União Europeia bate recorde na produção de electricidade a partir do sol

Portugal foi um dos 18 países europeus que quebrou recordes de geração de electricidade a partir de fonte solar este Verão. Crescimento da produção evitou importações de gás num valor estimado de 29 mil milhões de euros, revela relatório do think tank Ember.

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Alcoutim abriga uma das centrais fotovoltaicas portuguesas que contribuíram para o resultado recorde deste Verão Nuno Ferreira Santos

Neste Verão, a União Europeia foi capaz de gerar 12% de toda a sua electricidade a partir de fontes solares. Esta produção recorde contribuiu para que evitássemos importações de gás num valor estimado de 29 mil milhões de euros, revela um relatório do think tank Ember. Num momento em que Bruxelas se desdobra para gerir a crise do gás, a notícia não poderia ser mais bem-vinda.

“Cada Terawatt-hora (TWh) de electricidade solar ajudou a reduzir nosso consumo de gás, economizando milhares de milhões de euros para os cidadãos europeus. A prioridade agora deve ser acelerar a implantação da energia solar para ajudar a proteger a Europa de futuros choques nos preços dos combustíveis fósseis”, afirma ao PÚBLICO Paweł Czyżak, que elaborou o estudo em parceria com Sarah Brown.

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Portugal foi um dos 18 países que quebrou recordes de produção, tendo subido mais de três pontos percentuais numa curva ascendente de geração de electricidade a partir de fonte solar (ver gráfico). “Poderíamos dizer que Portugal está entre os melhores, com a quota solar a crescer 3,3 pontos percentuais face ao ano passado – de 6% para 9,3%, graças aos 1,5 Gigawatts (GW) de capacidade adicionada em 2021”, diz o analista sénior da Ember.

O crescimento português corresponde, na avaliação de Paweł Czyżak, a uma bela curva exponencial. “Isto significa que Portugal está no caminho certo para melhorar, muito rapidamente, a quota de energia solar. É uma boa notícia para atingir os novos 80% de quota de energia limpa em 2026”, acredita.

O estudo analisa os dados mensais de geração de electricidade entre Maio e Agosto de 2022, ou seja, durante os meses considerados mais produtivos no que toca à energia solar. Este documento da Ember, divulgado esta quinta-feira, revela que a União Europeia produziu 99,4 TWh​ de electricidade a partir de energia solar neste Verão. Este resultado está bem acima dos 77,7 TWh obtidos em igual período de 2021.

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O caso da Polónia e dos Países Baixos

A lista de 18 países recordistas é liderada pela Países Baixos (22,7%), Alemanha (19,3%), Espanha (16,7%), Grécia (15,3%) e Itália (15%). A maior subida na geração solar desde 2018 coube à Polónia – um país que, apesar de ser muito dependente do carvão, aumentou 26 vezes a geração solar. A pujança de Varsóvia, no entanto, pode ser apenas sol de pouca dura: enquanto países da União Europeia como a Alemanha ou a Países Baixos estão a fazer uma aposta forte nas fontes renováveis, o governo polaco parece estar a pôr o pé no travão, avalia Paweł Czyżak.

“A Polónia é um caso extremamente interessante, por causa do boom sem precedentes de energia fotovoltaica residencial como resposta aos preços altos da electricidade gerada a carvão. Por outro lado, o governo agora está a fazer tudo o que pode para desacelerar as energias renováveis ​​[através de novas regras]. Infelizmente, devido a políticas desfavoráveis, é provável que a Polónia perca o papel de líder solar nos próximos anos”, afirma Paweł Czyżak ao PÚBLICO.

Além do caso polaco, o dos Países Baixos também surpreendeu os autores do relatório. Embora este país já estivesse a encabeçar a lista em 2021, Paweł Czyżak considera interessante que seja um território menos privilegiado em termos de exposição solar a dar as cartas na geração de electricidade.

“Qualquer um pensaria que as condições climáticas nos Países Baixos não são favoráveis à energia solar, mas claramente não é o caso. Por isso, constitui um óptimo estudo de caso para os países do Norte da Europa que hesitaram em expandir a energia solar”, comenta.

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Instalações do gasoduto Nord Stream 2 em Lubmin, em território alemão HANNIBAL HANSCHKE/REUTERS

Bálsamo em tempos de crise

Este recorde europeu de produção solar ocorre em simultâneo com a subida vertiginosa dos preços do gás de origem fóssil. O contrato para Agosto do principal mercado europeu do gás, o TTF (Title Transfer Facility), foi negociado a um máximo histórico de 313 euros por Megawatt-hora (MWh) no dia 29. E, de Maio a Agosto, o período analisado pela Ember, apresentou um valor médio de 148 euros por MWh. O custo médio em igual período de 2021 era de 38 euros por MWh.

Será que este admirável crescimento europeu em matéria de energia solar teria sido possível sem uma crise energética? Paweł Czyżak acha que sim. “Talvez seja surpreendente, mas o cenário geopolítico teve um impacto limitado no crescimento solar. É de facto o contrário: foi a energia solar que ajudou a mitigar a crise causada pela invasão da Rússia, a escassez de gás, as questões nucleares e a baixa [produção] hidreléctrica devido a secas”, diz o analista da Ember. “Sem energia solar, provavelmente estaríamos a enfrentar apagões”, conclui.

A análise da Ember conclui ainda que o crescimento da energia solar está a acelerar. O aumento homólogo de 22 TWh durante o Verão de 2022 é muito maior do que em 2021 (+8 TWh), 2020 (+10 TWh) e 2019 (+2 TWh). “A grande escala da expansão da energia solar na Europa foi o que mais me fez arregalar os olhos, assim como o facto de que o crescimento está em franca aceleração: vemos cada vez mais geração solar a cada ano”, entusiasma-se Paweł Czyżak

Embora o ritmo de crescimento esteja a acelerar, ainda pode não ser suficiente para alcançar as metas europeias até 2030. Para que a capacidade instalada e a geração solar correspondam à ambição de Bruxelas, a taxa de implantação deve continuar a aumentar.

“O crescimento que estamos a ver e as previsões de curto prazo para a energia solar são extremamente promissoras. Dão muita esperança de que possamos de facto alcançar as metas que a Europa almeja em programas como REPowerEU. Nessa nota, a indústria (Solar Power Europe) está certa de que podemos até ultrapassar o número de 600 GW de capacidade instalada solar em 2030, o que é novamente muito promissor, sobretudo se combinarmos com um forte crescimento eólico. Mas precisamos mesmo de um ritmo mais acelerado para chegarmos a um sistema de energia limpo da UE no início dos anos 2030”, prevê o analista da Ember.

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