Empenhemo-nos em reerguer o Serviço Nacional de Saúde

“O SNS é quem está a ser capaz de proteger a nossa comunidade. À entrada dos hospitais não há nenhum segurança a perguntar a quem chega se tem seguro, se é de esquerda ou de direita, se é ateu ou muçulmano, se é cigano ou sírio, de sangue azul ou popular. Entra e é tratado. Esta é a irmandade que o SNS assegura, seja aos que o apoiaram, aos que votaram contra, ou até aos que se esgadanham para o liquidar. Trata-se de um passo gigantesco no nosso caminho civilizacional, o de tratar com dignidade e de acordo com os avanços das ciências médicas.”

Estas frases têm direitos de autor [Domingos Lopes], pedindo desde já desculpa pela utilização abusiva. Estou certo de que é subscrita por muitos, à esquerda e à direita, que reconhecem o papel fundamental do SNS na coesão social e na sustentação da democracia. Há, pois, que encontrar soluções para, dentro do quadro constitucional, resolver os impasses que vêm surgindo como sucede com a “crise das urgências”. Quer isto dizer que as propostas à esquerda e à direita são as mesmas?

Seguramente não são. Porém, há que reconhecer que houve impasses que foram bem resolvidos por governos de direita, como é o caso da reforma materno-infantil empreendida por Albino Aroso com Leonor Beleza como ministra da Saúde. Medidas que devem merecer especial atenção da parte do Ministério da Saúde na resolução do problema das urgências de Obstetrícia e do preocupante aumento da mortalidade infantil.

Mas como pode um Serviço Público de Saúde responder a tão desafiante tarefa sem um grupo de profissionais em dedicação exclusiva ou, no novo léxico, em dedicação plena? Já foi tempo em que o regime normal de trabalho no SNS era em dedicação exclusiva, a não ser que o médico o não desejasse. Em que havia uma carta hospitalar, estando os hospitais interligados por níveis de competência segundo o princípio da complementaridade. Em que as carreiras profissionais eram estruturantes em termos organizacionais.

Hoje o SNS volta a estar ameaçado, necessitando de ser resgatado. Citando Julian Pereleman, professor da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa: sem a dedicação plena o SNS afunda-se. Mas a dedicação plena não resolve nada num SNS sem autonomia nem planeamento, num SNS que não procura adaptar-se às novas formas de funcionar dos profissionais, e num SNS que nada entende das forças poderosas que o rodeiam.

O SNS necessita de uma visão holística. De aprofundar o relacionamento entre utilizador (utente/doente) e prestador (profissionais de saúde). Eventualmente de novas interfaces entre níveis de cuidados.

Acabados de “sair” de uma pandemia, só nos faltava que o SNS não cumprisse a razão da sua existência.

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