Monólogos à parte, “porquê” e “para quê” aprender História?

Mais importante do que saber conteúdos, é saber pensar de forma disciplinada. Não interessa, apenas, decorar datas, nomes, acontecimentos, etc. O que realmente importa é saber pensar cientificamente.

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Rui Gaudencio

As orientações para a organização dos novos anos lectivos começam a envolver uma certa comédia negra em torno da disciplina de História. O argumento - a redução em um terço da sua carga horária curricular semanal - é apontado como o inimigo número um para os estudantes pensarem historicamente, e o melhor amigo para o país descredibilizar a disciplina.

Em corredores, salas de aula ou até mesmo conversas de café, ouvimos com alguma regularidade “porquê” e “para quê” aprender História? Poderíamos responder instantaneamente: para tomar decisões e agir de forma mais sustentada e independente ou aproveitar questões socialmente vivas para dialogar sobre passado(s) e presente(s) doloroso(s) e ouvir conclusões como “...E afinal a História revela-se importante!”.

As vontades de mudança começam no espaço de sala de aula. Torna-se imprescindível esclarecer se a História é ensinada como uma narrativa única e estática que visa promover a coesão social, ou como uma disciplina que engloba o diálogo entre muitas perspectivas diferentes e é dinâmica, promovendo o pensamento crítico, o debate e o reconhecimento de que, muitas vezes, não há uma só resposta “certa”. Ensinar História envolve questões de identidade em diálogo com as culturas, os valores, os olhares acerca do passado e a relação entre passado, presente e futuro – Consciência Histórica.

Para os mais curiosos, a constituição da “nova” forma de ensinar História, trilhada pela Educação Histórica, reflecte-se na aula-oficina. Portanto, as nossas aulas de História têm de permitir “historiar”, aliás, este modelo foi proposto por Isabel Barca em 2004 com o intuito de estimular os professores a desafiarem os estudantes com tarefas que façam com que a aula de História seja uma oficina, ou seja, o local onde os nossos estudantes se transformem em “aprendizes” do “ofício” de historiador.

Saber História, ser-se historicamente competente, articula o pensamento histórico e o conhecimento histórico. A História é compreendida através de um processo metacognitivo, é interiorizada pelo indivíduo e assim dão-se passos para a formação de uma Consciência Histórica mais reflexiva.

Como resposta ao título que abre este artigo, parece-nos feliz que os nossos estudantes sejam capazes de dar sentido e significado a um mundo em rápida mudança, repleto de desafios e possibilidades inimagináveis para os seus professores. Por sua vez, será de um diminuto contentamento, interpretações de um passado desligado e, portanto, de pouca ou nenhuma relevância para o presente e o futuro. Esta resposta baseia-se no pressuposto de que a inclusão da História no currículo escolar é justificável, contudo, será suficiente?

Desenvolver o pensamento histórico também envolve orientar os estudantes a aprenderem como analisar e avaliar argumentos históricos, explorando e testando as afirmações que outros fizeram sobre os significados da evidência histórica e sobre as implicações das afirmações factuais estabelecidas – uma competência essencial no mundo das fake news. Ora, o processo de ensinar e aprender História anseia pela desconstrução dos julgamentos marcados pelo senso comum, de forma a que se promovam formas mais complexas de compreender o mundo e de agir.

Concebe-se o ensino de História com a necessidade de educar historicamente em diálogo com o desenvolvimento humano. Mais importante do que saber conteúdos, é saber pensar de forma disciplinada. Não interessa, apenas, decorar datas, nomes, acontecimentos, etc. O que realmente importa é saber pensar cientificamente (no caso da História, pensar historicamente).

(Re)pensar o currículo. (Re)pensar a aprendizagem e o ensino de História. Distinguir História de histórias, bem como História e Cidadania, e que diálogos são possíveis. É urgente. Mais momentos de “pensar historicamente”, por favor.

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