Elevada rotatividade de docentes afecta mais as escolas carenciadas

Estudo da Nova School of Business and Economics considera situação preocupante.

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Daniel Rocha

A rotatividade de professores “é elevada” e “preocupante” em Portugal, diz um estudo que revela ser nas escolas mais desfavorecidas que os docentes menos querem estar.

“A média da rotatividade é elevada”, diz Pedro Freitas, um dos investigadores da equipa do Centro de Economia da Educação da Nova School of Business and Economics (Nova SBE), que analisou a situação dos educadores de infância e professores desde o 1.º ao 12.º ano ao longo de uma década.

Entre 2008/09 e 2017/18, a média da rotatividade de todos os agrupamentos variou entre os 17% e 36%, revela o estudo, intitulado “Rotatividade dos Docentes nas Escolas Públicas Portuguesas”. Em Setembro de 2009, por exemplo, um em cada dez agrupamentos começou o ano lectivo com mais de metade dos professores a entrarem na escola pela primeira vez.

Já em 2017/2018, “mais de 90% das escolas teve uma rotatividade superior a 20%, ou seja, mais de um em cada cinco professores mudou de um ano para o outro”, assinala Pedro Freitas. A grande maioria destes novos docentes é contratada, mas também há muitos professores dos quadros que aproveitam os concursos internos de contratação, que se realizam de quatro em quatro anos, para mudar de escola.

Nos estabelecimentos de ensino de meios socioeconómicos mais desfavorecidos há mais professores a quererem mudar de escola, concluiu o estudo. Os investigadores perceberam que a rotatividade é mais elevada nas escolas onde há mais beneficiários da Acção Social Escolar, onde os alunos têm notas mais baixas e os pais menor escolaridade. Nestes estabelecimentos de ensino é mais difícil atrair e manter os docentes.

Nas escolas com mais alunos carenciados e com direito a Acção Social Escolar a rotatividade de professores é de 35%. Já nas escolas com alunos menos carenciados a percentagem desce para 27%. Esta diferença também se nota quando se compara a escolaridade dos pais dos alunos: nas escolas onde as mães têm pelo menos o ensino obrigatório a rotatividade é de 27%, enquanto nos agrupamentos com pais com menor escolaridade a percentagem sobe para 37%.

Também há mais docentes a tentar sair das escolas onde os alunos têm piores notas, segundo uma outra comparação entre os agrupamentos com os melhores e piores resultados nos exames nacionais do 4.º ao 12.º ano.

Nos agrupamentos com melhores notas, a média da rotatividade é cerca de três pontos percentuais abaixo da rotatividade dos agrupamentos com piores resultados: entre os estudantes do 4.º ano, por exemplo, a rotatividade foi de 23% nas escolas com melhores notas e 27% nas escolas com piores médias.

Os investigadores alertam para os “preocupantes” níveis de rotatividade, uma vez que “têm impacto negativo junto de alunos que já estão em contextos mais difíceis”. A relação entre a rotatividade e o sucesso académico está patente em estudos internacionais que analisaram outros sistemas de ensino, como o norte-americano ou o do Reino Unido, explica Pedro Freitas. A permanência de um professor numa escola significa que conhece aquela realidade e está habituado ao contexto, enquanto o novo docente “tem de se habituar e adaptar porque é tudo novo”, disse.

Por isso, sublinha Pedro Freitas, era importante implementar medidas que atraíssem os professores. As actuais políticas de recrutamento deviam ser alteradas, por forma a aumentar a estabilidade do corpo docente nas escolas públicas portuguesas. Actualmente, diz, não existem quaisquer incentivos ou diferenças entre professores que estão numa escola mais ou menos favorecida: “Do ponto de vista da carreira e contratual é exactamente a mesma coisa”.

E recorda que no Reino Unido foram implementadas políticas para atrair professores para as escolas de contextos mais desfavorecidos, sendo que os incentivos mais eficazes foram os pecuniários. Aumentos salariais, alteração dos horários de trabalho e estabilidade contratual foram algumas das medidas que, em alguns contextos, “conseguiram atrair maior número de professores”, explica, recordando um outro estudo feito também este ano pela equipa da Nova SBE.

A equipa de investigadores vai agora avançar para um novo estudo para tentar perceber de que forma a rotatividade dos professores afecta o sucesso académico dos alunos.

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