Guterres faz alerta sobre Zaporijjia: “Ataque a central nuclear é um acto suicida”

Secretário-geral da ONU pede condições para que a Agência Internacional de Energia Atómica consiga aceder às instalações. Ainda em Zaporijjia, autoridades nomeadas pela Rússia preparam referendo à anexação.

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A central nuclear de Zaporijjia foi tomada pelas forças russas no princípio de Março ALEXANDER ERMOCHENKO/Reuters

Os olhos do mundo recaíram novamente sobre a maior central nuclear da Europa, em Zaporijjia, onde se têm vivido dias de tensão com Rússia e Ucrânia a acusarem-se mutuamente de bombardeamentos às instalações. A Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) já tinha alertado para um risco “muito grave” de desastre e esta segunda-feira foi António Guterres a pedir contenção.

“Qualquer ataque a uma central nuclear é um acto suicida”, declarou o secretário-geral da ONU, de visita a Hiroxima para os 77 anos do lançamento da bomba atómica sobre aquela cidade japonesa. “Espero que esses ataques terminem e que a AIEA consiga aceder à central para exercer as suas competências”, disse ainda, não se alongando em mais comentários.

Como nos primeiros dias da guerra, quando a Rússia tomou a central e o lançamento de uma bomba originou um incêndio num dos edifícios do complexo, volta a pairar o medo de que aconteça algo com proporções potencialmente catastróficas. Se em Março se navegavam “águas inexploradas”, como então disse o director da AIEA, Rafael Grossi, a situação não mudou entretanto.

Nos últimos dias foram violados pelo menos quatro princípios internacionalmente reconhecidos de segurança nuclear em Zaporijjia, a começar pela integridade física das instalações. Ainda assim, a central continua a funcionar e está segura, disse à BBC o presidente da empresa que gere as centrais nucleares ucranianas, a Energoatom. “Os russos usam-na como escudo contra as forças ucranianas, porque ninguém da Ucrânia fará algo contra a central. As Forças Armadas sabem que trabalha lá pessoal ucraniano, que esta é uma central ucraniana, por isso não vão matar pessoas, a nossa equipa e danificar a infra-estrutura”, afirmou Petro Kotin.

Não se sabe ao certo o que está a acontecer no local nem quem fez o quê – e não há meios para o saber de forma independente. Situada na margem esquerda do rio Dnieper, a central está no limite da zona que a Rússia controla no Sul da Ucrânia. A sua tropa tomou-a logo a 4 de Março e manteve-se a funcionar com os funcionários ucranianos, embora haja relatos de coacção e violência contra eles. A Ucrânia tem em marcha um contra-ataque para retomar o controlo das zonas ocupadas pelo invasor, mas nega responsabilidades pelo que se está a passar em Zaporijjia. Já a Rússia diz que foi Kiev que lançou bombas contra a central.

Foi nesta região que as autoridades nomeadas por Moscovo deram esta segunda-feira um passo formal com vista à anexação russa. Ievgeni Balitski, o governador, assinou um decreto para “começar os preparativos para um referendo sobre a reunificação com a Rússia”, disse o próprio durante um fórum intitulado Estamos juntos com a Rússia.

Zaporijjia, a cidade, mantém-se em mãos ucranianas, mas a maioria da região está sob controlo militar russo. Balitski, que estabeleceu o seu gabinete na vizinha Melitopol, lançou a hipótese de um referendo em meados de Julho, alegando que tinha recebido “inúmeros pedidos” para tal. “Nós, participantes deste fórum, declaramos que o nosso futuro é juntarmo-nos à Rússia. Este é o momento para reparar uma injustiça histórica”, diz o decreto, acrescentando que a decisão de fazer o referendo é tomada “com base no princípio da livre escolha”.

Um referendo do mesmo tipo foi organizado na Crimeia em 2014 e a maioria das organizações internacionais não lhe reconheceu validade. A agência de notícias russa Tass conta que, após a assinatura do decreto, ouviu-se na sala o hino da Rússia.

“Se os ocupantes seguirem o caminho desses pseudo-referendos, vão fechar a porta a qualquer possibilidade de negociação com a Ucrânia e o mundo livre”, reagiu Volodymyr Zelensky.

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