 1996.

O TSE rejeitou, através de um comunicado, a ideia de que venha a existir um “acesso diferenciado em tempo real aos dados”, esclarecendo que as informações em causa presentes nos boletins das urnas são de “acesso amplo e irrestrito de todas as entidades fiscalizadoras e do público em geral”.

Bolsonaro, que procura ser reeleito para um segundo mandato, tem sido um crítico do sistema de voto electrónico, apesar de ter sido eleito sucessivamente como deputado federal e há quatro anos como Presidente com este modelo em vigor. Entre os seus apoiantes subsistem dúvidas quanto à possibilidade de os resultados eleitorais poderem vir a ser falseados, embora nunca tenham sido apresentadas quaisquer provas de que as urnas electrónicas sejam mais vulneráveis a fraudes do que a modalidade do voto impresso.

O próprio Bolsonaro chegou a declarar ter vencido as eleições de 2018 logo à primeira volta – acabaria por vencer o candidato do Partido dos Trabalhadores, Fernando Haddad, na segunda volta –, mas nunca apresentou qualquer prova que comprovasse essa alegação.

Desta vez, as sondagens têm evidenciado as enormes dificuldades que o Presidente enfrenta para contrariar o favoritismo do ex-Presidente Lula da Silva. Desde o final do ano passado que Lula mantém uma liderança firme, embora as possibilidades de uma vitória à primeira volta pareçam cada vez mais reduzidas. Esta segunda-feira, o candidato do PT deu mais um passo importante rumo ao seu regresso ao Palácio do Planalto com a declaração de apoio da ex-ministra e ex-candidata presidencial Marina Silva.

Perante a iminência de uma derrota, há quem receie que as dúvidas semeadas por Bolsonaro e pelos seus apoiantes quanto à robustez do voto electrónico possam servir para fundamentar uma hipotética rejeição dos resultados, criando uma situação que atiraria o Brasil para uma crise institucional imprevisível. Bolsonaro tem dito repetidamente que não irá aceitar um resultado que não considere fruto de um processo “transparente”.

Uma solução de compromisso encontrada pela justiça eleitoral foi a inclusão das Forças Armadas no acompanhamento da contagem dos votos, mas a hipótese de haver dois processos de contabilização em simultâneo pode levantar problemas de confiança se os resultados finais vierem a ser diferentes. “Quem vai fiscalizar o fiscal? Essa é a questão. Quem é o chefe do fiscal? É o Bolsonaro, e por isso, vejo com bastante preocupação”, disse o jurista Wálter Maierovitch, citado pelo UOL.

Notícia actualizada às 19h36: Acrescentou-se o esclarecimento oficial do TSE no quarto parágrafo.

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