Nos novos bioestimulantes são as algas que ajudam as plantas a crescer

Empresas de produtos para a agricultura, como a Timac Agro, na costa da Bretanha, apostam nos bioestimulantes para conseguir que as plantas se desenvolvam sem fertilizantes químicos.

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Os bioestimulantes potenciam o material genético que já existe na planta Daniel Rocha

À nossa volta, as plantas deslizam em tapetes rolantes, como numa linha de montagem, num sofisticado sistema robotizado. Num determinado momento, recebem uma pulverização com um bioestimulante, aplicado de forma rigorosa. Aqui, no Centro Mundial de Inovação do Grupo Roullier, ao qual pertence a empresa de produtos para a agricultura Timac Agro, em Saint-Malo, Bretanha, Norte de França, tudo é controlado com um detalhe que vai até à dimensão de cada gota na folha da planta.

Só assim é possível medir o verdadeiro impacto do bioestimulante nos diferentes tipos de plantas, ao mesmo tempo que se pode alterar outros factores como o tipo de solo ou o clima, explica o director de investigação e desenvolvimento (I&D), Sylvain Pluchon, orgulhoso de uma tecnologia que, diz, só existe aqui. Os dados recolhidos são depois analisados para monitorizar o crescimento da planta e o número de folhas e de flores que nela surgem.

“Os nutrientes vão viajar através da planta”, descreve Frank Jamois, director dos laboratórios de análise. O produto – que faz parte da nova gama não química da Timac Agro, a ADN (Aumento, “Destress” e Nutrição) – é colocado no solo, passa pelas raízes e é transportado depois para outros órgãos da planta. “Há genes que estão envolvidos na transferência dos elementos nutritivos do solo para as raízes e destas para as folhas e para os frutos. É toda esta combinação que permite à planta crescer. Há muitos genes específicos aplicados na deslocação de um nutriente de um órgão para outro. No conceito de ADN, vamos estimular esses genes, permitindo à planta desenvolver-se por si mesma. Não damos os nutrientes, ajudamos a planta a fazê-lo.”

Na base deste produto estão as algas (além de bactérias, fungos e outros microorganismos) colhidas na costa da Bretanha, onde existem cerca de 600 tipos diferentes, e das quais são retirados estratos com compostos activos que “dão sinais” às plantas. São algas com características particulares já que, diz Jamois, “desenvolveram moléculas que lhes permitem enfrentar as subidas e descidas do mar”, muito acentuadas nesta região, chegando a haver uma variação de marés de 13 metros. Aliás, foi com as algas calcárias desta costa que o Grupo Roullier começou, em 1959, quando Daniel Roullier percebeu o potencial daquelas para o tratamento dos solos.

“Quando a planta está stressada, vai produzir aminoácidos específicos para gerir o stress. Nós, com a combinação de estratos naturais, vamos enviar informação à planta para ela gerir melhor o stress. O silício, por exemplo, aumenta a resistência ao stress hídrico. Assim, em vez de se defender contra o stress, a planta vai sentir-se menos stressada e pode concentrar-se no seu rendimento e qualidade”, prossegue Jamois.

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As algas vão estimular os genes das plantas e ajudá-las, entre outras coisas, a combate o stress Adriano Miranda

Este é o princípio da bioestimulação, uma tecnologia cada vez mais procurada como alternativa aos adubos e fertilizantes tradicionais, que, com as novas regras da União Europeia, terão de ser reduzidos nas explorações agrícolas dos Estados-membros. Há, segundo os responsáveis da Timac Agro, estudos que apontam para um crescimento deste mercado na ordem dos 11 a 12,5%.

O trabalho que aqui é feito passa por isolar e identificar cada ingrediente disponibilizado pelas algas e perceber qual a melhor ligação com as necessidades de cada planta, para poder chegar aos resultados mais eficazes. “Queremos explorar melhor a bagagem genética que a planta já tem”, sublinha Frank Jamois. “Com a associação de diferentes matérias orgânicas, diferentes compostos de bioestimulação, conseguimos dar-lhe esses sinais.”

“Não estamos a falar de OGM [organismos geneticamente modificados]”, sublinha a portuguesa Jéssica da Costa, responsável pelo desenvolvimento de produto. “A planta tem o seu material genético. O que estamos a fazer é potenciá-lo”, diz, notando que “o stress climático pode fazê-la perder até 80% do seu potencial”.

Vejamos mais detalhadamente o exemplo do silício. “Dar muito a uma planta, se ele não penetra pelas folhas, não serve para grande coisa”, explica Jamois. “O que fazemos é estimular o gene que vai aumentar a capacidade de a planta absorver o silício do solo. Ela vai produzir os ácidos orgânicos no solo e vai poder capturar o silício. Outro gene vai intervir no transporte até à folha, para que se deposite aí em cristais, o que vai permitir uma estruturação da folha, que capta melhor a luz. Mais energia, mais fotossíntese.” Pode-se também “adaptar a capacidade da plantar absorver fósforo com mais eficácia” ou, no caso da soja, por exemplo, optimizar a capacidade que ela já tem de absorver e fixar o azoto que existe no ar.

Os responsáveis do Centro de Inovação garantem que, depois de realizarem testes em vários pontos do mundo, incluindo Portugal (onde o Grupo Roullier está presente com a Timac Agro VITAS e também com investimentos na área do vinho), têm “suficientes resultados agronómicos para ter a certeza de que esta tecnologia dá resposta, por vezes com resultado de 5, 10 ou 20%, ou até 30% como aconteceu com as batatas” no aumento de produtividade.

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Os cientistas da Timac Agro dizem ter obtido grande sucesso nos testes, com um aumento de produtividade até 30% no caso das batatas Miguel Madeira

Nos 1200 metros quadrados de estufas experimentais da Timac Agro, os cientistas podem reproduzir climas de diferentes regiões do mundo e desenvolver soluções específicas para cada caso, procurando dar às plantas ferramentas não químicas para se tornarem mais resistentes e trabalhando, para além do stress e da nutrição, a “remodelação celular” e a “performance genética”. Este é um caminho que, acreditam, irá ser cada vez mais relevante num futuro marcado pelas alterações climáticas e no qual “um hectare de terra que alimentava duas pessoas em 1950 tem de passar a alimentar cinco, em 2050”.

O PÚBLICO viajou a convite da Timac Agro

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